Sandra Rodrigues: a massagem que cura as dores do corpo e da alma
A massagista conta sua história de superação: atualmente, ela ensina outras mulheres a buscar novos caminhos na vida
atualizado
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Sandra Rodrigues, 44 anos, é uma personagem encantadora. Dona de uma história de superação, ela enfrentou uma infância difícil, 10 anos de relacionamento abusivo com agressões verbais e físicas, a pobreza e o medo. Ao descobrir a massagem, conseguiu encontrar uma profissão, formar os quatro filhos e montar um instituto para oferecer oportunidades a diversas outras mulheres em situação de risco.
A história dela começa em São Benedito, no Ceará. Em uma família de cinco irmãos, ela sempre se sentiu rejeitada. “Eu era deixada de lado. Não sei bem o porquê, mas minha mãe vivia me despachando para a casa de outros parentes”, conta. Essa configuração a fez alimentar o sonho de ter o próprio lar. Para isso, ainda muito jovem decidiu tornar-se freira.
Eu me sentia excluída. Era a menina que todo mundo esquecia
Sandra Rodrigues
Quando tinha 10 anos, a família se mudou para Morro de Chapéu, na Bahia. Nesse período, a então menina abandonou o desejo de ser freira e colocou na cabeça outra meta: estudar para virar médica. “Meu pai era um cearense bem conservador e me impediu de seguir esse sonho. Aí, minha mãe me mandou para a casa de outras pessoas. Mais uma vez, não tinha aquele lar completo.” Mesmo assim, Sandra mantinha na cabeça a vontade de ter uma casa.
Por isso, aos 15 anos ela se casou e veio para Brasília, morar com a família do marido, em Brazlândia. Finalmente, a jovem adolescente imaginava ter conseguido um lar para chamar de seu. Porém, as dificuldades dela apenas começavam. No casamento, Sandra experimentou as maiores felicidades e os momentos mais tristes. Virou mãe de quatro filhos – Davi, Maria Tatiane, Deyvison e Alef – e vítima de um relacionamento abusivo.
Ele saía de casa, me deixava sozinha. Eu não queria separar, lutava para ter minha família. Ainda muito jovem, eu tinha que enfrentar agressões físicas e verbais. Meus pais falavam que, se eu me divorciasse, seria deserdada. Ninguém me apoiava. Tinha apenas o ensino fundamental, na época
Sandra Rodrigues
Com a ajuda da cunhada, ela conquistou emprego em uma loja de tecidos. Com pouca instrução e vontade de se livrar da dependência financeira, Sandra começou a crescer no emprego e se tornou vendedora. “Em pouco tempo, batia todas as metas. Tinha minha esperteza”, lembrou. À medida que se firmava na profissão, passou a ter mais coragem para abandonar o relacionamento. “Queria dar um jeito na vida dos meus filhos, senão a gente ia morrer. Ele tentou me matar por muitas vezes”, falou, profundamente emocionada.
Em uma viagem de volta do Ceará, o marido dirigiu de forma perigosa, colocando em risco toda a família. Esse foi o estopim para Sandra pedir o divórcio, ou, em suas palavras, “libertar-se”. Sozinha, buscou refúgio na fé e passou a enfrentar a nova realidade. Pediu ajuda a vários conhecidos e sempre ouviu não. “Por isto as pessoas morrem: pela omissão”, afirmou.
Mudou-se, então, com as crianças para um quarto em Taguatinga. Sem dinheiro, tinha apenas uma cama e um micro-ondas. No eletrodoméstico, fazia macarrão instantâneo para os filhos. “Brincava, dizia que éramos muito ricos e chiques, comendo aquilo.”
Divorciada, Sandra foi cursar o ensino médio e diversos cursos profissionalizantes. Iniciou faculdade de serviço social, mas acabou abandonando. Sempre estudando, ela conseguiu emprego nas Casas Bahia – ia e voltava a pé do trabalho, localizado em Ceilândia, para conseguir comprar “a comida das crianças”. Na educação dos filhos, contou com o apoio de amigos da igreja que frequentava.
A mudança
Nesse período de intensas mudanças, seu filho mais novo, Alef, na época com 11 anos, teve uma crise de apendicite. O diagnóstico, porém, demorou para vir e os prognósticos não eram muito positivos quando o jovem entrou na sala de cirurgia. “Lembro que o médico falou para mim: ‘Mãe, você precisa rezar’”. O menino sobreviveu, mas a recuperação demandava cuidados.
Mãe coruja, Sandra ficou cuidando do filho em casa e começou a trabalhar com massagem – graças a aulas pontuais que tinha feito. Cobrava R$ 30 pela sessão e foi conquistando clientes. Ana Paula, uma cliente, decidiu ajudar e pagou um curso de aperfeiçoamento. Ela, então, aprendeu a massagem modeladora, que reduz medidas.
Com esse conhecimento, conseguiu dar um verdadeiro upgrade na vida: a sessão passou a custar R$ 250. O estudo mudou a vida da profissional, que começou a atender no Centro Clínico Via Brasil, criou o Instituto Sandra Rodrigues e agora estuda direito em uma faculdade particular da cidade. Atualmente morando em Águas Claras, ela fala abertamente de seu maior orgulho, a formação dos filhos no ensino superior.
Instituto
Sandra admite ser muito religiosa e cita Deus em diversos momentos enquanto narra sua trajetória. Seguindo um preceito cristão, decidiu usar a própria história de vida para inspirar outras pessoas. Assim, surgiu o Instituto Sandra Rodrigues, no qual ela oferece cursos de massagem para mulheres em situação de risco.
A massagista não cobra nem um centavo das alunas, caso elas comprovem não possuir renda. “É a minha forma de ajudar, de passar para frente o conhecimento, dar a primeira oportunidade para essas mulheres conseguirem sair de uma situação ruim”, explicou. Atualmente, está com uma turma de alunas de Luziânia (GO).
Instituto Sandra Rodrigues
Centro Clínico Via Brasil, Bloco B, Sala 547 (910 Sul). Telefone: (61) 99111-6183
Neste 2019, o Metrópoles inicia um projeto editorial para dar visibilidade às tragédias provocadas pela violência de gênero. As histórias de todas as vítimas de feminicídio do Distrito Federal serão contadas em perfis escritos por profissionais do sexo feminino (jornalistas, fotógrafas, artistas gráficas e cinegrafistas), com o propósito de aproximar as pessoas da trajetória de vida dessas mulheres.
O Elas por Elas propõe manter em pauta, durante todo o ano, o tema da violência contra a mulher para alertar a população e as autoridades sobre as graves consequências da cultura do machismo que persiste no país. Desde 1° de janeiro, um contador está em destaque na capa do portal para monitorar e ressaltar os casos de Maria da Penha registrados no DF. Mas nossa maior energia será despendida para humanizar as estatísticas frias, que dão uma dimensão da gravidade do problema, porém não alcançam o poder da empatia, o único capaz de interromper a indiferença diante dos pedidos de socorro de tantas brasileiras.