“Pobre criaturas” macetou o apocalipse (por Felipe Sampaio)
Baby Consuelo e o seu anúncio do fim mundo
atualizado
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Baby Consuelo contou nas redes sociais que o seu anúncio do fim mundo, proclamado na maior folia pagã da humanidade, teria sido inspirado por informações privilegiadas sopradas ao pé do seu ouvido por ninguém menos que o próprio Pai Celestial.
Sem querer duvidar das melhores intenções da rainha dos Novos Baianos, vale a pena levarmos em conta a hipótese de que Deus estivesse querendo tão somente dar uma apimentada no vatapá daquela noitada do carnaval de Salvador. Afinal, não esqueçamos que, sendo brasileiro, Ele deve gostar de uma boa brincadeira.
Ou, quem sabe, em meio a tanta barulheira, Baby simplesmente tenha entendido com sentido apocalíptico o cochicho divino de um antigo frevo pernambucano “isso aqui ainda vai pegar fogo…”.
Por sua vez, acostumada a cantar entre Sodoma e Gomorra, Ivete Sangalo, mesmo não contendo seu espanto, esforçou-se em dedicar todos os decibéis do seu trio elétrico para ajudar Baby do Brasil a salvar nossas almas em pleno carnaval baiano.
Enquanto isso, foi a improvável revolucionária Bella Baxter que macetou pra valer as consciências de quem teve a sorte de ir ao cinema nos últimos dias. Fazendo os espectadores transitarem entre o armagedon e o paraíso, o diretor grego Yorgo Lanthimos tirou melhor proveito de algum eventual sussurro sagrado do que Baby.
Há muito tempo um filme não é tão merecedor de todos os Oscar aos quais foi indicado. Não é exagero afirmar que “Pobres Criaturas” é programa obrigatório, seja pela arte, seja pelo tema. Aqui na Ilha da Vera Cruz, onde quase mil e quinhentas mulheres são assassinadas por ano apenas pelo fato de serem mulheres, é preciso assistir mais de uma vez (especialmente quem não conseguir, ou não quiser, entender a lição de Bella).
Ninguém saberá ao certo a qual tipo de apocalipse Baby Consuelo se referia no seu show de carnaval. Mas, certamente o apocalipse apontado por Lanthimos tem solução. Para não continuarmos como uma humanidade com pés de galinha e cabeças de porco, é preciso macetarmos com urgência o talibã tropical que ainda perambula fantasiado com naturalidade entre nós.
Felipe Sampaio, foi assessor especial dos ministros da Defesa (2016-2017) e da Segurança Pública (2018); ex-secretário executivo de segurança urbana do Recife (2019-2021); cofundador do Centro Soberania e Clima; atual diretor de gestão da informação no ministério da Justiça.