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O que fazer com o poder (Por André Gustavo Stumpf)

Bolsonaro produz fofoca, espuma, disse que me disse, mas não governa

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Demonstração operativa dos fuzileiros navais da operação Formosa durante agenda do presidente bolsonaro 19
1 de 1 Demonstração operativa dos fuzileiros navais da operação Formosa durante agenda do presidente bolsonaro 19 - Foto: Igo Estrela/Metrópoles

A insistência do presidente Bolsonaro em, no jargão atual, esticar a corda e dobrar acusações e imprecações contra ministros do Supremo Tribunal Federal está lhe valendo o descrédito do eleitorado. A rejeição do presidente escala a níveis absurdos, 53%, o que indica, neste instante, derrota já no primeiro turno da eleição presidencial de 2022.

O chefe do governo, na realidade, deixou de governar. Abdicou de seu mandato. Está em campanha aberta pela reeleição através de insultos e xingamentos de todos os calibres.

É uma situação constrangedora e única na história política recente do Brasil. Houve a renúncia de Jânio Quadros, em 1961, que preparou a cena com cuidado, mas esqueceu de motivar o povo. Saiu de Brasília e foi para a base aérea em São Paulo na expectativa de ser carregado nos ombros de volta ao Palácio do Planalto. O povo não foi e Jânio embarcou num cargueiro para o exílio na Inglaterra.

Jânio tinha preferência pelos destilados. Recorreu a eles antes de redigir sua curtíssima carta de renúncia. Por essa razão Golbery do Couto e Silva disse, certa feita, que alguém deveria ter prendido Jânio no banheiro do Palácio. Passado o efeito do escocês as coisas poderiam ter tomado outro rumo.

Com Jango foi diferente, mas também peculiar. O protegido de Getúlio Vargas nunca foi comunista, socialista ou algo semelhante. Ele era um fazendeiro que ganhou muito dinheiro com o negócio de engorda do gado, com larga experiência em suas terras no Brasil e nos países vizinhos.

Era um homem rico, com um certo cansaço do poder. Ele não lhe tinha respeito. Gostava das mulheres e dos destilados. Certa feita, em Belém do Pará, o Secretário de Justiça do Estado que tinha assuntos a tratar com ele, o encontrou num bordel.

O único ato político público de que Dona Maria Teresa Goulart participou foi o famoso comício da Central do Brasil, quando o ex-presidente anunciou as reformas de base. Desceu do palanque amparado por seguranças e familiares. Efeitos do destilado.

O presidente da República no Brasil tem poderes demais. Ele pode interferir na vida do cidadão seja por via de impostos, de preços públicos e das leis. A canetada dele ajuda ou atrapalha muita gente.

Os contrapesos judiciais e os de ordem administrativa, como defensores do meio-ambiente, servem para colocar o chefe do governo no trilho constitucional. É contra isso que Bolsonaro se insurge. Ele já disse que não renuncia à sua autoridade. Quer mandar e desmandar.

Mas não é dado a libações alcoólicas. Seu comportamento mercurial deve ter origem em algum problema de raiz, que só a psiquiatria política poderá explicar. Ganhou a eleição, porém não aproveita a enorme avenida de oportunidades à sua frente que aguarda ação propositiva do chefe do governo.

Ele precisa do conflito para manter sua claque unida e garantir espaço no noticiário. As ações do gabinete do ódio, e suas ramificações, que recebem verbas oficiais, lançam mentiras, meias-verdades e invencionices no mesmo estilo dos nazistas na Alemanha dos anos trinta, século passado.

O comportamento irritadiço do presidente e suas declarações desastradas na entrada do Palácio da Alvorada desmancham sua credibilidade, derrubam a bolsa de valores, provocam aumento do dólar e impedem a possibilidade de qualquer diálogo. Na realidade, Bolsonaro produz fofoca, espuma, disse que me disse, mas não governa.

A questão das finanças nacionais tende a se complicar nos próximos tempos. Os anos eleitorais são mágicos, neles os governantes se esmeram em tentar agradar o eleitor. Os déficits brasileiros vão se elevar, os empresários estão com expectativas baixas, o investidor estrangeiro possui opções melhores que o mercado brasileiro.

O ministro Paulo Guedes não conseguiu emplacar seus projetos de desestatização, nem o da reforma tributária, esta, aliás, bombardeada por todos os lados. O preço do botijão de cozinha chegou a 10% do salário-mínimo. O da gasolina está em torno de sete reais o litro.

Os personagens da eleição de 2022 ainda não apareceram. Deverão surgir neste segundo semestre. Há esforço de uma ala do PSDB para lançar o atual governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite. Mas até o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso se manifestou a favor de João Doria.

Outro candidato óbvio é Ciro Gomes. Além dos dois há muito anunciados, Lula e Bolsonaro. Este, contudo, ainda não se filiou a nenhum partido. E algumas siglas começam a se afastar dele.

“Todos amam o poder, mesmo que não saibam o que fazer com ele”, disse Benjamin Disreali, inglês esperto e culto, que foi duas vezes, primeiro-ministro de seu país.

 

André Gustavo Stumpf escreve no Capital Político. Formado em Direito pela Universidade de Brasília (UnB), onde lecionou Jornalismo por uma década. Foi repórter e chefe da sucursal de Brasília da Veja, nos anos setenta. Participou do grupo que criou a Isto É, da qual foi chefe da sucursal de Brasília. Trabalhou nos dois jornais de Brasília, foi diretor da TV Brasília e diretor de Jornalismo do Diário de Pernambuco, no Recife. Durante a Constituinte de 88, foi coordenador de política do Jornal do Brasil. Em 1984, em Washington, Estados Unidos, obteve o título de Master em Políticas Públicas (Master of International Public Policy) com especialização política na América Latina, da School of Advanced International Studies (SAIS). Atualmente escreve no Correio Braziliense. ⠀⠀

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