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O falso Brasil que Bolsonaro vendeu a Putin (Por Juan Arias)

O presidente estava fisicamente em Moscou, mas com sua mente nos comícios e nos ataques que fará a Lula

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Bolsonaro visita o presidente russo, Vladimir Putin, no Kremlin em Moscou. Eles andam um atrás do outro pelo corredor da sede do governo - Metrópoles
1 de 1 Bolsonaro visita o presidente russo, Vladimir Putin, no Kremlin em Moscou. Eles andam um atrás do outro pelo corredor da sede do governo - Metrópoles - Foto: Alan Santos/PR

O presidente brasileiro Jair Bolsonaro, durante sua polêmica visita a Moscou para um encontro com o líder russo Vladimir Putin, estava constantemente ciente de seu medo obsessivo de não ser reeleito e de que também poderia ser derrotado por Lula, o pior de seus adversários, visto por ele como um comunista que tenta dessacralizar o país e impor o politicamente incorreto.

A primeira coisa que disse ao chegar a Moscou foi, de fato, que o que “une Brasil e Rússia é a fé em Deus e a defesa da família”. Mais tarde, em rede nacional, voltou a insistir que o Brasil agora tem um presidente que “valoriza a família”, “honra seus militares” e “acredita em Deus”. Ao lado dele em Moscou, uma mulher usava uma camiseta vermelha com a palavra “Jesus” escrita nela.

As palavras de Bolsonaro pareciam dirigidas mais do que a Putin, na verdade ao PT, partido de Lula, acusado pelo bolsonarismo de ser ateu, de querer desfazer o conceito de família tradicional e de ser antimilitar. Bolsonaro estava fisicamente em Moscou, mas com a cabeça nas próximas eleições, em que tentará vender ao país que o retorno ao poder da esquerda de Lula levaria o Brasil de volta aos tempos em que os valores tradicionais de Deus, pátria, família e militares foram destruídos.

Claro, nada disso interessava a Putin, preso ao seu projeto de guerra. A visita do presidente brasileiro no momento em que era assediado pelas democracias do mundo e que, dado o clima de guerra reinante no Kremlin, havia sido desencorajado pela diplomacia dos Estados Unidos e até mesmo pelos ministros mais moderados do governo brasileiro foi um presente para o líder soviético.

O fato é que a polêmica visita à Rússia, seguida de outra à Hungria para se encontrar com o direitista Viktor Orbán, não poderia ter sido melhor para Bolsonaro demonstrar aos seus anfitriões fascistas mais radicais que continua a ter peso no exterior também. Isso é mais uma zombaria – se pensarmos que, nestes três anos de governo, nenhum grande líder mundial se apressou em convidá-lo para seu país, nem da Europa nem das Américas. E, dia após dia, ele continua afirmando que “se o presidente dos EUA, Biden, o convidasse, ele estaria disposto a conversar com ele”.

A política externa de Bolsonaro foi justamente a mais desastrosa da história do Brasil democrático. Seu primeiro ministro no comando do Itamaraty, Ernesto Araújo, um dos mais radicais da ala ideológica, foi um verdadeiro desastre e acabou sendo afastado do cargo. Ele estava prestes a criar um conflito democrático com a China e chegou a afirmar que “Deus havia chamado Trump e Bolsonaro para salvar o Ocidente” e seus valores, hoje pisoteados.

Isso fez com que, durante a viagem de Bolsonaro a Moscou, seus assessores menos extremistas estivessem tensos até o último momento, porque o presidente brasileiro poderia dizer a Putin para criar algum problema diplomático, e ainda mais neste momento de tensão bélica entre Rússia e Ucrânia. Aparentemente, ele até recebeu “o que não dizer” por escrito para não comprometer a diplomacia mundial.

Esqueceram que Bolsonaro, ao falar com Putin, estava se referindo, sobretudo, ao seu grande rival, Lula da Silva, a quem acusa indiretamente de ter destruído a imagem de Deus no Brasil em seus governos anteriores, enquanto optou pela defesa de novas formas possíveis de família. Também de ter perdido o respeito ao mundo militar e policial, o que, em sua opinião, teria levado à multiplicação dos crimes no país. Assim, Bolsonaro cunhou seu slogan fascista de que “o melhor ladrão é o ladrão morto”, dando liberdade à polícia para matar impunemente.

As declarações de Bolsonaro em Moscou foram, na verdade, um ensaio do que poderia ser a campanha eleitoral para a Presidência, cheia de presságios sombrios. Para começar, ele já lançou a calúnia de que é manipulável o sistema usado no Brasil para eleições, as urnas eletrônicas, pelo qual foi eleito. A sua saúde está a piorar devido à possível derrota, cada vez mais provável, segundo todas as sondagens, a ponto de já se falar que poderia arranjar uma desculpa para se demitir, caso se visse derrotado de antemão.

O que se teme é que essa renúncia não seja indolor. Bolsonaro elogia diariamente os militares e os policiais, em quem confia para poder tentar, caso se visse perdendo, algum tipo de golpe autoritário para manter-se no poder.

(Transcrito do jornal El País)

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