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Defesa da legitimidade das emendas parlamentares (por Leonardo Barreto

De repente as emendas parlamentares tomaram de assalto o debate político

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De repente as emendas parlamentares tomaram de assalto o debate político apesar de estarem por aí desde sempre. Quase sem exceções, o tema é apresentado como uma forma de sequestro do orçamento por parte do Legislativo, uma porta para corrupção e um atentado contra o bom funcionamento das políticas públicas. Uma aberração.

Mas há um outro lado da moeda.

As emendas parlamentares, instrumento usado por deputados e senadores para participar na distribuição do orçamento, é uma parte constitutiva do DNA do sistema político brasileiro e contribui para a legitimação da democracia. Tudo por causa de uma ponte construída pelo nosso singular modelo eleitoral de listas abertas.

Nele, o candidato a vereador, deputado estadual e deputado federal interage diretamente com o eleitor. O voto é do tipo uninominal, sendo direcionado para uma pessoa (ou um partido, em uma parcela quase insignificativa). Pode ser que, durante a campanha, uma parte dos votantes peça ao candidato que adote uma ou outro posicionamento uma vez eleito, mas é natural que nos acordos que vão sendo costurados entre eles, também esteja a promessa de envio recursos financeiros para obras ou para o funcionamento de serviços públicos, especialmente nos estratos mais carentes da sociedade.

Ou seja, se o representante do legislativo não tiver acesso ao orçamento, é possível que ele perca sua relevância para indivíduo que, hoje, já tende a atribuir mais importância à eleição majoritária.

Para eliminar qualquer ingerência sobre o orçamento, portanto, é preciso mudar o sistema eleitoral. Um caminho é adotar as listas fechadas, no qual quem pede voto é o partido, fazendo campanhas institucionais amplas e interação pessoal pequena entre candidato e eleitor. Aí sim prevaleceria uma atuação concentrada na opinião e não na atuação individual de parlamentares para atender pedidos de obras e serviços por parte da população.

Por isso, na hora de comparar o volume de recursos controlado pelo Congresso brasileiro e os de outros países é preciso levar em conta que a relação entre eleitor e parlamentar tem uma natureza diferente da que existe aqui. Repito: o que move o deputado na direção do orçamento é a necessidade de atender ao eleitor e obter novos mandatos (em regra).

Essa regra se prova também no sistema eleitoral estadunidense, que promove uma interação direta entre eleitor e parlamentar por meio do representante distrital. Também lá as emendas possuem uma importância enorme, tendo aumentado sua participação no total do orçamento de forma constante.

Se as emendas fossem proibidas do dia para noite, o Congresso no Brasil sofreria um forte golpe de legitimidade. De maneira geral, deputados teriam mais dificuldade de mobilizar eleitores nas campanhas, a relação entre prefeitos e Brasília seria toda deslocada para o Planalto, num movimento de verticalização perigosa em tempos de fragilização generalizada da democracia.

Isso não significa que não exista coisas erradas na forma como as emendas estão operando hoje. Há um déficit de transparência importante e deve-se fazer um debate sobre como aumentar eficácia do seu uso (mas essa provocação também vale para o Executivo). Mas, como tudo em democracia, é preciso reconhecer que há um princípio fundamental que justifica a sua existência – e talvez até o seu volume – que é o direito de o eleitor, por meio do seu representante, acessar ao orçamento.

 

Leonardo Barreto é doutor em Ciência Política pela UnB e consultor político independente

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