Até onde quer ir Flávio Dino? (Por Leonardo Barreto)
Decisão do ministro fragiliza Lula
atualizado
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Até onde vai a ambição de Flávio Dino? É bom os analistas começarem a se fazer essa pergunta porque o mais novo ministro do STF tem mostrado disposição para um jogo grande e astucioso.
A questão das emendas é icônica. Primeiro, Dino suspendeu sua execução suspensa por quase todo o segundo semestre até o Congresso aprovar uma nova lei regulamentando o tema.
Lei aprovada e sancionada, uma parte das restrições permaneceu de pé, relativas às emendas de comissão, com as quais as lideranças da Câmara dos Deputados e do Senado fazem o jogo político, montando acordos para votações e privilegiando grupos.
Sem as emendas de comissão, dificilmente o pacote de gastos teria sido aprovado em uma semana. Sabendo disso, o governo reinterpretou a decisão do STF por meio de uma portaria.
Tamanha fragilidade institucional era conhecida por todos. Aí entrou o famoso “fio do bigode”. Segundo relatos, o presidente Arthur Lira convenceu os líderes de que havia acordo político entre ele, o Planalto e Flávio Dino que garantia a execução das emendas.
Parlamentares devem ter desconfiado do comportamento dos técnicos do Executivo que passaram a adiar o empenho das emendas de comissão, mas a coisa andou.
Na semana seguinte à aprovação do pacote, Dino, no entanto, suspendeu novamente o uso do dinheiro, mostrando que não havia acordo nenhum ou, se havia, que ele foi rasgado sem nenhuma cerimônia.
Para completar, o ministro colocou a Polícia Federal para apurar o processo decisório das emendas, exigindo as atas das reuniões nas quais elas foram definidas. Isso equivale a colocar sob suspeição os presidentes das Casas e os líderes partidários.
São muitos os efeitos práticos da atuação de Dino.
Quando Lira planejava dar o salto para algum ministério, o STF colocou no seu encalço a PF e parlamentares insatisfeitos com o acordo descumprido. Com o proíbe/libera das emendas, Dino voltou ao tempo no qual o orçamento não era impositivo e o Executivo aprovava o que queria.
Por último, a situação também fragilizou Lula pois, aos olhos de deputados e senadores, ou Lula ou foi cúmplice da farsa do acordo ou foi subjugado pelo ministro do STF.
Dessa maneira, Dino construiu um jogo no qual ele controlou movimentos e fragilizou simultaneamente tanto Lira quanto Lula (para não falar em Rodrigo Pacheco e Davi Alcolumbre, ambos com relação direta nos episódios narrados).
É claro que há muito risco para o futuro de Dino. Mas, no momento, o que se tem é a possibilidade de atores poderosos do Congresso Nacional e do Executivo começarem o ano submetidos à sua caneta, uma atuação “moralizadora das emendas” celebrada por boa parte da opinião pública e tudo isso diante de uma esquerda tão frágil quando a saúde do presidente Lula.
Por isso é que vale a pergunta: até onde quer ir Flávio Dino?
Leonardo Barreto é doutor em Ciência Política e sócio da consultoria Think Policy.