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Território, democracia e distrito eleitoral (Eduardo Fernandez Silva)

Se o planeta fosse um único distrito eleitoral, com eleições periódicas, poderia ser chamado “democracia”?

atualizado

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Projeto Comprova
Mapa sobre as democracias
1 de 1 Mapa sobre as democracias - Foto: Projeto Comprova

Se o planeta fosse um único distrito eleitoral, com eleições periódicas, poderia ser chamado “democracia”? Seriam tantas a multiplicidade e a amplitude das questões a serem decididas que a relevância de cada uma delas escaparia à maioria. Os eleitores que evitassem a abstenção votariam como ocorre na maioria dos parlamentos: votam não pelas implicações da matéria em pauta, mas em razão de acordos com outros parlamentares do tipo “você vota comigo nesta matéria e eu voto com você naquela outra”!

E como seria? Democracia direta ou representativa? A democracia direta praticamente deixou de existir. A grande quantidade de plebiscitos em alguns poucos países os aproximam desse modelo, ao contrário de outros, como o Brasil, onde praticamente não há plebiscitos. Aqui, um eleitor que hoje tenha 75 anos de idade terá votado, em toda a sua vida, em apenas três ou quatro plebiscitos.

Quando o distrito eleitoral é tão grande como na hipótese acima, a influência do cidadão fica minimizada. Torna-se mais fácil a captura do processo decisório por entes – entendidos estes como empresas, grupos, sindicatos, organizações criminosas etc. – mais organizados e ricos que os eleitores, que são os que sofrem as consequências das decisões tomadas.

Numa escala tão ampla, os eleitos desconectam-se dos cidadãos, e passam a agir em desacordo com os interesses destes. Os eleitores, por sua vez, perdem a capacidade de conhecer seus (supostos) representantes e suas ações. Uma democracia tão pouco ou nada representativa seria ainda uma democracia?

No Brasil, há anos, discute-se a conveniência ou não de se adotar o voto distrital, simples ou misto. Quase nunca se debate a definição de distrito e, igualmente importante, a sua periódica redefinição, uma vez que ao longo do tempo locais ganham, ou perdem, eleitores. Seriam os distritos iguais às atuais “zonas eleitorais”, das quais havia 2.636 no pleito de 2022, ou às seções eleitorais, que naquela data somavam quase 500.000? Ou, ainda, aos locais de votação, que eram então quase 95.000, incluindo aqueles localizados noutros países? Ou seriam os distritos iguais a municípios? Neste caso, passaríamos a ter tantos deputados quantos municípios, ou seja, quase 5.700? Então, seria necessário juntar municípios para formar um distrito. Quantos?

Um dos problemas é exatamente juntar municípios para formar um distrito eleitoral. Como são hoje, os municípios já são grandes demais, tão extensos que mesmo o prefeito conhece apenas parcialmente a realidade local. Agregando essas unidades, a representatividade da população fica ainda menor, nossa democracia ainda mais precária e nossos representantes ainda mais alheios às prioridades dos eleitores.

A questão se agrava quando da alteração dos distritos. Se hoje um distrito seria composto pelos municípios A, B e C, amanhã, seria A, X e Y, de forma a ampliar as chances eleitorais do cacique fulano, influente na redefinição?

Essas são questões essenciais, ausentes do debate sobre uma necessária reforma política que democratize nossa democracia.

 

Eduardo Fernandez Silva. Ex-Diretor da Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados

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