O desafio da mineração na emergência climática (por Felipe Sampaio)
Representando cerca de 4% do PIB, a mineração legal no Brasil mostra-se decidida a assumir seu papel no debate do clima
atualizado
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Merece reconhecimento o encontro organizado há poucos dias, em Brasília, pela Câmara de Comércio Brasil-Canadá, com foco na promoção das boas práticas de ESG nos negócios da mineração. Confirma a preocupação com governança social e ambiental que vem frequentando a agenda mineral brasileira, notadamente na atual gestão da principal entidade que representa as empresas do setor, o Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM).
A questão não é nova, considerando que, ainda no paleolítico, algum indivíduo inaugurou a mineração quando coletou a primeira pedra para ser usada como ferramenta ou arma. Ao longo dos milhões de anos seguintes, as lascas de rochas evoluíram para pedras polidas e foram substituídas pelos metais, inicialmente o cobre, o bronze e o ferro.
No Brasil, a mineração mudou o rumo do crescimento nacional em pelo menos dois momentos. Primeiro, no século XVII, com a descoberta de importantes depósitos de ouro no interior do País. Mais adiante, no século XX, outro salto foi dado com a exploração de reservas expressivas de ferro, cobre, manganês, alumínio, ouro, entre outros minérios.
A pegada ambiental da atividade mineral cresceu junto com a demanda de outros setores econômicos por matérias primas e fontes de energia mais eficientes e versáteis. Nesse processo, seu caráter extensivo persistiu por mais tempo do que nos setores de transformação, serviços e tecnologia.
A cada novo relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) renova-se a cobrança sobre a mineração em relação às suas repercussões ambientais, desde a pesquisa e lavra, até o transporte, passando pelo tratamento de rejeitos e subprodutos.
Acontece que, levando em conta o perfil global de consumo, em um mundo com 7 bilhões de pessoas ávidas por bens e serviços, o principal desafio das iniciativas de mitigação e adaptação climáticas em geral reside no financiamento das providências urgentes para o enfrentamento da emergência climática.
Em outras palavras, os governos e o setor privado seguem entre a cruz e a espada, diante de um novo dilema fundamental – como atender a necessidades ilimitadas com recursos escassos, sem inviabilizar a vida no planeta. Um problema que supera as contas bancárias das empresas e ultrapassa as fronteiras dos países, colocando na mesa o debate sobre quem paga a conta.
No caso da mineração, atuar no tema da mudança climática equivale a trocar, ao mesmo tempo, os doze pneus de um caminhão em movimento, porque a questão já não é mais apenas de princípios. Historicamente, a extração mineral (que opera em escala colossal) não conseguiu acompanhar os avanços na matriz tecnológica dos setores industrial e de serviços. Foi prioritário investir no volume de produção para atender a demanda dos demais setores.
Representando cerca de 4% do PIB, a mineração legal no Brasil mostra-se decidida a assumir seu papel no debate do clima. Nesse sentido, precisará atuar em, pelo menos, três frentes: na recuperação do passivo ambiental, no investimento na prevenção (ou redução) de danos futuros e no desenvolvimento de tecnologias para adaptação do setor às mudanças climáticas mais intensas, sem descuidar dos fatores produtivos fundamentais para o setor (vulneráveis a eventos climáticos extremos), como: acesso a água, fontes de energia, modais de transporte e jazidas.
Felipe Sampaio: chefiou a assessoria especial dos ministros da Defesa e da Segurança Pública; cofundador do Centro Soberania e Clima, ex-secretário executivo de Segurança Urbana do Recife; atual diretor do SINESP Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública.