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O jazz perde um dos maiores trombonistas de sua história, o brasileiro Raul de Souza. Falecido no último domingo (13/06), em Paris, aos 86 anos, em decorrência de um câncer, Raul de Souza se destacou no jazz internacional pela originalidade de seus improvisos. Inspirados e desconcertantes, seus solos escapavam do tema principal, embrenhando-se por caminhos tão inesperados, que surpreendiam e deleitavam os ouvintes.
Nascido no Rio de Janeiro, em 1934, como João José Pereira de Souza, ele teve seu primeiro emprego como músico aos 16 anos. Jovem, foi prestar o serviço militar na Aeronáutica, integrando a banda da Força Aérea, já como trombonista.
Nas horas de folga, o músico frequentava a Rádio Nacional do Rio de Janeiro, participando dos programas de calouros da emissora. No mais famoso deles, o apresentador Ary Barroso decidiu que João José não era nome de artista e mudou seu nome para Raul, inspirado no trombonista Raul de Barros. E ali ele virou Raulzinho, porque o outro, era o Raulzão.
Dali também surgiu a primeira oportunidade de aparecer em uma gravação, convidado pelo músico Altamiro Carrilho. O flautista montou uma superbanda, com jovens talentos, para a gravação do disco A Turma da Gafieira, de 1957. E a turma, além de Raul de Barros, contava com Sivuca, Baden Powell, Edison Machado, Zé Bodega, José Marinho e o maestro Cipó.
Mas a grande estreia de Raul de Souza é no álbum Você ainda não ouviu nada (1964), com o Bossa Rio, de Sérgio Mendes. Com arranjos de Tom Jobim, o disco é uma referência do nascente samba jazz brasileiro. No ano seguinte, o trombonista grava seu primeiro disco como líder Raulzinho – À Vontade Mesmo (1965). Raul de Souza revê o repertório da bossa nova e do jazz, acompanhando do Sambalanço Trio, com os iniciantes Cesar Camargo Mariano, ao piano; Humberto Clayber, no baixo; e Airto Moreira, na bateria.
Em 1968, Raul de Souza lança mais um disco solo, dessa vez no comando da banda Rauzinho e o Impacto 8. É o álbum Internacional Hot, que tem repertório de jazz e pop internacional, em levada de samba jazz. No início de 1970, a convite de Airto Moreira, ele se muda para os Estados Unidos. Em 1974, lança seu primeiro disco gravado por lá, Colors, produção de Airto Moreira.
A carreira de Raul de Souza deslancha nos Estados Unidos, a partir daí. Seus álbuns seguintes foram produzidos pelo tecladista George Duke e consolidaram seu nome como um dos melhores trombonistas do jazz. São os discos: Sweet Lucy, 1977; Don’t Ask My Neighbours, 1978; Till Tomorrow Comes, 1978, gravados para o selo Capitol. Em seu período americano, Raul de Souza tocou com os grandes nomes do jazz como Sonny Rollins, Sarah Vaughan, Cal Tjader, Freddie Hubbard, Hubert Laws, Wayne Shorter e um de seus trombonistas favoritos da juventude, Frank Rosolino.
Nos últimos anos, Raul de Souza havia fixado sua residência na França, passando alguns períodos no Brasil. Entre seus álbuns mais recentes editados no Brasil um destaque especial para o disco Bossa Eterna (Biscoito Fino – 2008), que ele divide com João Donato e seu Trio. Blue Voyage (2018), foi gravado na França e editado no Brasil pelo selo SESC. Seu trabalho mais recente foi lançado na França em maio passado, o álbum Plenitude. Nele, Raul de Souza faz um retrospecto de sua carreira, com novas versões de seus temas preferidos, acompanhado de sua Generation Band.
Para homenagear o grande trombonista e figura humana que foi Raul de Souza, ficamos aqui o vídeo de uma de seus últimas apresentações ao vivo, no festival Jazz in Langouria, em agosto de 2019, na França. Descanse em Paz, Raulzinho!
Flávio de Mattos é jornalista e escreve aqui sobre jazz a cada 15 dias. Dirigiu a Rádio Senado. Produz o programa Improviso – O Jazz do Brasil, que pode ser acessado no endereço: senado.leg.br/radio