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O mundo ferve (por Gustavo Krause)

“O ar é irrespirável. Uma onda de calor avassaladora. A surpresa é a velocidade da mudança. O mundo passou para a era da ebulição”

atualizado

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Mulher bebendo na seca ONU - Metrópoles
1 de 1 Mulher bebendo na seca ONU - Metrópoles - Foto: Igo Estrela/Metrópoles

A COP 27 – CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS (UNFCCC, sigla em inglês), realizada no Egito, em novembro de 2022, para enfrentar impactos e estabelecer estratégias sobre a questão climática, foi ratificada por 198 países e territórios.

Naquela ocasião, Antonio Guterres, Secretário-Geral da ONU, advertiu: “Estamos no caminho para o inferno climático. O tema do encontro “perdas e danos” não pode ser varrido para debaixo do tapete. É imperativo moral. É uma questão fundamental de solidariedade internacional e de justiça climática – e acrescentou – os que menos contribuem para a crise estão colhendo a desordem semeada por outros”.

Recentemente, 27 de julho do ano corrente, Guterres foi mais enfático: “O ar é irrespirável. Uma onda de calor avassaladora. A surpresa é a velocidade da mudança. O mundo passou do aquecimento para a era de ebulição”. E concluiu, cobrando “ações radicais e imediatas”.

Não faltaram vozes negacionistas, acusando os que assim pensam de “ecoterroristas”. Este alinhamento ideológico tem uma espessa venda nos olhos e uma couraça resistente dos adeptos ao fenômeno que mata a varejo, os mais vulneráveis, e pode assassinar por atacado os habitantes do planeta.

Esta conjuntura me traz à memória um fato doloroso. Em 1975, O Recife sofreu a maior e mais letal enchente dos rios Capibaribe e Beberibe. Mais de uma centena de vítimas fatais e uma devastação urbana na periferia, áreas ribeirinha e em bairros de todos os segmentos sociais.

Incontinenti (na época era Secretário da Fazenda), o Governador organizou um gabinete de crise para enfrentar as questões emergentes e iniciou gestões com o Governo Federal para adotar medidas estruturais a exemplo de barragens de contenção e obras que protegeram a cidade de recorrentes tragédias.

Diante do panorama desolador, me veio à lembrança a frase de duvidosa autoria e alvo certeiro: “Deus perdoa sempre, o homem, às vezes, a natureza, jamais”. Cidade anfíbia, Recife é “Metade roubada ao mar/ Metade à imaginação/ Pois é do sonho dos homens/que uma cidade se inventa” (Carlos Pena Filho). A Natureza perdoa a cidade poética, mas cobra um preço alto pelo valor da água.

Em dimensão planetária, “A terra dá, a terra quer” é o título de um precioso livro de autoria de Antonio Bispo dos Santos (Ubu Editora, 2023) ou, simplesmente, Nego Bispo, um semeador de palavras com a força e a longevidade do Jequitibá-Rosa, a beleza das orquídeas e a sabedoria da terra fértil onde brotam ideias que atravessam o tempo.

O Nego Bispo, nascido em 1959 no vale do rio Berlenga, formou-se na autêntica Universidade dos saberes de mestres e mestras do Quilombo Saco Cortume, município de São João do Piauí. Escritor, ensaísta, poeta da escrita e da sagrada oralidade que defende ideias com a força do ativismo da cosmofobia revolucionária, que cria e recria um mundo com a arma das palavras e dos “conceitos”, uma “guerra de denominações” que contraria o colonialismo acadêmico.

Mas, Bispo é de Paz. Se o “inimigo” adora dizer desenvolvimento, ele contrapõe a palavra boa envolvimento; se agrega sustentável, ele oferece biointeração; para o saber sintético, saber orgânico; transporte chama transfluência; transforma mentes porque nela joga uma cuia de sementes; e o dinheiro e a troca? Nego Bispo não hesita em responder compartilhamento.

Com 18 anos, foi para a cidade. É o contrário da mata. É um território artificializado, humanizado: onde as pessoas têm medo de gente. Voltou para o mundo que foi seu berço para pensar e viver um modo de vida no seu “cosmos”, o quilombo e assim se define: “Eu não sou humano, sou quilombola. Sou lavrador, pescador, sou um ente do cosmos […] somos povos de trajetória, não somos povos da teoria. Somos da circularidade: começo, meio e começo. As nossas vidas não têm fim. A geração avó é o começo, a geração mãe é o meio e a geração neta é o começo de novo”.

Gustavo Krause foi ministro da Fazenda

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