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Congresso forte e sem pauta (por João Bosco Rabello)

Menos partidos, mais força política e uma supremacia conservadora a desafiar o Executivo

atualizado

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apoiadores do ex presidente jair bolsonaro patriotas invadem a rampa do Congresso Nacional para protestar contra o resultado das urnas 1
1 de 1 apoiadores do ex presidente jair bolsonaro patriotas invadem a rampa do Congresso Nacional para protestar contra o resultado das urnas 1 - Foto: null

O Congresso que toma posse em 1º de fevereiro guarda mais diferenças em relação ao da legislatura que se encerra do que a da habitual renovação de quadros. Tem menos partidos, mais força política e uma supremacia conservadora a desafiar o Executivo.

O jogo político, que começa agora, tem um aspecto a mais que a mera disputa numérica de bancadas. Carrega uma motivação corporativa, suprapartidária, de consolidar o Poder Legislativo como protagonista da cena política, impondo-se ao Executivo.

Esse enredo vem desde a aprovação do orçamento impositivo, ainda no governo Dilma, foi habilmente administrado por Michel Temer, dobrou a estratégia de Bolsonaro de governar hostilizando a política e chega em 2023 embalado pela incontornável reeleição de Arthur Lira, praticamente por aclamação.

Sofreu um revés com o veto judicial ao orçamento secreto, mas este parece já ter cumprido seu principal objetivo, de sacramentar o poder de Lira, e ganha nova versão pela via das emendas individuais e outros expedientes, alguns ainda em estudo.

Para sua consolidação, porém, precisará superar barreiras dentro do próprio Legislativo. Uma delas, o ciclo de ajustes na convivência entre diferentes legendas que se fundiram para sobreviver às novas regras eleitorais vigentes nas últimas eleições.

Outra, vinculada a esta, é saber o que fazer com tanto poder. Sem organicidade, é um projeto fadado ao desgaste que ameaça a ideia de firmar o chamado semipresidencialismo, com vistas a um regime parlamentarista mais na frente.

Para se ter a iniciativa da pauta política, impondo-se ao Executivo, é preciso ter… uma pauta política. Projetos e programas que reflitam uma reordenação estrutural do país – um salto do varejo para o atacado, com uma qualidade técnica que parece escassa nas legendas que se tornaram superpoderosas.

Nesse momento, é um Congresso politicamente forte, mas fraco de ideias.

A desorganização das legendas anabolizadas pelos sobreviventes da cláusula de desempenho e do fim das coligações é visível e, possivelmente, é no União Brasil onde pode ser vista a olho nu.

Mas não só: o PL, majoritário, vive a luta interna entre moderados e bolsonaristas – e, de outro lado, já tenta se defender de alianças das demais legendas ideologicamente alinhadas, mas que lutam por espaços na estrutura de poder congressual.  Nas demais legendas não é diferente.

É nesse contexto que tentam equilibrar os interesses próprios com a meta comum de subjugar o Executivo. À exceção da reforma tributária, pouco se sabe sobre unidade programática desse consórcio majoritário de centro para a direita, além de outras medidas de afirmação de poder como, por exemplo, conquistar a prerrogativa de nomear diretores de agências reguladoras e coisas do gênero.

O cenário preocupa – e incomoda – experientes políticos que já sentem a dificuldade de orientar as ações partidárias para um rumo comum.

No União Brasil, a título de reforço ao diagnóstico, é claro o clima de “barata voa”. Não há uma liderança como ficou patente na escolha dos três ministros do partido.

Empenhado na reeleição de Rodrigo Pacheco no Senado, Lula entregou esse direito ao senador Davi Alcolumbre que indicou três nomes à revelia da bancada da Câmara – um deles, fake , Waldez Goés, da Integração, filiado ao PDT.

O partido se ressente do sumiço de ACM Neto, após a derrota eleitoral ao governo da Bahia. Seria uma liderança natural na legenda que não tem em seu presidente, Luciano Bivar, um perfil agregador e de expressão política capaz de conduzir as negociações em ambiente disputadíssimo.

No PL, a meta de Valdemar da Costa Neto de herdar o bolsonarismo, com vistas às eleições municipais daqui a dois anos, tem levado a movimentos erráticos, desde a ação no Tribunal Superior Eleitoral para anular apenas o segundo turno das eleições, até a precipitada ideia de fazer de Michele Bolsonaro a sucessora do marido asilado na Flórida.

O governo Lula tenta explorar essas fragilidades para ampliar ainda mais sua insuficiente base parlamentar à moda antiga, com distribuição de cargos, contrapondo ao semipresidencialismo o velho presidencialismo de coalizão.

Seu principal adversário nesse contexto é seu próprio partido, o PT, que exibe ainda todos os cacoetes sectários de outrora. A imposição de um governo de alianças ao PT responde pelo oscilante discurso presidencial – ora uma face aparentemente harmonizada, ora um rosto do passado.

Foi o caso do recente ataque a quem estava quieto, o ex-presidente Michel Temer, acusado de golpista, predicado que entre outros males, alcança, pelo menos, seis ministros do atual governo.

Ao investir contra um fundamento da política – o de não falar além do necessário -, Lula exibe o mesmo problema do Congresso de Lira: tira o foco do essencial – apresentar programas – para misturar arroz com macarrão.

Por ora, enquanto perdurar os efeitos da tentativa de golpe, consumada e fracassada em 8 de janeiro, Lula tem uma blindagem que gradua as críticas ao seu início de governo, tornando-as mais amenas do que em circunstâncias normais.

Porém, isso tem prazo de validade e quando este chegar é preciso ter mais que o discurso contra os predadores da democracia. A partir daí, o discurso formado em cima do golpe passa a interessar apenas ao bolsonarismo, para manter a polarização como antídoto à aliança costurada na frente ampla da eleição.

 

João Bosco Rabello é jornalista há 45 anos e participa da cobertura política em Brasília desde 1977. Suas colunas são publicadas semanalmente no site colunadobosco.com e no Twitter @jboscorabello. É autor do Podcast “Política com Bosco”, no Spotify, participou de coberturas históricas e integrou a equipe pioneira no Brasil do noticiário em tempo real da Agência Estado/Broadcast

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