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Imaginação sociológica (por Paulo Delgado)

Lula, como presidente, é Pessoa, necessidade e ansiedade. O Mercado, como atividade, é bolsa, dólar e juro

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Lula Fui vítima da maior mentira jurídica contada em 500 anos - O ex-presidente, que ficou preso 580 dias por corrupção e lavagem de dinheiro, teve as condenações anuladas
1 de 1 Lula Fui vítima da maior mentira jurídica contada em 500 anos - O ex-presidente, que ficou preso 580 dias por corrupção e lavagem de dinheiro, teve as condenações anuladas - Foto: Fabio Vieira/Metrópoles

Lula não deveria está sendo criticado pelo que diz, o Mercado é que deveria estar preocupado com o que pensa. Lula, como presidente, é Pessoa, necessidade e ansiedade. O Mercado, como atividade, é bolsa, dólar e juro. Há na ética da discussão uma questão da verdade.

Não é uma briga de família onde um não aceita o fato de que o outro tenha opiniões infalíveis. É a necessária ecologia da sobrevivência de uma comunidade que não anda sendo motivada pela racionalidade. O Mercado é impessoal, opera moeda estrangeira, muda de opinião sem culpa. A Pessoa tem um coração, usa a moeda nacional, muda de opinião para não se arrepender.

O Mercado não é uma família fraterna. Surgiu da tradição especulativa da economia, joga jogos rivais. Não gosta de admitir que sua realidade é feita de duas perspectivas diferentes, mas complementares e igualmente importantes na vida de uma nação. Mesmo assim gosta de considerar que só “ele”, somente ele pode se reconhecer como fonte última e mais importante das suas opiniões falíveis.

A escola do Mercado não ensina o que está ocorrendo na luta geral pelo poder. Seu praticalismo é frio e não estabelece relação afetiva com o dinamismo da sociedade. A escola da Pessoa é o calor da vida, sua insurgência e as relações mutuas estabelecidas fora dos altos círculos econômicos. Separadamente elas não conseguirão construir uma engenharia social de mudança.

O Mercado é sectário, focado nos seus problemas internos, não é abrangente, nem comunicativo. Mas pensa ter um padrão institucional moralmente antisséptico, um baluarte do formalismo, fornecendo regras para a ação prática do governante, visto como seu cliente. A Pessoa é perplexa, tem vida de artesão, professa isenções às vezes vagas e diluídas, inclusive sobre o Mercado que, ingrato, não quer sua intimidade.

Mercado e Pessoa precisam se encontrar para melhor expressar as características presentes na vida brasileira, especialmente as tradições não proveitosas e inexatas, que distanciaram nossa sociedade um do outro. Esse abandono do diálogo entre economia e sociedade na nossa história torna impossível compreender e enfrentar a inflexibilidade de status que nos domina e a rigidez de nossa estrutura de classes.

A falta de mobilidade social crônica e a necessidade permanente de políticas sociais complementares é uma decadência. Têm sua origem na falta de comunicação e combinação entre os diversos componentes e as diversas funções executadas pelas instituições diante da variedade humana. O certo é que o Mercado encontrou seu lugar na “estrutura” que tanto critica, enquanto a Pessoa continua a procura do “ambiente” que a reconheça e valorize.

Opor princípios a ideias, realidade a interesses está cada vez mais difícil no Brasil. Quanto de realidade o Mercado e a Pessoa suportam? A imprevisibilidade social, econômica e fiscal é um problema dos membros da mesma família da moeda. Até que alguém seja capaz de propor um acordo que defina soluções aceitáveis para todos os envolvidos é inútil um tentar sufocar o outro.

É hora de imaginação sociológica. Mercado e Pessoa devem estabelecer vínculos em busca de melhor argumento para enfrentar as dificuldades de conviverem.

 

PAULO DELGADO é Sociólogo e Consultor.

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