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Fogo chamuscou o governo (por André Gustavo Stumpf)

O governo do presidente Lula é o mais notável ausente.

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Governo do Estado de São Paulo
queimada sp 7
1 de 1 queimada sp 7 - Foto: Governo do Estado de São Paulo

Tom Jobim dizia que todo brasileiro deveria ter autorização, semelhante ao porte de arma, para utilizar caixa de fósforo. Há uma antiga mania de limpar terreno com fogo. O que deveria ser um acero pode se transformar, nos meses secos, agosto e setembro, em violento incêndio que caminha por quilômetros e devasta áreas enormes. A floresta se regenera, ano após ano, mas os animais sofrem muito e dificilmente retornam aos locais queimados, mesmo porque a maioria deles se transforma em pasto.

A violência e a extensão dos incêndios que lavraram em todo o país demonstram a incapacidade da burocracia de responder rapidamente aos desafios da vida assolada por fenômenos climáticos. O próprio presidente Lula admitiu que o governo e os estados não estão adequadamente preparados para enfrentar o fenômeno, embora ele seja sazonal. Ocorre todos os anos. Em Brasília, o responsável pela defesa do meio ambiente prometeu que, ‘no futuro próximo’ instalará postos para antecipar a ocorrência do fogo. É a completa falta de noção da realidade.

O governo do presidente Lula é o mais notável ausente. Tão ausente que foi o ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal, ex-ministro da Justiça, que deu as ordens para que os órgãos do Poder Executivo deixassem as suas respectivas zonas de conforto e fossem à luta contra o fogo. A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva limitou-se a constatar que até o final do século o Pantanal e boa parte da Amazônia terão desaparecido. Sua declaração é uma espécie de confissão de impotência.

Os fazendeiros do pantanal têm seus próprios meios para defender criações de gado e o meio ambiente, que rende bom dinheiro, por intermédio do turismo. Sempre ocorreu o fenômeno do fogo, em grandes incêndios naquela região. Agora, tomou proporções bíblicas e se consorciou com seca severa. A mistura dos dois elementos, somados à vento forte, detonou o pior dos mundos na região. O pessoal do governo chamou os incêndios de criminosos. Não é isso. Ocorre o que Tom Jobim já tinha identificado: o brasileiro tem mania de colocar fogo no mato. É a vocação para ser piromaníaco.

De certa forma, as mesmas desculpas são aplicadas aos problemas da Amazônia. No início do governo Lula, os órgãos oficiais anunciaram que iriam proteger as reservas indígenas e proibir o ingresso de garimpeiros na área. Queimaram equipamentos de alto valor, deram tiro para todos os cantos, transportaram índios doentes de helicóptero, levaram remédios e mamadeiras de avião. Foi um show destinado a convencer o pessoal do centro-sul de que o Norte estava protegido. Mera ilusão.

A Amazônia, em termos de área, é mais da metade do território brasileiro. Toda a Europa ocidental cabe ali. França por exemplo tem tamanho parecido com Minas Gerais. Espanha com Bahia. As forças armadas brasileiras não têm condições de defender a fronteira nacional, vazada por contrabandistas de todos os tipos. A Amazônia continua entregue à própria sorte. Os ambientalistas oficiais querem transformá-la num santuário para os gringos fotografarem macaco e jacaré.

O garimpo é outro problema sério e profundo. O ouro brasileiro é contrabandeado para o exterior, não paga impostos e rende muito para investidores estrangeiros. Segundo os cálculos dos especialistas, os garimpeiros somam cerca de 25 mil a trinta mil brasileiros que entram na mata, correm todo os riscos, em busca do metal precioso. Fazem isso porque há muito ouro na Amazônia. Óbvio. A tragédia do óbvio é não ser reconhecido.

Enxotar os garimpeiros é abandonar uma riqueza considerável e admitir que há brasileiros de primeira e segunda classe. É mais fácil chamar a polícia, fazer algumas operações na frente dos repórteres de televisão e depois esquecer o assunto. É o que o governo fez. Ou seja, não avançou em nada no sentido de incorporar a Amazônia como entidade econômica ao centro-sul do país. A única medida efetiva em favor da Amazônia foi a criação da Zona Franca de Manaus, por Roberto Campos, nos anos sessenta. A esquerda combate até a abertura de estradas, o que permitiria maior circulação da riqueza. É um reacionarismo insensato.

O fogo teve o mérito de chamar atenção de todo o Brasil para a realidade da vida dos brasileiros na Amazônia. Os pantaneiros foram lembrados por sua aflição diante da expansão das labaredas que prejudicaram a criação de gado e invadiram as áreas de proteção ambiental. É uma tragédia que o governo não conseguiu perceber. Ficou atônito, na expectativa de que o assunto se resolvesse por ação do divino ou de uma chuva fora de hora. Nada disso aconteceu e a burocracia tenta um segundo golpe: depois da liberação de verbas, a criação da Autoridade Climática, que ninguém sabe o que seria porque já existe o Ministério do Meio Ambiente. Muitas palavras e nenhuma ação.

 

André Gustavo Stumpf, jornalista (andregustavo10@terra.com.br)

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