Apps ajudam mulheres a conquistarem independência no turismo
O número de mulheres embarcam em trajetórias solo ao redor do mundo cresce todos os dias. Veja ferramentas que vão facilitar a experiência
atualizado
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Mais do que cruzar fronteiras reais, viajar sozinho pode ser uma forma de superar barreiras em busca de liberdade, autoconhecimento e novas conexões. Uma experiência desafiadora sobretudo para mulheres, que carregam estigmas da sociedade e, em pleno século 21, ainda precisam provar que não precisam de ninguém para seguir viagem.
Vistas como aventureiras ou extremamente corajosas, as mulheres que viajam solo são tidas como alguém que certamente está fazendo algo diferente, fora da curva. Não é raro ouvir o comentário: “mas você vai sozinha?”, seguido de uma expressão de estranheza. Porém, maior que qualquer medo de sair da zona de conforto, a sensação de se enxergar como um ser único, independente e capaz de realizar os próprios desejos é o que mais motiva as viajantes.
Apesar dos estigmas, com o passar dos anos, mais viajantes do sexo feminino estão dando o primeiro passo para romper com os limites impostos pela sociedade. As brasileiras, em especial, ocupam a segunda posição no ranking de mulheres que mais viajam sozinhas, atrás apenas das japonesas, de acordo com pesquisa do Airbnb. Outro levantamento apurou que mais da metade das turistas do Brasil já viajaram sozinhas.
A capacidade de aproveitar a própria companhia em qualquer lugar do mundo é uma arte, que merece ser aperfeiçoada. Viajantes que se deram ao luxo de trilhar novos caminhos em outros destinos costumam repetir a experiência não só uma, como várias vezes.
A melhor companhia
Normalmente começa assim: você quer ir e decide não deixar a falta de companhia atrapalhar seus planos. O resultado é tão positivo, que decide repetir a dose. Esse é o caso da brasiliense Carolina Amorelli, de 25 anos, que pisou em um avião sozinha pela primeira vez há cinco anos.
Entre os inúmeros benefícios, que vão desde a liberdade e flexibilidade até a necessidade de atender somente às próprias vontades, para ela, o que pesou bastante foi a abertura para fazer novas conexões: consigo, com o ambiente e com outras pessoas.
“Eu sou muito tímida, e com a praticidade de ter amigos por perto, é mais raro ter abertura para conhecer gente nova”, acredita a bancária. “Quando estou sozinha, tenho que conversar mais e me sinto mais aberta a conhecer outras pessoas, especialmente de outras nacionalidades”, completa.
Traços do machismo
Depois da primeira viagem, Carolina já realizou roteiros pela América do Sul e em outros destinos na Europa. Porém, como era de se esperar, a brasileira relata que já ouviu comentários incômodos e alguns “olhares” suspeitos, até em restaurantes.
“Eu costumo sair sozinha para almoçar, tanto em viagens quanto em casa, e alguns garçons já me olharam estranho. Na Itália, especialmente em Nápoles, foi o lugar que eu lidei com um pouco mais de assédio. É mais incômodo para mulheres sozinhas. As pessoas me falavam: você não deveria estar só, é um pouco perigoso”, lembra.
Em um mundo ideal, uma viagem feita por uma mulher sozinha não seria desafiadora ou exigiria coragem, seria simplesmente a representação de uma preferência pessoal. Porém, a segurança é uma preocupação comum, que figura no topo da lista de prioridades femininas.
A turismóloga Gisele Carvalho, doutora em gênero e viagem independente, explica que “os constrangimentos, o assédio masculino e a insegurança” são temas recorrentes quando se fala nos desafios que mulheres viajantes enfrentam. “Uma mulher que está em um bar, por exemplo, não está necessariamente em busca de companhia. Ela pode ter ido lá para curtir a música, comer algo gostoso e se divertir”, explica.
Demandas e prioridades diferentes
Ela também ressalta a diferença entre turistas do sexo feminino e suas demandas, de acordo com a faixa etária. Mulheres mais jovens estão dispostas a dormir em hostels, dividir banheiros e quartos com outras pessoas. Já as viajantes mais velhas, priorizam o conforto de hospedagens como hotéis e resorts.
A farmacêutica Valesca Dias, de 44 anos, explica que precisou desembolsar um pouco mais em sua primeira viagem sozinha, para uma praia do Nordeste, para ter privacidade. Para ela, vale a pena pagar mais e ficar em um quarto de hotel. “A hospedagem, que eu dividiria com alguém, ficou mais cara. O mesmo aconteceu em restaurantes, que oferecem pratos para duas pessoas”, exemplifica.
Porém, com um pouco de abertura para conhecer pessoas novas, os gastos podem ser divididos com novas amizades. A gaúcha fez uma amiga que também estava viajando sozinha, no aeroporto, e dividiram o carro até a praia de Pipa, destino final em comum. Depois do encontro, elas passaram a maior parte da viagem juntas. Viajar sozinha não significa necessariamente uma trajetória solitária.
Ferramentas pensando nelas
- Hostels com quarto feminino
Em alinhamento ao crescimento de mulheres viajantes e às demandas particulares desse público emergente, diversas ferramentas, aplicativos e opções no universo do turismo estão surgindo para garantir mais segurança e conforto às mulheres solo. O primeiro é a opção de quarto exclusivo para mulheres, que muitos hostels oferecem.
Os dormitórios exclusivamente femininos são bastante comuns, por questão de segurança e para deixar as viajantes mais à vontade. A brasiliense Luiza Aviani, de 25 anos, opta por esse tipo de hospedagem, especialmente quando reserva apenas uma cama em um quarto.
“É natural ficar um pouco tensa, e sempre que ouvia um barulho à noite ficava me perguntando se havia alguém no quarto. Porém, em hospedagens femininas, eu me sinto mais segura”, diz.
- SisterWave
Outra alternativa foi criada pela brasiliense Jussara Pellicano, desenvolvedora do SisterWave, plataforma de hospedagem desenvolvida especialmente para o público feminino com o intuito de desafiar o estigma social. Em entrevista ao Metrópoles, a empreendedora explicou que a ferramenta surgiu a partir de experiência própria e conversas com outras mulheres.
“Percebi que as mulheres tinham, em média, duas horas a menos por dia para aproveitar uma viagem. Em muitos lugares, uma mulher viajando sozinha ou ocupando espaços depois de determinado horário é incomum. O objetivo é que elas tenham uma sister local para falar mais sobre o lugar e acompanhá-las em alguns programas. Queremos encorajá-las”, destaca.
- Overnight
Na mesma temática, há ainda o Overnight, outra plataforma de hospedagem exclusiva para mulheres. O principal objetivo do site é ajudar mulheres a encontrarem hospedagem com as quais se sintam totalmente seguras, para que possam viajar sozinhas tranquilamente. É possível reservar desde o local inteiro até quartos compartilhados.
- Pacotes de agências de turismo
Em alinhamento com as novas demandas, diversas empresas de turismo estão oferecendo opções de turismo personalizadas para mulheres que viajam sozinhas. A Bancorbrás, por exemplo, garante serviços que vão desde pacotes completos com guias certificados, passagens aéreas, hotéis até traslados.
- Grupos em redes sociais e blogs
Pelo Facebook, não faltam grupos com mulheres que compartilham dicas, informações e se dispõem a receber outras viajantes em casa, ou atuar como verdadeiras guias turísticas em qualquer destino ao redor do mundo. Ninguém melhor para te acolher e mostrar a cidade que uma moradora. Brasileiras ao redor do mundo formam verdadeiras redes de apoio e acolhimento, por meio das redes sociais.
- FemiTáxi
O FemiTaxi é um aplicativo de transporte privado destinado exclusivamente a mulheres. Nele, além das passageiras, todas as motoristas são do sexo feminino, o que garante mais segurança e tranquilidade para as viajantes. No app, as usuárias podem reservar um táxi para um dia e horário que desejarem, localizando o local de partida e de chegada no mapa disponível. Na seleção do lugar de partida, é possível ainda ver os locais próximos ao usuário e escolher o desejado ou inserir um endereço específico.
- Malalai
A ferramenta criada pela arquiteta Priscila Gama tem como objetivo analisar os pontos positivos e negativos da rota planejada pela usuária em seu deslocamento pela cidade. O objetivo é informar se o caminho escolhido é inseguro para que as mulheres possam tomar a decisão de prosseguir por ele ou não.
Para saber quais são os riscos do trajeto, basta que a mulher informe ao sistema do app a localização atual e o destino final. Para elaborar o relatório de segurança, o sistema leva em conta cinco questões referentes ao caminho desejado: se as ruas são movimentadas, edificações com porteiros ou estabelecimentos comerciais abertos, se há policiamento fixo nas proximidades, trechos com má iluminação pública ou ocorrências de assédios ao longo da rota sinalizada.