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Trump deixa o mundo de cabelo em pé (Por Hubert Alquéres)

Nada autoriza expectativas otimistas quanto ao mundo que se descortina após a vitória do republicano

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O presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump.
1 de 1 O presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump. - Foto: Reprodução

Nada autoriza expectativas otimistas quanto ao mundo que se descortina após a vitória de Donald Trump. Será um erro grave subestimar as consequências de sua agenda econômica protecionista – e sua visão da geopolítica.

De imediato, haverá repercussão nas duas guerras regionais em curso. A ordem mundial, com o esvaziamento de seus mecanismos internacionais, tende a sofrer abalo sísmico. A própria segurança do mundo ocidental, estruturada em torno da OTAN, também será afetada pela visão isolacionista do novo presidente americano.

Durante a campanha Trump prometeu acabar com a guerra da Ucrânia em vinte e quatro horas, um exagero, claro. Mas é pedra cantada que cortará, ou diminuirá drasticamente, a ajuda militar e financeira ao país de Zelensky. Vladimir Putin deve estar soltando fogos. A depender do desfecho da crise política da Alemanha, o principal país da União Europeia também pode cortar a ajuda ao governo ucraniano. Uma das primeiras iniciativas de Trump foi ligar para Putin, pedindo para não intensificar a guerra.

A solução do novo presidente para o fim do conflito bélico na Europa passará por pressionar a Ucrânia a ceder parte de seus territórios ocupados pela Rússia. Nisso, o novo presidente dos EUA e a China de Xi Jinping estarão de mãos dadas.

Já no Oriente Médio, Benjamin Netanyahu estará de mãos livres para escalar a guerra, deixando de existir força moderadora capaz de impor limites à sua ação bélica. Até certo ponto e até certo grau, o governo de Joe Biden desempenhou esse papel moderador. Com Trump como presidente, os Estados Unidos podem até estimular a escalada da guerra, estendendo o conflito até o Irã.

Enquanto o mundo ficará mais perigoso do ponto de vista geopolítico, haverá a tendência de enfraquecimento dos mecanismos multilaterais. A ONU já não consegue responder satisfatoriamente aos conflitos atuais. A tendência é o agravamento desse processo, como indica a escolha da deputada ultra radical Elise Stefanik como embaixadora americana na ONU. Isto pode levar as Nações Unidas a ter o mesmo fim da Liga das Nações de antes da Segunda Guerra Mundial, que colapsou por sua irrelevância. Já a OMC terá seu papel esvaziado pela batalha comercial.

Na economia, a guerra comercial contra a China e as medidas protecionistas tendem a afetar a dinâmica das cadeias produtivas e provocar um refluxo na globalização. Até mesmo países considerados nearshoring que, como o México, se beneficiaram de vantagens comparativas, serão impactados negativamente.

Os olhos do mundo voltam-se para o que acontecerá com a economia americana dada a sua importância em escala planetária. A inflação foi um dos grandes fatores responsáveis pelos americanos terem votado massivamente no candidato republicano. Paradoxalmente, o programa vitorioso é inflacionário, a partir de três medidas.

Trump pretende diminuir os impostos dos ricos e das empresas, fator de agravamento da dívida pública dos Estados Unidos, podendo elevá-la para quatro trilhões de dólares ao final do seu governo. Ao taxar as importações em até 60%, como pretende fazer com os produtos chineses, encarecerá o preço desses produtos. Medidas protecionistas geram ineficiência e criam reservas de mercado. Os EUA correm esse risco com um presidente para quem a palavra mais bela é tarifa, como afirmou.

Em sua campanha, o candidato republicano fez da deportação em massa de imigrantes ilegais uma das suas grandes bandeiras. Se levada à prática, a medida vai encarecer o custo da mão-de-obra, podendo até haver escassez em áreas importantes da economia, como a construção civil. A substituição dos imigrantes pela mão de obra “nativa” elevará os salários, um fator inflacionário a mais.

Os Estados Unidos tenderão, assim, a ingressar em nova fase de elevação de juros e de valorização do dólar como remédios contra a inflação. Isto afeta o mundo inteiro e é motivo de dor de cabeça para o Brasil.

Esse quadro pode pressionar o Banco Central a manter a escalada dos juros básicos, comprometendo o crescimento do emprego e da economia. Nossas dificuldades serão maiores porque o governo perdeu quase dois anos para fazer o ajuste necessário para o enfrentamento da nossa dívida pública astronômica.

Seremos afetados, ainda, em outras questões relevantes. A agenda ambiental, principalmente a mudança da matriz energética, ficará comprometida com a posição do novo governo americano, hostil à transição energética e ao enfrentamento da crise climática. A menina dos olhos de Lula, a COP-30, a ser realizada em 2025, em Belém, será um evento esvaziado, sem a presença de Donald Trump.

Há motivos de sobra para o mundo, incluindo o Brasil, ficar de cabelo em pé com o programa de Trump. Diferentemente de 2016, ele enfrenta condições bem mais favoráveis para implementar suas promessas eleitorais. Assume agora seu segundo mandato com maioria no Senado e na Câmara de Deputados e com maioria de conservadores na Suprema Corte. As urnas deram o aval às suas ideias que têm, ao seu lado, um movimento com forte poder de mobilização: o MAGA – Make America Great Again.

Trump promete fazer a América ser grande novamente, mas pode levá-la a perder ainda mais a liderança mundial conquistada após a Segunda Guerra.

Os chineses agradecem.

 

Hubert Alquéres é presidente da Academia Paulista de Educação.

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