Do staycation ao resort office: turismo nacional é a aposta do setor
Após um período de prejuízos históricos para o turismo, especialistas contam com a diversidade do país para reanimar o setor pós-pandemia
atualizado
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Aviões em solo, ônibus nas garagens, hotéis vazios, atrações turísticas fechadas, pacotes cancelados. A pandemia de Covid-19 ensinou a humanidade a viver sob novos padrões, e com o turismo não foi diferente. Em 2020, foi necessário aprender a viajar na literatura, na imaginação e dentro do recorte das janelas. Contudo, com a chegada de um novo ano, o turismo brasileiro ensaia um retorno gradual apostando em uma das suas principais características: a diversidade.
Com as fronteiras fechadas e a insegurança de realizar longos trajetos, o viajante redescobriu o potencial do Brasil e a importância das pequenas viagens. A mudança também surtiu resultados econômicos. Os brasileiros que deixaram de viajar ao exterior mantiveram no país cerca de 100 bilhões, de acordo com a Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo (Embratur).
O resultado histórico não é apenas um reflexo das restrições impostas pela pandemia. Ainda em 2019, o país teve mais de 20 milhões de viagens domésticas, figurando como um dos maiores mercados internos do mundo. Porém, as medidas de segurança impulsionaram a nova tendência, que de acordo com a Embratur, veio para ficar.
É o que também aponta o levantamento realizado pela Booking.com. “Com a pandemia, os brasileiros demonstraram maior interesse por viagens locais e, no futuro, provavelmente ficar em casa vai continuar dominando os planos de viagem”, afirma Luiz Cegato, gerente de comunicação da empresa na América Latina.
De acordo com o estudo, 55% dos brasileiros pretendem conhecer um novo destino na região em que moram, e 59% querem passar a curtir a beleza natural da sua terra. Além disso, 63% planejam viajar para algum lugar – perto ou longe – que já conhecem, por esse ser um destino familiar.
Redescubra o Brasil
De Norte a Sul, a variedade de alternativas turísticas pulsa em território brasileiro. Enquanto no Sul a paisagem se colore de branco durante o inverno, o verão eleva as temperaturas nas praias de águas cristalinas.
Temos cavernas esculpidas pelo tempo, histórias de heróis brasileiros eternizadas pela tradição oral, cachoeiras emolduradas por belezas naturais estonteantes e uma variedade de credos atraentes ao turismo religioso. Seria mais fácil dizer o que não há no Brasil do que enumerar a lista extensa de alternativas.
Com a segurança em primeiro lugar, a tendência que desponta é o turismo próximo de casa, com destaque para os destinos em meio à natureza. Essa foi a escolha de Alexandre Monteiro, 34 anos, e da esposa Thatiana. Eles estavam com uma viagem para a Europa marcada para 2020, que precisou ficar para depois. A solução para mudar de ares sem abrir mão da segurança foi encontrar alternativas próximas à capital federal, onde moram.
“Nós fomos para Jataí, no Goiás, conhecer as águas quentes de lá. Escolhemos um hotel bem vazio, foi uma experiência tranquila. Essas pequenas viagens foram fundamentais para a nossa saúde mental. Você aproveita a oportunidade para descansar em segurança, com a bateria recarregada”, acredita.
Além do roteiro para o interior de Goiás, o casal também trocou a viagem para o exterior para curtir as belezas de Fortaleza, onde mora parte da família de Alexandre. Também estão nos planos do casal uma viagem de moto pelo Mato Grosso e por outras partes do Nordeste. “Já estamos nos planejando para esse roteiro preferencialmente de moto, que oferece mais segurança que transitar em um aeroporto, por exemplo”, diz.
Staycation, turismo de isolamento e resort office
As mudanças na forma de viajar também estão incluindo novos termos no vocabulário. O turismo sem sair da própria cidade ganhou o nome de staycation, um conceito que tecnicamente pode apresentar uma contradição, mas já se popularizou como alternativa para burlar o estresse e desconforto do cotidiano sem abrir mão da segurança.
Aprender a enxergar um universo de novas possibilidades sem sair da cidade onde mora traz uma série de benefícios, incluindo uma valorização do lugar, da história e dos atrativos locais. A prática também pode reforçar o sentimento de pertencimento das pessoas aos cenários das próprias cidades.
Outra novidade é o resort office: longe de casa, o home virou resort. Diversas opções no universo da hotelaria passaram a oferecer experiências que incluem melhores estruturas para que os hóspedes possam trabalhar ou estudar e, ao mesmo tempo, desfrutar de um ambiente acolhedor e relaxante — e quem sabe até com os pés na areia.
Dos 52 empreendimentos associados à Associação Brasileira de Resorts, entidade que fomenta e representa o segmento a nível nacional, cerca de 40% aderiram à modalidade de resort office. A novidade que veio para ficar também segue o rumo dos caminhos para o turismo de isolamento, uma alternativa segura distante do vaivém dos pontos turísticos lotados.
O antigo turismo de imersão — aquele, em que você passa bastante tempo em um lugar para ter contato com a cultura e costumes locais — se transformou com a imposição do isolamento, que agora oferece uma mudança de ares por um aluguel de hospedagem por temporada, seguindo todas as recomendações de segurança contra a Covid-19.
Nos últimos três anos, levantamentos ligados ao turismo de luxo já vinham apostando no turismo de isolamento como uma tendência de viagens em ascensão pela ideia da exclusividade. Porém, especialistas apontam que a pandemia trouxe a busca por destinos menos movimentados com ainda mais força, em todos os nichos do turismo — do rural ao ecológico.
Essa é a ideia da família da Raissa Monnerat, 23, que abriu mão de um cruzeiro pelos países nórdicos para aguardar a oportunidade de alugar uma hospedagem mais isolada no Sul da Bahia, próximo à Península de Maraú.
“Consideramos que o Brasil tem, sim, uma perspectiva de turismo muito grande, com praias, cachoeiras e vários lugares que permitem que fiquemos isolados, o que é muito importante, e a minha mãe está com muita saudade da praia”, diverte-se a publicitária.
“A gente espera que, em breve, quando a situação melhorar, possamos investir em uma casa só nossa para mudar de ambientes, viver a experiência da viagem sem nos expor nem a outras pessoas”, afirma.
Os novos “queridinhos”
A expectativa de um segundo semestre melhor, como a de Raissa, é compartilhada por outros viajantes brasileiros, de acordo com Elda Almeida, agente de turismo da CVC Viagens. “A demanda está bem pequena, e as pessoas estão muito assustadas. Porém, o pessoal está investindo em pacotes — de passagem e hospedagem — para o segundo semestre, em uma expectativa de um cenário melhor”, conta.
Na lista dos destinos mais procurados, as praias reinam soberanas. Embora seja uma agência de porte internacional, Elda conta que as pessoas estão mesmo procurando as belezas naturais do Nordeste, já com um destino específico em mente.
Christian Soliva, coordenador da Agência de Viagens Bancorbrás, concorda. Como tendência para 2021, “as pessoas estão procurando por hotéis de baixa demanda, menores, mais rústicos e isolados, longe dos movimentos massivos e com maior flexibilidade”, descreve o especialista.
Ao lado das preocupações com o isolamento, a conexão com os ambientes externos é um elemento em comum na busca por roteiros. “Principalmente depois de um período rígido em quarentena, as pessoas estão buscando se reconectar com a natureza e o ambiente”, pondera Christian.
Os dados reafirmam a perspectiva dos especialistas. Confira os destinos brasileiros mais buscados no mês de abril de 2021 na plataforma Booking.com, para check-in entre julho e agosto deste ano: