A incompetência do professorado do Rio de Janeiro (por Paulo Baía)
Com raras exceções, o professorado da rede pública é ruim. O país vive profunda crise ética, moral e profissional em todo o sistema escolar
atualizado
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0 Brasil tem um déficit histórico na questão da educação. Anísio Teixeira já dizia que a educação no Brasil era um projeto: deixar a maior parte da população sem acesso ao pensamento lógico e aos conhecimentos gerais, que permitem a consolidação de uma memória social coletiva, e à cultura partilhada que forma identidades nacionais.
As lutas sociopolíticas ganharam fôlego na década de 1960 e ajudaram a mudar o discurso sobre dar educação básica para todos os jovens e crianças e alfabetizar velhos e adultos. Passamos a ter escolas públicas de ensino básico para todos — ou quase. Havia vagas e professores saídos dos famosos “cursos normais”. As carências de hoje são outras, a ausência de creches e pré-escolas, a falta de vagas nas universidades públicas e a insuficiência de cursos noturnos.
Os estudantes que chegam ao Enem não encontram vagas suficientes nas universidades públicas. Entram aí alguns mecanismos perversos de transferência de renda do Estado para empresas: com Prouni e Fies, o poder público sustenta os fabulosos lucros dos centros universitários de qualidade ruim.
Existe ainda uma hierarquização nessas “máquinas registradoras” de ensino superior: as Universidades Privadas de Elevadíssimo Nível, com um corpo docente de excelência, fazem com que a qualidade das universidades públicas seja posta em xeque. Isso aconteceu paralelamente à implantação do sistema de cotas para afrodescendentes, indígenas e pobres, vindos das escolas públicas. O resultado é que um cotista formado pela USP ou UFRJ, ambas muito boas, não tem a mesma oportunidade de quem vem de Ibmec, FGV ou Insper.
Com raras exceções, o professorado da rede pública é ruim. O país vive profunda crise ética, moral e profissional em todo o sistema escolar, transformado em sumidouro de talentos, exterminador de futuros. A maioria dos estudantes não entende um texto simples em português ou o pensamento lógico-matemático básico. E isso não é culpa das crianças ou de suas famílias — é dos professores.
Existe uma sólida articulação das incompetências docentes, apoiada nos sindicatos da categoria e em parlamentares que defendem a tese de que o professor ensina mal porque ganha mal — por isso, deve ter um calendário permanente de paralisações e greves.
Há ideias de formação continuada e reciclagem dos profissionais, mas até a classe baixa vem buscando o ensino privado como alternativa ao desleixo da rede pública.
A pandemia desnudou a realidade: a reação dos professores a dar aulas online foi violenta e reverteu-se com o início da vacinação: defenderam as escolas fechadas, quando deviam ser lugar de acolhimento e proteção da população. Os governantes não enfrentam uma corporação que se pauta pela ineficiência, mesmo com salários acima da média do mercado, oriundos dos cofres públicos.
Faço essa reflexão para que prefeitos e governadores do RJ priorizem a educação de qualidade comprometida com a cidadania. Não só eles, mas também um novo presidente e um ministro da Educação com atitudes éticas, morais e republicanas para enfrentar uma corporação de inativos funcionais e dar a ela outro destino empregatício.
Este é o desafio para os novos governantes do Brasil.
*Sociólogo e professor da UFRJ.