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Danny Barradas, a professora transexual do colégio Dom Barreto

A escola é uma das melhores do país, segundo o desempenho no Enem, e mantém em seu quadro de docentes a educadora em transição de gênero

atualizado

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Arquivo Pessoal
danny
1 de 1 danny - Foto: Arquivo Pessoal

Quando eu falo que sou de Teresina, capital do Piauí, as pessoas me fazem duas perguntas clássicas. A primeira é: “terra quente, né?” e ainda esperam eu confirmar a informação. A outra é: “você estudou naquele colégio que tá sempre em primeiro lugar no Enem, o Dom Barreto?”.

Como na semana passada saiu o novo ranking dos desempenhos das escolas no Enem e, mais uma vez, o Dom Barreto repetiu o feito de ser um dos melhores do país, ficando em segundo lugar, vou contar para vocês a história de Danny Barradas, a professora trans que trabalha nessa escola.

Danny estudou nos bons colégios da capital piauiense. Muito antes de transacionar, extremamente dedicada aos estudos, decidiu que deveria fazer medicina. Tentou por oito anos seguidos, até que um irmão a ouviu ler um dos seus textos para o pai. Eram dissertações argumentativas baseadas num profundo conhecimento de filosofia, antropologia e sociologia.

Desde então, o irmão iniciou uma campanha para convencê-la a fazer direito, pois achava que essa era a verdadeira vocação dela. Temerosa de se sentir frustrada por desistir da medicina, Danny bateu o pé e manteve a sua decisão. Foi então que o irmão passou a arregimentar o maior exército possível entre os membros da família para convencer a cabeça dura.

Reprodução do Instagram

Ela optou por usar sua nota no Enem numa faculdade particular no curso de direito, mas não deixou de frequentar o cursinho para tentar uma vaga em medicina. Seis meses depois, o mundo perdeu para sempre uma futura médica, mas ganhou a que pode ser a primeira juíza transgênero do Brasil.

Voltando um passo nessa história, Danny sempre foi consciente da sua condição e fazia de tudo para que o mundo não percebesse. Vivia disfarçada de homem para não ser notada.

Cada olhar sobre mim era como uma agulhada 

descreve Danny

Na faculdade de direito, ela ouviu as palavras que lhe abririam as portas para fora daquela persona masculina. Quando sentiu necessidade de contar para alguém o que lhe acontecia, ela decidiu que queria falar com alguém que não tivesse ligação com religião nenhuma e que tivesse estudo.

O selecionado foi seu professor de filosofia do direito, Lucas Villa, que não a julgou e ainda lhe deu a chave à qual Danny atribui a sua aceitação. “Se você continuar estudando com a mesma dedicação que você faz hoje, você vai chegar num nível de competência que as pessoas não vão estar preocupadas se você estará de saia ou de terno”, disse o educador.

Enquanto estudava direito, Danny também encontrou uma mentora com quem desenvolveu uma relação pessoal, a professora Fabíola de Azevedo. “Fabíola é o próprio Schopenhauer em pessoa”, disse Danny (calma, leitor, eu também tive que dar uma googada para saber o que isso significava, você não vai se arrepender se gastar uns minutinhos nessa pesquisa).

Fabíola percebeu o talento da amiga, Danny, para a sala de aula durante discussões nais quais, quase sempre, elas discordavam em seus pontos de vista. Por isso os papos eram tão animados, inclusive. A professora a convidou pela primeira vez para substituí-la em uma escola. Foi por instigação dela também que Danny foi até um curso de redação tradicional da cidade oferecer seus serviços para dar aula de argumentação.

Pouco depois, durante uma viagem ao Rio de Janeiro, Danny teve coragem de sair pela primeira vez de casa com o visual feminino que ela nunca mais tirou. A presença de Danny não causa estranhamento nem reações nos colégios em que dá aula, mas isso não ocorre nos demais meios em que ela circula.

Os LGBTs não gostam de mim porque eu defendo as pautas que eu acho razoáveis. O povo da esquerda não gosta de mim porque eu leio os conservadores. Os conservadores não gostam de mim porque eu sou transgênero

Danny

A frase do professor Lucas Villa surtiu cada vez mais efeito sobre Danny. Completamente insatisfeita com a sua imagem externa, a garota trancou-se em casa e transformou o que poderia ser uma grande frustração no que ela chama de “verdadeira obsessão por livros”.

Seu dinheiro e seu tempo são medidos em livros. Na hora de comprar algo, ela se pergunta: quantos livros esse valor dá para comprar e quantos exemplares posso ler em tantas horas livres? Sua história, porém, não despertaria tanto interesse juvenil se essa moça não tivesse o talento natural de passar o conhecimento.

A vida de Danny está tomando novos rumos. Ela já sente que sua missão não é mais ser a primeira juíza trans do Brasil, mas que terá um alcance muito maior sendo professora e falando para as gerações que virão.

Ela tem cedido cada vez mais ao clamor de criar um canal no youtube para dialogar com ainda mais pessoas. Ao mesmo tempo, sonha em viver num sítio com o máximo de livros possíveis e uma luneta para estudar uma das matérias que mais ama, a astronomia. Na verdade, no fim de tudo, Danny só vai se tranquilizar quando revirar o mundo para se tornar Lis.

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