Suspeito de matar mulher que sequestrou bebê no Conic está foragido
Macsuel dos Santos Silva trabalhava em uma panificadora de Sobradinho e desapareceu desde o assassinato de Cevilha Moreira dos Santos
atualizado
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Era meia-noite de domingo (10/3) e Maria dos Santos, 71 anos, rezava o terço. Havia acabado a oração de um Pai Nosso quando ouviu as sirenes e foi à rua conferir a movimentação de policiais em frente ao Lote 38. Cevilha Moreira dos Santos, 45 anos, foi morta a quatro casas de distância dela, que sempre estende as orações madrugada adentro para pedir proteção “a todas as pessoas da Terra”.
Pouco antes do início da segunda-feira (11), Cevilha – que havia se mudado para o local no dia anterior – sofreu o mesmo destino de outras 29 mulheres vítimas de feminicídio em 2018. Só neste ano, segundo a Secretaria de Segurança Pública (SSP), é o quinto caso. Ainda foram registradas 16 tentativas de assassinato desse tipo. Considerado foragido pela Polícia Civil (PCDF), o namorado dela, Macsuel dos Santos Silva, 34 anos, é único suspeito até o momento.
Macsuel nunca foi denunciado por qualquer crime relacionado à Lei Maria da Penha, mas, segundo a PCDF, o filho de Cevilha afirmou que o homem agredia a mãe há pelo menos um ano. Funcionário de uma panificadora próxima ao condomínio Império dos Nobres, em Sobradinho, o padrasto é suspeito de matar a mulher com extrema violência.
O relatório da ocorrência aponta que a vítima foi encontrada com uma marca de facada na altura do coração, sangue escorrendo pela boca e pelo nariz e com a língua inchada. A investigação do caso aponta que ela continuava com o homem por dependência financeira.
Relatos de testemunhas indicam que o suspeito tentou fugir com o carro pouco após o assassinato, mas o veículo estacionado de um vizinho travou a saída da garagem. Assim, Macsuel deixou o local a pé, pelo beco ao fim da rua, antes de as viaturas da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) chegarem.
Susto coletivo
O Conjunto F da Quadra 5 de Sobradinho I, onde ocorreu o feminicídio, é repleto de mulheres. Dezesseis horas após o crime, várias delas ainda olhavam assustadas para o portão fechado da Casa 38 – um lote subdividido para abrigar cinco apartamentos.
A proprietária, identificada somente como Edilene, é conhecida como uma pessoa correta, com costume de pedir certidão de nada consta dos candidatos a inquilino. Portanto, vizinhas – como a cabeleireira e segurança de festas nas horas vagas Antônia Carvalho, 51 anos – acreditam que Cevilha tenha passado CPF e nomes falsos para conseguir o aluguel.
Antônia ajudou a dona do terreno a tirar panos e mobília sujos de sangue do imóvel e a guardá-los em um saco, enquanto o esposo de Edilene cuidou da limpeza. “Sangue fede, né? Horrível entrar lá”, comoveu-se a cabeleireira, ainda em estado de choque.
O titular da 13ª Delegacia de Polícia (Sobradinho I), Hudson Maldonado, responsável pelo caso, investiga a acusação de uso de documentos falsos.
De autora a vítima
Em junho de 2017, Cevilha foi condenada a 2 anos e 6 meses de prisão por subtração de incapaz e falsificação de documento público. Ela bolou um plano para enganar a mãe de uma bebê de 3 meses, fugiu com a criança e ainda arranjou uma certidão de nascimento falsa antes de ser pega.
Seu companheiro na época revelou que a mulher havia mentido sobre uma gravidez antes de furtar a menininha. A mulher já era mãe de um rapaz adulto, mas não teria conseguido engravidar novamente. Depois disso, em regime semi-aberto, ela emagreceu e clareou os cabelos.
Em fevereiro de 2018, a Justiça lhe concedeu progressão de pena para o regime aberto e, no mesmo mês, Macsuel surgiu em sua vida. Nas palavras do delegado Maldonado, ele é um “facínora” e os dois viveram um “romance macabro”, marcado por agressões.
Até a morte da mulher, contudo, quem escutava as brigas violentas entre o casal não tinha qualquer adjetivo para classificar a relação. Na noite de sua morte, Cevilha teve aquela que seria a última discussão com Macsuel, por volta das 19h.
Os vizinhos submetidos às paredes nada confiáveis de alvenaria do conjugado presenciaram tudo, sem interferir. Moradora da residência em frente ao local da morte, a segurança Márcia Ribeiro, 50 anos, classificou o ocorrido como “uma briga normal de casal”.
Diante do resultado, porém, ela encarou a situação com mais dureza. “Está virando moda essa coisa de bater na mulher, e isso tem que acabar. A gente tem que se unir, uma ajudar a outra. Se escutar alguma coisa, tem que ver o que é”, lamenta.
Sobrinha de Márcia, a desempregada Letícia Luine, 23 anos, conta que morou a vida inteira na mesma casa. Naquela rua, ela já testemunhou, por entre as grades da janelinha de seu quarto, outros namorados, maridos ou amantes de suas vizinhas batendo nas mulheres. “Houve uma vez em que era ele dando soco e a moça pedindo perdão por alguma coisa que tinha feito. Foi horrível”, relata.
Neste 2019, o Metrópoles inicia um projeto editorial para dar visibilidade às tragédias provocadas pela violência de gênero. As histórias de todas as vítimas de feminicídio do Distrito Federal serão contadas em perfis escritos por profissionais do sexo feminino (jornalistas, fotógrafas, artistas gráficas e cinegrafistas), com o propósito de aproximar as pessoas da trajetória de vida dessas mulheres.
O Elas por Elas propõe manter em pauta, durante todo o ano, o tema da violência contra a mulher para alertar a população e as autoridades sobre as graves consequências da cultura do machismo que persiste no país. Desde 1° de janeiro, um contador está em destaque na capa do portal para monitorar e ressaltar os casos de Maria da Penha registrados no DF. Mas nossa maior energia será despendida para humanizar as estatísticas frias, que dão uma dimensão da gravidade do problema, porém não alcançam o poder da empatia, o único capaz de interromper a indiferença diante dos pedidos de socorro de tantas brasileiras.