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A civilização e seus enganosos mitos (por Eduardo Fernandez Silva)

A absurda ideia do crescimento infinito em um planeta finito

atualizado

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Muitos, na civilização Ocidental, na qual estamos inseridos, olham com desdém outras culturas, entre outras razões porque estas creem em mitos, enquanto a nossa teria superado essa fase “pré-científica”. Desdenhar de outros não é propriamente atitude cristã, mas é realidade nessa cultura cheia de preconceitos e mitos, alguns perigosos!

Os xamãs, outras formas de medicina, a ausência da relação capital-trabalho e outras características da vida cotidiana noutras sociedades são, com frequência, rotuladas como “tradicionais”, denotando atraso e inferioridade. Custa, a muitos ocidentais, reconhecer as próprias míticas crenças!

Uma destas é a ilusão, que na realidade nos governa, de que poderemos crescer, crescer e crescer, e que ao final de tanto crescimento, os mais pobres gozarão do padrão de consumo de que hoje desfruta quem ganha, digamos, R$50mil/mês ou mais. Afinal, é essa ilusão que tenta justificar a absurda ideia do crescimento infinito em um planeta finito. Acreditar que, no futuro, todos gozarão de tal padrão de consumo é mito resultante de deliberada manipulação da opinião pública, manipulação esta apoiada em sofisticadas práticas elaboradas ao longo dos séculos, em particular a partir dos trabalhos de Edward Bernays (1891-1995), autor de “Propaganda”.

Reconhecer o óbvio, ou seja, a impossibilidade de crescimento infinito em meio finito, tem profundas implicações, razão pela qual muitos nesta sociedade evitam reconhecer os fatos, apegando-se ao mito. Enfrentar a realidade implicará, entre outras, redirecionar toda a política econômica, afastando-a da busca de produzir/extrair/consumir/descartar mais, mais e mais, para uma ainda pouca clara reorientação, reorganização, redistribuição, com foco não na acumulação mas, sim, na qualidade de vida.

Afirmar, por outro lado, que melhor qualidade de vida depende de mais crescimento e consumo significa apegar-se à crença de que apenas são válidos os valores consumistas – de que temo sido impregnados, inclusive pelo citado Bernays. Trata-se, por exemplo, de negar a história do próprio Ocidente, quando outros valores prevaleciam!

Na Idade Média na Europa, quando predominava uma forma extremista de cristandade católica, a quantidade de dias feriados, além dos domingos, era enorme, superava em muito os cem dias. Noutras palavras, a ideia de que os avanços tecnológicos dos últimos 200/300 anos vieram liberar todos os humanos, e não apenas alguns, das pesadas tarefas diárias é, no mínimo, questionável. Ainda mais se consideramos o tempo dedicado ao deslocamento casa-trabalho-casa!

As estatísticas sobre o assunto são dúbias. Com todas as dificuldades de mensuração, há estimativas de que no século XIV os trabalhadores, no Ocidente, trabalhavam cerca de 1.400 horas/ano, enquanto hoje, nos mesmos países, trabalha-se (sem contar o deslocamento) cerca de 1.700 horas!

Os mitos enganam e impedem progressos reais.

 

Eduardo Fernandez Silva. Mestre em Economia. Ex-Diretor da Consultoria legislativa da Câmara dos Deputados

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