Plataformização das políticas (Por Franciani Bernardes e Aline Souza)
Sem políticas públicas que possibilitem conexão digital e uso crítico da internet, milhares de brasileiros não acessam programas sociais
atualizado
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Na chamada “era da digitalização”, cerca de 29 milhões de brasileiros e brasileiras não têm conexão regular à internet, conforme dados da pesquisa TIC Domicílios 2023.[1] Ainda que esse número represente uma redução de 19,4% no índice de pessoas “desconectadas” em comparação com o ano anterior, o cenário permanece preocupante, sobretudo porque o governo federal – e também estados e municípios – têm utilizado o digital como via prioritária, quando não exclusiva, de acesso a benefícios sociais e a programas de transferência de renda.
Um estudo realizado pela Rede de Pesquisa Solidária da Universidade de São Paulo (USP) revelou que, durante a pandemia de Covid-19, 7 milhões de pessoas em situação de pobreza ou extrema pobreza no Brasil não tiveram a garantia do auxílio emergencial por dois motivos principais: ausência de conexão à internet e, no caso das que tinham acesso, dificuldades no uso do aplicativo da Caixa Econômica Federal.
Ao abordarmos o tema da plataformização de políticas, não podemos ignorar que o Brasil é reconhecidamente um dos países mais desiguais do mundo, em que o 1% mais rico da população detém quase 30% da renda total nacional. Essa realidade coloca um duplo desafio: por um lado, a necessidade de superação da falta de habilidade das populações mais vulnerabilizadas com o uso das ferramentas digitais; e, por outro, o entendimento de que a ausência de acesso à internet é parte de um problema maior, que é a negação de garantias mínimas de sobrevivência, como moradia, saúde e educação.
Alguns dados do IBGE confirmam esse cenário: o percentual de pessoas em extrema pobreza no Brasil, ou seja, que viviam com menos de R$ 200 por mês, caiu para 5,9% em 2022, após alcançar 9% em 2021. Ainda assim são cerca de 70 milhões em situação de pobreza, com rendimento de R$ 600 por mês; e 13 milhões em situação de extrema pobreza. Além disso, 8,64 milhões estão desempregados; e outros 47,38 milhões estão na informalidade.
Diante desse quadro fica evidente que a crescente digitalização dos serviços públicos tem significado uma exclusão dos já excluídos. A falta de infraestrutura nas regiões mais distantes das capitais e dos centros de poder; a impossibilidade de arcar com os custos de conexão; e a falta de habilidade com tais tecnologias são alguns dos problemas enfrentados por parcelas significativas da população brasileira.
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