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Determinismo histórico (por André Gustavo Stumpf)

A representação popular tende a piorar pela ação do populismo e da demagogia que enfraquecem o sistema de representação

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Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados
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1 de 1 Imagem colorida do Plenário da Câmara dos Deputados - Metrópoles - Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

O saudoso Ulysses Guimarães costumava dizer que o próximo Congresso será inferior ao atual. Trata-se, segundo o ilustre autor, de uma espécie de determinismo histórico. A representação popular tende a piorar pela ação do populismo e da demagogia que enfraquecem o sistema de representação. No Brasil, a tradição política contempla partidos políticos muito fracos, que pouco mais são que meras legendas destinadas a abrigar grupos ocasionais de pessoas. Eles não respondem a nenhuma ideologia, nem pretendem implantar algum tipo de política pública específica.

É uma visão triste da política brasileira, mas que se concretiza no cotidiano do parlamento. Não há mais grandes discursos, figuras emblemáticas, ataques sutis e ferinos feitos com inteligência. O exercício da política se resume a busca de verbas que devem ser distribuídas sempre com a preocupação de beneficiar o autor ou seus apaniguados. O político que enxerga a próxima geração foi substituído pelo que enxerga apenas a próxima eleição. Não há planejamento, nem visão de futuro.

Nem sempre foi assim. Um belo exemplo da política brasileira ocorreu no episódio longo de redemocratização iniciada no governo do general Ernesto Geisel. Foi naquele período que teve início o processo de longo restabelecimento das liberdades democráticas. No início, a censura à imprensa foi liberada aos poucos. E houve vários capítulos, nesta novela, que contemplou idas e vindas. Mortes por tortura em presídios militares, militares de direita provocando acidentes, bombas em jornaleiros e em espetáculos públicos. Foi um processo tenso, difícil, lento e muito conversado.

Thales Ramalho, secretário-geral do velho MDB, conversou com a esquerda e com o general Golbery do Couto e Silva. Tancredo Neves negociou com os militares radicais. Ulysses conversou com todo mundo. Marco Maciel correu de um lado ao outro para impedir a vitória da candidatura Paulo Maluf. Tudo isso foi feito à luz do dia, conversas claras, meridianas, objetivas. A discussão sobre anistia envolveu o então ministro da Justiça, Petrônio Portella, que conseguiu chegar a um termo de consenso. Nada foi fácil.

Ocorreu o tremendo acidente da morte de Tancredo Neves poucos dias antes da posse. Assumiu a cadeira presidencial o senador José Sarney na condição de vice-presidente no exercício da presidência. Ele também foi um contorcionista político de qualidade. Saiu da ARENA, partido político que dava sustentação ao governo militar, para assumir a presidência da República na legenda do MDB. Teve que aguentar Ulysses Guimarães na presidência da Câmara dos Deputados, do partido e da Assembleia Constituinte. Os militares deixaram o poder de maneira negociada. Ninguém disparou um tiro. Ninguém foi preso. Obra política perfeita.

Nenhum dos políticos que trabalharam na transição está mais em Brasília. Lula, que foi deputado constituinte, nesta época ainda vestia o uniforme de radical de esquerda. Ele não queria se envolver nas negociações político-partidárias. Foi o sinal para que o PT proibisse seus deputados de assinarem o texto da Constituição de 1988. Quem o fez, foi expulso da legenda. Os seguidos erros do partido, as pesadas acusações de corrupção em diversos setores do governo levaram o eleitor ao descrédito. Este ambiente permitiu o surgimento de Bolsonaro, que, em nenhuma outra circunstância, pensaria em ser candidato à Presidência da República.

Bolsonaro fez péssimo governo, sem projeto, plano, metas ou qualquer tipo de planejamento. Foi errático. No entanto, criou uma fornada de seguidores. Ele está com direitos políticos suspensos, mas tem correligionários. Eles foram eleitos para o Congresso Nacional. Acontece, então, uma curiosa inversão de posições. A oposição tem maioria no Congresso E o PT, que venceu a eleição com Lula, é minoritário no parlamento.

A suspeita de que o Poder Judiciário trabalha ao lado do Executivo faz com que congressistas estejam distantes da realidade brasileira que pega fogo de leste a oeste. Os deputados queriam votar anistia para os que depredaram as sedes dos três poderes no dia oito de janeiro de 2023. O debate foi adiado para depois da eleição. O objetivo é anistiar quem invadiu e destruiu os prédios do Supremo Tribunal Federal e do Palácio do Planalto. É de uma audácia incrível.

Outro projeto propõe o impeachment do Ministro Alexandre de Moraes, que tirou do ar a rede social X, por descumprir determinações da justiça brasileira. E ainda há a PEC 28/24, que dá aval ao Congresso para derrubar decisões do STF. E a PEC 8/21 que limita as decisões monocráticas de ministros do Supremo e outros tribunais superiores. É um jogo de retaliações que não acrescenta nada, nem ter por objetivo melhorar a vida dos brasileiros. Os parlamentares estão vivendo em outro país.

 

André Gustavo Stumpf, jornalista (andregustavo10@terra.com.br)

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