Ulysses e Camões: Paciência de Chico Buarque e Lula (por Vitor Hugo)
“Quem sabe faz a hora, não espera acontecer”
atualizado
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Habituado a lidar com signos da comunicação – desde o curso de Jornalismo na UFBa – , não lembro, na larga travessia da profissão, de fato revestido de tanta simbologia, e significados, quanto a entrega do Prêmio Camões 2018 – maior láurea da língua portuguesa – quatro anos depois, ao escritor, cantor e compositor brasileiro, Chico Buarque de Holanda (que ontem, 28, fez show em Salvador), na véspera do 25 de Abril da “Revolução dos Cravos”, que livrou Portugal do fascismo salazarista, em solenidade no Palácio Queluz, em Cintra.
Até mesmo o fato do primeiro espetáculo “Que tal um Samba?”, da turnê de Chico – pós recebimento da honraria luso-brasileira, com assinatura e presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva , ontem (28), neste sábado (29) e domingo (30), se dar na capital baiana, soma ainda mais emblemas na primeira capital do Brasil e cidade construída pelo império português para ser a rainha do Atlântico Sul. Signos antigos e atuais – históricos, artísticos, políticos, sociais e culturais. Envolvendo não só o premiado autor de “Tanto Mar”, mas também o novo dono do poder no Palácio do Planalto, em seus pensamentos e rumos políticos e ideológicos convergentes.
Inevitável também, neste caso, é recordar a figura emblemática do deputado Ulysses Guimarães. Principalmente no tocante ao seu Decálogo do Estadista, que inclui Paciência e Sorte entre os mandamentos fundamentais nos destinos dos vencedores e daqueles que, verdadeiramente são detentores da vocação do sucesso e do poder. Traços que parecem feitos como luvas, para os dois personagens centrais na entrega deste prêmio relevante, – após quatro tenebrosos anos de obscuridade, temores e terrores fascistas – na expressão do ganhador em seu discurso – até chegar, como devido e justo, às mãos de seus legítimo dono. Limpo, como imperativo “e com a rara delicadeza do mandatário anterior, de não sujar o espaço da assinatura do diploma” disse o autor de “Estorvo”, em um dos momentos mais aplaudidos de sua dura da sua significativa e bem humorada fala.
No quarto mandamento do seu Decálogo, Paciência, Ulysses destaca a sabedoria de esperar: “A impaciência é uma das faces da estupidez”, assinala. “Paciência é competência para fazer a hora, não se precipitar, seguindo a receita de Geraldo Vandré: “Quem sabe faz a hora, não espera acontecer”, ensinava o mestre da resistência democrática do país, nos anos loucos da ditadura. Uma lição preciosa que o artista e o mandatário demonstraram ter aprendido, pelo menos neste caso de visibilidade internacional.
Finalmente, a Sorte, nono mandamento da Lei de Ulysses. Medida exata desta histórica entrega do Prêmio Camões 2018, em Portugal: “Azarado não pode ser estadista, embora tenha todas as qualidades não ganha estátua”, diz o notável pensador político brasileiro. Nem artista de sucesso e talento indiscutíveis, acrescento aqui. “Antes de entregar o bastão de general, Napoleão investigava se seu soldado tinha sorte. Por falta de sorte, por obra da fatalidade ou de morte prematura, carreiras políticas frustraram-se. Na morte de Lenin, disputavam o comando bolchevista o burocrata Stalin e o doutrinador Trotsky. Este foi, no inverno, caçar patos. Apanhou pneumonia, que o afastou temporariamente do proscênio político, ensejando a ascensão do rival.
Magnífico Ulysses Guimarães. Viva Chico Buarque!
Vitor Hugo Soares é jornalista, editor do site blog Bahia em Pauta. E-mail: vitors.h@uol.com.br