Natal é um dos feriados que mais causa arrepio em gays e lésbicas, principalmente nos enrustidos
Seria este o momento ideal para ensinar ao seu primo fascista sobre respeito e tolerância?
atualizado
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Vem chegando aquele tempo difícil de escapar da ceia de Natal, confraternização do trabalho, do prédio, da família, amigo oculto. Dentre todos os clichês que não ficam de fora destes encontros, um dos que mais causa arrepio em gays e lésbicas, principalmente enrustidos, é a pergunta clássica das tias: E o(a)s namoradinho(a)s?
É isso mesmo, aquele seu parente que passou o ano inteiro fazendo postagens homofóbicas, elogiando o Bolsonaro e que diz que a solução para o Brasil seria a volta da ditadura militar vai virar para você perguntando da sua vida amorosa.
Quer dizer, amorosa em termos. Se você for um homem, ele não estará contando muito que você ame não, ele quer saber quantas você comeu; mas se você for uma mulher, ele espera que você responda sobre seu namorado, sem muitas oportunidades para que o gênero do seu parceiro não seja outro além de masculino.
É difícil, eu sei. Normalmente estas pessoas falam muito, alto e pouco dão oportunidade para os outros responderem. A tentação de gritar mais alto para ele se calar e de dar a resposta que o Boechat deu ao Malafaia está presente no corpo inteiro. Mas você pensa na sua avó que adora ver a família reunida, na sua tia que passou horas no forno assando o peru e até nos filhos do(a) desagradável que são pessoas tão legais e, junto com uma cidra baratinha, você engole o desaforo.
Por favor, não ache que todas as festas de família são campos de batalha para os LGBTs. Há aqueles que têm a sorte de nascer em uma família com o real significado da palavra. Pessoas que se amam, se respeitam e verdadeiramente celebram este momento de confraternização. Porém, nestes eventos encontramos nossos parentes com tudo o que eles têm, suas qualidades e seus defeitos.
Seria este o momento ideal para ensinar ao seu primo fascista sobre respeito e tolerância? Exatamente na noite de Natal? Acredito que se ele não aprendeu vendo “Esqueceram de mim” nos Natais passados, a coisa vai ser mais difícil agora. Aliás, está aí uma ótima dica de presente, caso você o tire no amigo oculto: o livro “Como Conversar com um Facista” da Márcia Tiburi.
Infelizmente, o bom velhinho, por ser uma invenção da sociedade capitalista (com o apoio da Coca Cola que deu a ele a roupa vermelha), só pode trazer bens materiais. Nunca vi Papai Noel dando para ninguém respeito, tolerância, cordialidade ou um mísero vidro de “Semancol”.
Isso quer dizer que para conquistarmos estas dádivas temos uma luta diária, pois como disse Nelson Rodrigues: “A ignorância é uma força da natureza”. Precisa ter fé e esperança, pois sem elas não levantamos nem da cama, mas também temos que fazer nossa parte. “Confie em Alá e amarre bem seu camelo”, diz um provérbio árabe.
O trabalho pelo reconhecimento dos nossos direitos é diário e a vigia pela sua manutenção é eterna
Olhe em volta da mesa do jantar e se pergunte se você está sozinho. Se aquelas pessoas só estão ali cumprindo um protocolo e se você também só está lá pelo mesmo motivo. Se seu pai ou sua mãe te aceitam, te compreendem, ou se eles ao menos estão tentando, porque caso ainda não consigam, talvez precisem de mais tempo. Cada um tem seu momento e nós deveríamos saber disso mais do que ninguém, pois também tivemos o nosso.
Ouvi uma psicóloga dizer certa vez: “Você passou a sua vida inteira lidando com sua sexualidade, mas seus pais só estão lidando com ela a partir do momento que você contou para eles, portanto tente entender”.
Natal é um tempo complicado. Tem gente que detesta inclusive. Ele é difícil porque fica quase impossível de fugir de várias coisas que a gente vai jogando para debaixo do tapete ao longo do ano e pensa em lidar em outro momento, mas nunca fazemos algo a respeito, além de xingar e bloquear no Facebook. Mas, apesar do alto grau de periculosidade destas situações, como se dizia antigamente, feliz Natal e paz na Terra aos homens (e às mulheres) de boa vontade!