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Um marco para a justiça no abismo de Gaza (Por Tiago Luz Pedro)

Embora de alcance limitado, o gesto do TPI reacende a esperança de que, um dia, a justiça possa prevalecer sobre o poder bruto

atualizado

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1 de 1 Imagem colorida mostra o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu - Metrópoles - Foto: Spencer Platt/Getty Images

A decisão do Tribunal Penal Internacional (TPI) de emitir ordens de prisão contra Benjamin Netanyahu e Yoav Gallant é um marco significativo na história recente da justiça internacional. Trata-se de uma acusação direta contra a liderança de Israel por crimes de guerra e contra a humanidade em Gaza, denunciando o cerco impiedoso que continua a sufocar uma população já devastada. E é um gesto que, embora tardio e de alcance limitado, coloca a humanidade no centro de um conflito marcado pela profunda desumanização e pela instrumentalização política do sofrimento.

Ao longo da sua carreira, Netanyahu a sua reputação como um estratego político e militar implacável, mas também como um líder que frequentemente caminha na ténue linha entre a autodefesa legítima e a violação do direito internacional. Desde os ataques de 7 de Outubro de 2023, Israel intensificou a sua ofensiva em Gaza, justificando-a como resposta a atos de terror inaceitáveis cometidos pelo Hamas. No entanto, a resposta extrapolou qualquer limite ético razoável, transformando-se numa punição coletiva contra milhões de civis privados de recursos básicos como água, alimentos ou eletricidade.

O TPI acusa Netanyahu e o seu ex-ministro da Defesa de usarem a fome como arma de guerra – um crime raramente levado à justiça, mas profundamente devastador no seu impacto. Esta acusação traz consigo uma mensagem clara: o sofrimento humano, seja em Gaza ou em qualquer outro lugar, não pode ser normalizado ou justificado por narrativas de segurança nacional.

E embora a ausência de mecanismos próprios de aplicação — e a rejeição de Israel à jurisdição do tribunal — possam enfraquecer a execução prática dos mandados, o impacto simbólico da decisão do TPI é inegável. A partir de agora, Netanyahu e Gallant não poderão cruzar as fronteiras de 124 países signatários do Estatuto de Roma sem arriscar a detenção.

A inclusão de Mohammed Deif, líder militar do Hamas, na lista de procurados pelo TPI também é significativa. Ela demonstra que o tribunal não ignora os crimes do Hamas, mas a ausência de outros líderes do grupo na lista levanta questões sobre a seletividade da justiça internacional. Se a responsabilidade pelo massacre de civis deve ser compartilhada por ambos os lados, é imperativo que as acusações de crimes de guerra sejam igualmente contundentes para todas as partes.

No imediato, a decisão do TPI pode ser insuficiente para mudar a realidade em Gaza, mas ela reacende a esperança de que, um dia, a justiça possa prevalecer sobre o poder bruto e a indiferença global.

 

(Transcrito do PÚBLICO)

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