Qual será o futuro do turismo após a pandemia de coronavírus?
Especialistas do setor fazem previsões sobre o “novo normal” em viagens quando a crise de saúde chegar ao fim
atualizado
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No Rio de Janeiro, a praia de Copacabana lotada, repleta de turistas comendo biscoitos de polvilho e tomando mate gelado. Na Itália, milhares de pessoas disputando um lugar na Fontana di Trevi, em busca da realização de um pedido especial. Filas imensas para conhecer pessoalmente a Monalisa, no Museu do Louvre, em Paris. Ao menos pelos próximos dois anos, essas nostálgicas imagens ficarão no passado.
Assim como a forma que nos relacionamos e encaramos questões que vão de políticas de saúde pública a maneira como nos vestimos, o turismo será totalmente impactado pela pandemia de coronavírus, que virou o mundo de ponta-cabeça desde o início deste ano.
Amargando prejuízos bilionários, o setor usa o momento de reclusão e de isolamento social para repensar velhos hábitos e criar prognósticos para o futuro.
A curto prazo, o cenário não é dos mais animadores. “Muitos hotéis, pousadas e restaurantes irão quebrar até o final do ano, o que restringirá bastante o mercado”, avalia Alexandre Sampaio de Abreu, presidente da Federação Brasileira de Hospedagem e Alimentação (FBHA) e membro do Conselho Nacional de Turismo (CNT) do Ministério do Turismo.
Para o especialista no segmento, é hora de pensar medidas factíveis que possam ser realizadas tanto por grandes redes hoteleiras como pequenos negócios no interior do país. “Depois que for criada a vacina, o turismo lentamente retomará ao que era”, pontua. O processo, porém, pode levar dois anos.
Antes disso, quem se beneficiará são destinos situados em regiões menos atingidas , se analisados o número de casos e de vítimas; e aqueles que dispensam deslocamentos aéreos.
Em pesquisa recente, o buscador de voos Viajala constatou que 26% dos brasileiros afirmaram que voltarão a viajar assim que a quarentena acabar; 66%, por sua vez, não têm ideia de quando irão ao exterior novamente.
A médio prazo, Abreu acredita que o turismo interno ganhará fôlego, sobretudo destinos naturais ou rurais com distâncias mais curtas, de até 300 km. É o caso, por exemplo, da Chapada dos Veadeiros, em Goiás; e da região dos lagos, no Rio.
À frente da Associação Brasileira de Turismólogos e Profissionais do Turismo (ABBTUR), Lenora Horna Schneider compartilha a mesma análise. “A partir do próximo ano, quando as pessoas se sentirem mais seguras para viajar, iremos conhecer mais a cultura, a tradição e as comunidades que vivem na cidade escolhida para descansar ou passar férias. A tendência é buscar distâncias mais curtas. Entendemos que a regionalização será o mais importante”, avalia.
Novo comportamento
Para Eleonora, é preciso “desenvolver um novo turismo para um novo consumidor”. Mais do que nunca, viagens seguras – mote de uma campanha trabalhada pelo Ministério do Turismo – serão uma exigência.
Haverá, também, maior procura por empresas que têm se empenhado, agora, para frear os efeitos da Covid-19, seja por ações sociais ou pelo fato de ceder seus quartos a profissionais de saúde.
A dirigente da ABBTUR vê, ao menos em locais privados, a criação de medidas concretas que vão ao encontro do que recomenda a Organização Mundial da Saúde (OMS). “Ninguém faz turismo com medo. É preciso uma nova educação e consciência. Em centros culturais pagos, por exemplo, acredito que serão distribuídas menos senhas e as visitas poderão ser feitas apenas com horário marcado”, exemplifica.
Já áreas públicas, como praças e igrejas, terão maior acompanhamento das autoridades policiais, orientadas a evitar aglomerações.
Menos leitos
Alexandre Sampaio de Abreu salienta que, possivelmente, a hotelaria trabalhará com um índice de ocupação menor, próximo a 50%, com intuito de diminuir o número de pessoas em áreas de uso coletivo, como restaurantes dos hotéis.
“Outra mudança serão os check-ins e check-outs pela internet e por telefone, evitando encontro com atendentes e filas”, opina.
Viagens ficarão mais baratas?
O representante do FBHA é contra a adoção da política do menor preço para atrair viajantes a todo custo. “Isso pode ser um remédio pior e matar, aos poucos, os empresários que sobreviverem. Esse pós-pandemia precisa ser muito bem equilibrado”, frisa.
Equipamentos de proteção individual, como máscaras, álcool em gel e luvas, ganharão o status de item de primeira necessidade.
Novas tecnologias permitirão que o cliente entre no quarto e saia da acomodação sem precisar usar as mãos – ou seja, será utilizado apenas um comando de voz. Nos restaurantes, placas de acrílico separarão as mesas. Nos bares, mesas coletivas darão lugar a individuais. Shows, festivais e grandes encontros provavelmente serão revistos, inclusive em 2021.
Grandes eventos
Eventos de grandes proporções – de feiras gastronômicas a encontros religiosos – deverão migrar para centros menores ou serem realizados on-line. “Estamos tentando inovar, trazendo até mesmo festivais para o ambiente virtual, totalmente por delivery, como o Brasil Sabor. É um novo modo de viver e se conectar”, assinala Lenora Horna Schneider.
Destinos exóticos, slow travel (viajar lentamente, do inglês) e o turismo de experiência voltarão com força completa. Viagens do tipo excursão, passando por várias cidades em poucos dias, ficarão cada vez mais escassas. A França e a Alemanha são países em que esse modo de viajar anda em alta desde 2018. A ideia é focar regiões específicas, com o pensamento de ecorresponsabilidade.
“Faremos mais viagens de ônibus, mas com apenas 50% da ocupação, e buscaremos nova conexão com a natureza”, aposta a turismóloga.