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“A saúde privada é muito mais poderosa do que a gente imagina”

Pesquisador revela poder econômico da saúde suplementar e chama de “sete irmãs” as maiores empresas do setor

atualizado

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Ilustração de Enfermeira empurrando paciente deitado na maca do hospital para a luz brilhante - Metrópoles
1 de 1 Ilustração de Enfermeira empurrando paciente deitado na maca do hospital para a luz brilhante - Metrópoles - Foto: null

Recorde de reclamações dos consumidores, denúncias de pessoas vulneráveis alvos de corte ou cancelamento unilateral de contratos, judicialização, uma CPI passeando pelo Congresso, dívidas bilionárias com hospitais e o SUS. Ao mesmo tempo, fusões e um lucro líquido de R$ 3,3 bilhões no 1º trimestre de 2024. Mesmo com tantos problemas, a saúde privada no Brasil parece intocável.

Para o pesquisador Eduardo Magalhães Rodrigues, pós-doutor em economia política pela PUC-SP, o poder econômico se expressa como poder político. E a saúde privada exemplifica o cenário de concentração de riquezas no país. As 200 maiores empresas do Brasil controlam 63.5% do PIB (dados de 2019). Entre elas, dezesseis atuam na saúde – e sete delas formam um oligopólio, que Rodrigues chama de “as sete irmãs”: Rede D´Or, DASA, Eurofarma, Notre Dame, Amil, Aché e Hapvida.

“A base do capitalismo é a concorrência, a livre iniciativa, a propriedade privada dos meios de produção – o que chamamos de mercado. Meu estudo mostra que nada disso existe. Não existe concorrência, é um oligopólio. O poder político, portanto, é de quem tem o poder econômico e são poucos com esse poder. Nesse sentido, ameaça nossa democracia”, critica.

A concentração de poder e riqueza impede o controle adequado de órgãos como a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) e o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômico). “Elas têm um poder infinito, rompem contratos unilateralmente, oferecem a qualidade de serviço que querem”. Para o pesquisador, ambas entidades são impotentes e decorativas. Ele avalia que existe no Conselho Nacional de Saúde um esforço para limitar e regulamentar o poder do setor, afinal existe uma disputa entre SUS e saúde privada. “Imaginemos um cenário onde o SUS consegue oferecer qualidade máxima, o que ia acontecer com a saúde privada? Acabou. As sete irmãs da saúde privada querem um SUS cada vez mais debilitado para aumentar a sua participação no mercado”.

Os dados de sua pesquisa são de 2019. Ela afirma que esse processo continua e talvez hoje existam “cinco ou seis irmãs”. O Bradesco e a Rede D´Or se uniram para criar uma nova rede de hospitais, a Atlântica D´Or. A Amil e a Dasa anunciaram a fusão de suas operações hospitalares e criaram uma nova empresa, a Ímpar. Sobre o poder da Rede D´Or, seu estudo aponta que ela tem participações acionárias em mais de 140 empresas, até na produção de café. Faz parte do passado a ideia de uma família ou empresa dominando parte de um setor econômico. Esse poder está pulverizado por várias áreas.

Em maio deste ano, o presidente da Câmara dos Deputados se reuniu com representantes do setor e anunciou a suspensão dos cancelamentos unilaterais. Não houve um acordo formal nem há informações sobre resultados.  Depois disso, o setor apresentou sugestões para o Projeto de Lei dos planos de saúde. Entretanto, como colidem com algumas propostas do relator Duarte Jr (PSB-MA), Lira avalia retirá-lo da função. “Houve essa reunião e não se resolveu nada. Lira parece um office-boy de luxo do setor”, dispara Magalhães

O pesquisador lembra que a CPI dos Planos está parada há meses apesar da quantidade necessária de assinaturas. “Eu vejo os Três Poderes subordinados ao poder gigantesco desses grupos, como acontece na saúde. Eu acredito que o governo federal gostaria de modificar isso. A ministra da saúde é uma pessoa de extrema competência e capacidade, O governo tem a vontade mas não tem poder. No Congresso há parlamentares comprometidos, mas no geral, não vejo nem poder nem vontade. Vai sobrar para o Dino?”, provoca

A Pesquisa

A saúde privada é um recorte de sua pesquisa com as 6. 235 maiores empresas do país. As análises tradicionais miram o faturamento, lucro, número de funcionários, dívidas, entre outras variáveis, para determinar a relevância de uma empresa no mercado. Rodrigues utiliza a metodologia de Análise de Redes Sociais, que considera, por exemplo, suas conexões acionárias.

“Eu sempre gosto do exemplo de uma festa com 100 pessoas. Dentro de qualquer rede ou festa, você tem uns grupinhos, as panelinhas. Se uma pessoa tem 80 amigos, ela vai ser uma pessoa bastante importante na rede. Se há dez subgrupos e uma pessoa com uma amizade em cada um deles, ela também vai ser relevante”

São duas medidas que marcam seu estudo.  O grau de saída ponderado, que considera a quantidade de empresa e ações que uma empresas possuiu sobre outras. O grau de centralidade de intermediação identifica a posição estratégica de uma empresa na rede. Ou seja, uma empresa que serve como ponte entre outras. Em ambas, a liderança é da Rede D´or no setor da na saúde privada.

O estudo teve resultados surpreendentes. A primeira hipótese é que os bancos seriam os mais poderosos. Mas o setor de energia elétrica mostrou-se o mais importante. “E no caso, a empresa mais poderosa é a Eletrobras. Assim, não foi uma coincidência sua privatização”.  O segundo grupo foi o bancário. E o terceiro grupo mais poderoso, é o de saúde privada, “pra mim também foi uma surpresa, ela é muito mais poderosa do que a gente imagina”.

Rodrigues aprofunda a análise sobre o grau de concentração. “As 200 maiores empresas do Brasil controlam 63.5% do PIB. Mas eu cheguei a conclusão que das 6.235 maiores empresas, 62, ou seja 1%, controlam 25% das coleções acionárias. Só que dentro dessa elite tem uma super-elite, que são 31 empresas. Dessas 31 empresas, 15 são da energia elétrica, Certo. 9 de finanças e 7 da saúde privada. Estamos vivendo uma plutocracia, que é o governo dos ricos. E não descarto a possibilidade de todos os setores se transformem em monopólios”, conclui

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