Moro e Alckmin no centro das atenções (por João Bosco Rabello)
Moro explora bem o nicho do eleitorado “nem, nem” – nem Lula, nem Bolsonaro
atualizado
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Duas premissas devem orientar as avaliações sobre 2022 e guardam entre elas relação de causa e efeito. Não obstante a importância da cadeira presidencial, essas serão eleições essencialmente legislativas, fator determinado pelo fim das coligações e vigência da cláusula de barreira.
Essas medidas só agora impõem seus efeitos plenos e fixam a segunda base para raciocínios: o foco está no reforço e ampliação das bancadas pelas legendas maiores, e de sobrevivência pelas menores, que buscarão abrigo nas federações partidárias para não desaparecerem.
Nesse contexto, nem todas as candidaturas postas até aqui, têm o propósito de concorrer efetivamente à sucessão do presidente Jair Bolsonaro. E, entre as que têm esse objetivo, algumas precisarão demonstrar viabilidade para sobreviverem. Por isso, as pesquisas que se sucedem são fotografias de momento, embora apontem tendências a se levar em conta.
É por essa razão também que as candidaturas de Lula e Bolsonaro permanecem no centro da disputa. Por ora, são elas que efetivamente podem ser dadas como certas em um segundo turno, cenário que pode sofrer alterações no curso do ano eleitoral – este ainda submetido a prazos de convenções e precedido de bastidores intensos que só agora ganham intensidade, findo o ano legislativo.
Negociações
Nesse estágio, desenvolve-se uma negociação para viabilizar uma federação, capitaneada pelo PT, para abrigar PSB e PC do B, que se amarrarão por quatro anos, período em que poderão funcionar como estruturas partidárias independentes, mas com um só líder em cada casa legislativa, com ação política unificada e acesso ao Fundo Partidário, conforme legislação específica.
No plano federal o arranjo é mais fácil, embora não seja possível alterar o curso da convivência, com Lula como o candidato natural. No plano regional é que se torna operosa a conciliação de interesses. Rede e PV devem também recorrer à Federação para sobreviverem. PDT e Psol seguem sozinhos, pelo menos por enquanto, mas todos têm até abril o prazo final da Lei para essa opção.
Movimentos
Encerradas as prévias do PSDB que definiram João Dória como o candidato da legenda à sucessão, a primeira expectativa é com relação ao ex-governador Geraldo Alckmin, cuja filiação a uma nova legenda o coloca entre PSB e PSD. É uma definição importante porque poderá determinar sua opção pelo governo de São Paulo ou de vice de Lula. Se Alckmin se filiar ao PSB sinalizará para esta última. Se pelo PSD, para a primeira.
Portanto, as prévias do PSDB constituem o evento deflagrador do processo de negociações. Nesse caso, o próprio partido ainda metaboliza o resultado que deve orientar a permanência de Eduardo Leite na legenda em razão do cacife com que deixa a mesa de jogo: 45% das preferências, o que o une a Aécio Neves na divisão da liderança interna que passam a dividir com Dória.
Já o governador paulista, além de cuidar das feridas deixadas pelas prévias, precisará demonstrar, até a convenção de julho, viabilidade eleitoral para manter-se como candidato. Não parece tarefa fácil dada a renitente desproporção entre sua visibilidade na chefia do mais importante estado da Federação, o ativo conquistado com o êxito na vacinação e o baixo índice nas pesquisas. A permanecer esse quadro, a convenção de julho poderá decidir por uma aliança ( que Dória já admite com Moro) –, mas cujo aval dependerá da desenvoltura do ex-juiz e ministro de Bolsonaro.
Moro
Sérgio Moro é o fato instigante até agora no cenário sucessório. O impacto na largada confirmou a expectativa criada para a candidatura que já na primeira pesquisa – da Ponteio, amplamente confirmada pelas que vieram posteriormente -, exibiu 11% nas simulações de primeiro turno e 18% nas que não consideraram Bolsonaro.
Nos últimos dias, Moro tem cumprido um script de pré-campanha eficiente e cuidadoso que indica ter o diagnóstico correto para seu fortalecimento. Demonstra ter percebido que o combate à corrupção, sua principal marca política, tornou-se secundária ante o quadro de economia agravado pela pandemia.
A faixa de pobreza migrou para a da miséria e a classe média empobreceu e lida com dificuldades provavelmente inéditas. Se na era Lula, essa classe média ganhou maior poder aquisitivo, figurando de forma efêmera em uma nova faixa de renda, agora dá-se o mesmo, porém de forma inversa: desceu alguns degraus.
A campanha de Moro, então, anuncia uma força-tarefa – não mais para combater a corrupção, mas a pobreza. Não abandona a principal bandeira, mas a hierarquiza no cenário emergencial do país.
Na percepção do eleitor, a imagem de inimigo da corrupção já está consolidada e a construção da candidatura deve se apoiar em outros pilares. Por isso, acerta o discurso para o mercado e para o eleitorado com a reafirmação de uma pauta econômica liberal e ortodoxa, como ele, (a escolha de Celso Pastore tem esse objetivo) e uma agência para enfrentar os dramas sociais.
Moro explora bem o nicho do eleitorado “nem, nem” – nem Lula, nem Bolsonaro. É o candidato que pode bater, sem sugerir um marketing de ocasião, nos dois ao mesmo tempo: prendeu o primeiro e denunciou o segundo.
Se a linha de campanha adotada será suficiente para consolidá-lo como candidato com chance de ir ao segundo turno só o tempo dirá. Mas, até aqui, acena ao eleitor comum e ao mercado com discurso e escolhas corretos.
É nesse contexto que mergulham agora os estrategistas partidários, como Gilberto Kassab, empenhado na fórmula de ampliar a bancada do PSD no plano federal, e também na expansão territorial do partido e apresentar-se como fiel de balança dos futuros governos – mais importante do que a conquista da presidência da República. O PSD hoje caminha para ser o MDB de ontem.
Kassab constrói com frieza e paciência palanques regionais essenciais a qualquer candidato ao Palácio do Planalto – e já os tem garantido em Minas, Rio e Santa Catarina, restando agora consolidar o de São Paulo, onde Alckmin. Rodrigo Garcia e Márcio França são as peças do jogo.
Aqui entra e se explica a candidatura do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco. Ela tem objetivo claro e pragmático: liberar os candidatos federais do partido para atacar ou defender o governo Bolsonaro nas suas campanhas conforme suas conveniências, ditadas pelas circunstâncias regionais. Antes de candidato, Pacheco cumpre uma missão: a de reservar a escolha do partido para o segundo turno das eleições presidenciais.
Kassab tem um concorrente na busca pela hegemonia partidária: o União Brasil que resultou da fusão do DEM e PSL com o mesmo propósito de ser ator influente no futuro governo. A disputa é pelo primeiro lugar, porque ambos deverão conseguir o protagonismo que buscam desde já.
João Bosco Rabello escreve no Capital Político. Ele é jornalista há 40 anos, iniciou sua carreira no extinto Diário de Notícias (RJ), em 1974. Em 1977, transferiu-se para Brasília. Entre 1984 e 1988, foi repórter e coordenador de Política de O Globo, e, em 1989, repórter especial do Jornal do Brasil. Participou de coberturas históricas, como a eleição e morte de Tancredo Neves e a Assembleia Nacional Constituinte. De 1990 a 2013 dirigiu a sucursal de O Estado de S. Paulo, em Brasília. Recentemente, foi assessor especial de comunicação nos ministérios da Defesa e da Segurança Pública