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Eles não querem Maduro (por Mary Zaidan) 

Lula trata a eleição na Venezuela como se fosse um democrata o ditador que ameaça o povo com um banho de sangue no caso de derrota

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Nicolás Maduro, ditador venezuelano -- Metrópoles
1 de 1 Nicolás Maduro, ditador venezuelano -- Metrópoles - Foto: Jesus Vargas/Getty Images

Os venezuelanos vão às urnas no próximo domingo para votar em peso no candidato de oposição Edmundo González e Nicolás Maduro será reeleito. E, pelo andar da carruagem, com as bênçãos do Brasil. “Eles que elejam os presidentes que quiserem”, disse Lula na sexta-feira, como se fossem livres as eleições promovidas pelo ditador do país vizinho.

González, candidato arranjado na última hora pela oposição depois de a Justiça de Maduro declarar Maria Corina inelegível e, em seguida, impedir o registro de Corina Yoris, aparece com 59% das intenções de voto contra 24,6% do ditador na última pesquisa realizada em 11 de julho pelo Centro de Estudos Políticos e Governamentais da Universidade Católica Andrés Bello e a empresa Delphos.

A diferença é tão acentuada que, segundo analistas, praticamente inviabilizaria a máquina de fraudes de Maduro. Nem mesmo uma eventual baixa presença de eleitores, temerosos frente ao estímulo à violência reiterado nos últimos dias, seria suficiente para evitar a derrota do bolivariano.

Espremido, Maduro tem poucas alternativas para se manter no poder: adiar o pleito e ganhar tempo para inviabilizar o rival ou atiçar uma “revolta popular” para justificar um auto-golpe contra os “fascistas”, opção que ele já antecipou ao ameaçar o povo com “um banho de sangue” e uma “guerra civil fratricida” caso não seja reeleito.

Essas nada improváveis alternativas apertam ainda mais a já justa saia do Brasil. Maduro, vetado em boa parte dos fóruns internacionais, incluindo o Mercosul, e recebido com tapete vermelho em Brasília, tem deixado o amigo Lula em maus lençóis. Ainda que só no papel, tomou da Guiana o território de Essequibo, ato que mesmo fake exigiu ação das Forças Armadas brasileiras, que deslocaram equipamentos e homens para prevenir uma eventual invasão por terra. E chamou o Brasil como testemunha do Acordo de Barbados, firmado em outubro do ano passado, tratativa que Maduro nunca pensou em honrar.

Hoje, a nota oficial emitida pelo governo brasileiro à época parece piada. Nela, o Brasil congratula-se com o governo e a oposição venezuelanas pela assinatura do acordo, no qual Maduro se compromete com eleições livres e limpas em 2024 e com a libertação de oposicionistas presos, e os Estados Unidos com o levantamento parcial das sanções impostas à Venezuela. Mais: embora só os Estados Unidos tenham cumprido o combinado, são eles, “o grande satã”, os únicos criticados pelo lado brasileiro por imporem “sanções unilaterais” à Venezuela.

Em junho, quando Maduro impediu o registro das candidatas da oposição, o Itamaraty chegou a afirmar oficialmente que o bloqueio não era compatível com o Acordo de Barbados, “assinado para garantir um processo eleitoral transparente”. A reação parou por aí. O autocrata venuzuelano rasgou o acordo e o Brasil fez pouco caso de sua condição de testemunha. Ficou mudo. Dia após dia, Maduro foi derrubando cláusulas. As detenções arbitrárias continuaram – hoje somam mais de 300 presos políticos, segundo a organização Foro Civil – e dos estimados 4,5 milhões de venezuelanos residentes no exterior, apenas 69 mil foram autorizados a votar.

Ainda assim, Lula continua defendendo o pleito venezuelano como se tudo estivesse correndo dentro da normalidade. Chegou a propor o retorno do vizinho ao Mercosul depois das eleições do próximo dia 28. Na sexta-feira, desconheceu o “banho de sangue” prometido por Maduro em caso de derrota, reiterando a conveniente postura de não interferência do Brasil em assuntos internos de outros países. “Todo mundo gosta do Brasil e o Brasil tem de gostar de todo mundo. Por que eu vou querer brigar com a Venezuela? Por que eu vou querer (brigar) com a Nicarágua? Por que eu vou querer (brigar) com a Argentina?”, disse, antes de soltar a pérola de que em qualquer país eles podem eleger quem quiser. No caso da Venezuela, isso é ficção pura.

O frágil argumento de Lula esbarra no próprio Lula. Só para ficar em exemplos recentes: o presidente brasileiro fez campanha e torceu por Sérgio Massa contra Javier Milei – “A Argentina precisa de um presidente que goste de democracia e goste do Mercosul” -, e comemorou a vitória de Cláudia Sheinbaum, no México, pupila do amigo López Obrador – “estou feliz porque duas mulheres disputaram e ganhou aquela que representa o lado progressista”.  Não se vê inibição também nas críticas a Israel ou na estranha posição de equivalência entre vítima e agressor na guerra de Vladimir Putin contra a Ucrânia.

Com pesos e medidas fixados a partir de balizas ideológicas, que de antemão descartam as premissas básicas da democracia, Lula se coloca diante de uma enrascada. Terá, possivelmente, de decidir entre apoiar ou condenar um auto-golpe de Maduro. É a bet do ano – façam suas apostas.

Mary Zaidan é jornalista 

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