Fada madrinha gay: como ajudar um amigo se inserir no meio LGBT
Para quem não sabe, o que eu chamo de fada madrinha é aquela pessoa que te introduz no mundo gay, por isso ela é chaveira, porque tem a chave mestra para abrir a porta do seu armário
atualizado
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Eu não falo para muita gente, mas participo de alguns projetos sociais, como o “Cafuçus do Amanhã”, em que investimos nas categorias de base, detectando potenciais e fornecendo todo o apoio necessário para sua evolução até a excelência. Outro projeto é o da “Fada Madrinha Chaveira”, que eu até havia me afastado há alguns anos, mas volta e meia sou chamado a intervir em alguma situação. Foi exatamente isso que aconteceu há algumas semanas.
Já fui fada madrinha de muita gente. Para quem não sabe, o que eu chamo de fada madrinha é aquela pessoa que te introduz no mundo gay, por isso ela é chaveira, porque tem a chave mestra para abrir a porta do seu armário. Ela te leva pela primeira vez a uma boate, te apresenta às primeiras pessoas e algumas vezes descola seu primeiro encontro.
Fiz isso por um bom tempo e era sempre prazeroso, principalmente quando eu via depois um/uma pupilo(a) retribuindo o carinho e fazendo isso com outros, porque é assim que o mundo gira. Acontece que depois de tantos anos, uma hora eu cansei e abandonei o posto. Achava que minha contribuição ao mundo do arco-íris deveria vir de outra forma. Até duas semanas atrás…
Conheci uma garota linda de 18 anos. Nos apresentamos e ela me disse do seu interesse em jornalismo e logo inventei uma desculpa para dizer que tinha uma coluna LGBT aqui no site, o que ela se mostrou muito interessada de pronto. Nas encarnações passadas eu devo ter sido padre, porque as pessoas gostam muito de me confessar coisas inconfessáveis – e nem tinha álcool no meio.
A garota acabou me contando que se sentia “20% hétero”, com sua carinha de Lolita travessa, mas que nunca havia beijado ninguém na boca, nem meninos, nem meninas.
Ela não queria fazer com alguém que não fosse especial e eu a entendi completamente. Quem não guarda a figura do primeiro beijo, mesmo se ele foi um desastre? Ao ser a favor da total liberdade do amor, sou a favor de todas as formas que façam os envolvidos felizes, por isso não a censurei por escolher esperar, diferente da maioria dos amigos da sua idade.
Neste instante minha varinha de condão acendeu: tinha alguém precisando de uma fada madrinha. O que aquela garota precisava era só de um ouvido, um apoio, alguém com quem conversar para tentar entender o que se passava com ela, o que estava por vir.
O que fazer em relação aos pais? Será que eles vão aceitar? Será que vão brigar? Será que vão chorar? E se a menina que eu gostar não quiser me beijar porque eu nunca beijei ninguém? E o que eu faço com meus amigos que não sabem que eu sou lésbica e vivem me empurrando para o garoto que está apaixonado por mim? Será que eles só vão parar quando eu disser com todas as letras EU GOSTO DE MENINAS?! Deveria ser o suficiente eu apenas falar que não estou a fim dele, né?
É, minha amiga. Deveria ser o suficiente, mas você sabe que no mundo que a gente vive, uma mulher dizer que gosta de mulheres é lido só como um tempero no olhar lascivo masculino sobre vocês.
Com duas semanas de papos – Whatsapp ajuda muito a função da fada madrinha nestes tempos modernos -, ela me contou que havia beijado a menina que tanto queria e como adorou. “Cara, se eu soubesse que beijar era tão bom, já tinha beijado antes. Mas eu não aguentava os beijos muito longos não, porque tenho asma. Então a cada 30 minutos, eu parava”.
Depois dessa mensagem, vi que minha missão estava cumprida. Poderia guardar de novo a varinha de condão, o vestido bufante furta-cor e a coroa de cristais Swarovski. Ficará lá até, quem sabe, alguém precisar dos meus serviços novamente. Ou até o próximo carnaval.