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Os imigrantes correm perigo em Portugal (por Carmo Afonso)

O preconceito racial e xenófobo está a passar do discurso político dirigido a todos para as ameaças e agressões dirigidas aos imigrantes

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Alexander Spatari/Getty Images
Foto colorida da bandeira de Portugal e há construções em volta do mastro
1 de 1 Foto colorida da bandeira de Portugal e há construções em volta do mastro - Foto: Alexander Spatari/Getty Images

Comecei o dia com uma notícia difícil de passar adiante. Uma criança nepalesa de nove anos foi violentamente agredida por colegas da escola, em Lisboa, no início do ano. O menino ficou gravemente ferido: ficou com hematomas no corpo e feridas abertas. As agressões foram acompanhadas por frases racistas e xenófobas. A fonte da notícia da Rádio Renascença não quis reproduzir algumas dessas frases por serem rudes. Outras são aquilo a que já nos habituámos: “Vai para a tua terra” e “tu não és daqui”.

A vítima não foi hospitalizada. A mãe teve medo e foi ela própria que tratou dos ferimentos em casa. Também não apresentou queixa na polícia. Limitou-se a pedir a transferência do filho para outro estabelecimento de ensino. Esta parte é muito importante. É preciso perceber o ponto a que chega o sentimento de desproteção dos imigrantes em Portugal.

Foram cinco as crianças que agrediram o menino nepalês e outra registou as agressões em vídeo para partilhar num grupo de WhatsApp. Uma dessas crianças interveio mais ativamente nas agressões e terá sido ela a ser suspensa das atividades escolares durante três dias. Do que se sabe não houve mais consequências para as crianças e também se desconhece se estão a ter acompanhamento/tratamento psicológico. O menino nepalês continua a ter pesadelos e medo de ir à escola.

Já tinha acontecido. A última vez foi no Porto e foi grave O preconceito racial e xenófobo está a passar do discurso político dirigido a todos para as ameaças e agressões dirigidas às pessoas racializadas ou imigrantes. O perigo é real. Imaginem em que contexto familiar vivem aquelas crianças e o que lhes está a ser ensinado ou, no mínimo, aquilo que elas estão a interpretar da atuação dos adultos que as educam.

Entretanto a ministra da Administração Interna anunciou uma medida que considerou “uma primeira fase” na resposta a estas situações. E qual é a medida? Mais policiamento junto às escolas. Importa fazer várias perguntas: qual a relação entre policiamento e propagação de ideários racistas e xenófobos? Se as escolas têm problemas de racismo e de xenofobia, o que dizer das forças policiais? Mas, sobretudo, será que a ministra tem presente que as agressões tiveram lugar numa escola primária?

Não faz sentido. Não poderia existir uma abordagem mais antiprogressista do problema. Aumentar o policiamento é a velha receita dos políticos conservadores para resolver problemas sociais. Não foi só a ministra da Administração Interna. Também Rui Moreira e Carlos Moedas pediram um aumento de policiamento nas ruas do Porto e Lisboa, na sequência dos ataques racistas a imigrantes no Porto.

Aumentar o policiamento para prevenir ou reprimir agressões racistas é um tiro ao lado. Basta pensarem que as pessoas racializadas, as associações que as representam e os próprios coletivos antirracistas são os primeiros a denunciar a violência policial e os que  têm uma percepção mais negativa sobre a polícia. A partir daqui, é obrigatório ponderar outras soluções em articulação com o policiamento. Dizer simplesmente que este vai aumentar não tranquiliza as pessoas que o poder político afirma querer proteger.

Claro que acontece muitas vezes que, em nome do bem-estar dos imigrantes, se defendem políticas e medidas que são contrárias aos seus interesses. O primeiro debate entre candidatos às eleições europeias foi profícuo nesse aspeto. Quem quer restringir a entrada de imigrantes alega precisamente que temos de garantir que os acolhemos nas melhores condições. Soa bem. Mas não são boas notícias para os imigrantes. Significa que já estão cá demasiados.

De volta à notícia da Rádio Renascença, destaco as declarações da presidente da Junta de Freguesia de Arroios, Madalena Natividade. A presidente da freguesia mais multicultural do país lamentou que os moradores tenham uma percepção de insegurança na rua, por causa dos imigrantes, e que, por isso, nem possam ir à missa. “Não posso permitir que isso continue a acontecer aqui na freguesia e diariamente.”

Entre a propagação de mensagem racista e xenófoba da extrema-direita e a falta de preparação da esmagadora maioria dos políticos detentores de cargos públicos para responder aos seus problemas, os imigrantes correm perigo.

(Transcrito do PÚBLICO)

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