Aos 71 anos, Moema Leão te inspira a viver: “Eu aceito o câncer”
Uma das figuras mais conhecidas da sociedade de Brasília, a idealizadora da mostra Casa Cor diz que aprendeu a ser mais serena com a doença
atualizado
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Moema Leão não tem saído muito de casa. Quem a conheceu nos anos 1970 pode estranhar que a empresária tenha trocado a antiga fama de “locomotiva da sociedade” pelas novelas e livros. Foi-se o tempo em que as colunas e revistas cobriam as festas de arromba que ela organizava na Mansão Flamboyant, no Park Way.
Aos 71 anos, uma das maiores figuras da sociedade brasiliense se recupera em casa de um câncer descoberto em janeiro passado. Não esmoreceu. Transparece no sorriso a certeza de que tudo não passa de “um momento”.
Ela recebeu a reportagem do Metrópoles na casa que hoje divide com o marido, Celso Martins. Moema vive em uma construção bem menor, no mesmo terreno da sede da Mansão Flamboyant. Com um caftã estampado, lábios pintados de roxo e a careca exposta, ela quer saber se busca ou não a peruca. “As pessoas estranham muito”, diz. Deixa a cabeça nua, troca o modelito por um blazer alinhado. “Mais elegante”, solta junto com uma gargalhada gostosa.
Com os olhos vidrados no celular, a empresária quer saber como publicar uma foto no Instagram sem virar a câmera para o modo selfie. “Depois eu não sei mais desvirar”, explica.Moema não tem medo de se expor. Encara o tratamento com a mesma energia de quando organizava suas festas memoráveis, mas sabe que agora precisa de uma rotina sossegada. Desde o diagnóstico do tumor no útero, é assim que ela leva a vida. O câncer acabou transformando 2017 em seu “ano sabático”. “É muito chique dizer isso, né?! Ano sabático”, ri.
A primeira geração de Brasília talvez lembre com saudade dos bailes promovidos pela empresária na casa onde morava com os quatro filhos e o primeiro marido, Flávio de Souza.
Entre os convidados, gente do calibre de Pelé, Cauby Peixoto e Roberto Carlos. Ela também recepcionava empresários e políticos que desbravavam a desconhecida nova capital. Juscelino Kubitschek desmontava a sala de Moema para dançar depois de devorar uma cumbuca de canjiquinha.
Para fazerem jus à sofisticação dos encontros de Moema, homens e mulheres mandavam trazer roupas de outras cidades. A empresária também tinha que se virar. Nos anos 1970, havia poucos serviços de manobrista, chefs de cozinha, decoradores, garçons. Ela acabava incentivando pessoas a abrirem seus negócios e movimentando a economia da cidade.
Improvisando aqui e ali organizou festas temáticas legendárias. Uma das mais famosas foi o Baile Hollywoodiano, em 1985, quando se fantasiou de Cleópatra. Uma das convidadas, porém, foi mais ousada. Vestiu-se de amazona e chegou a cavalo na Mansão Flamboyant.
O amor por uma vida social agitada veio como contraponto à rigidez do pai: ele não a deixava nem usar calça comprida na época de sua juventude, em Rio Verde (GO). “Quando cheguei em Brasília com 24 anos e quatro filhos, em 1971, olhei para a imensidão da cidade e pensei: ‘que liberdade!'”.
Deixou para as filhas a paixão por recepcionar. Valéria é uma das decoradoras de evento mais requisitadas da cidade. Narciza tempera as reuniões familiares de moradores do Lago Sul e Park Way com o seu delivery Pizza Parque. E Vivianne se tornou, ao lado do marido, o piloto Nelson Piquet, uma das anfitriãs mais prestigiadas da nova geração brasiliense. Além das três irmãs, o advogado Francisco completa a família.
A doença
Moema recebeu o diagnóstico no início de 2017, após um sangramento. Hoje, parece estar absolutamente bem resolvida com a doença. Mas não passou ilesa pelo baque da notícia. “Eu sempre fui muito saudável, nunca senti nada”, conta. Depois do choque, no entanto, escolheu a serenidade ao desespero como companheira de tratamento — uma cirurgia em São Paulo e oito sessões de quimioterapia em Brasília, sob o comando do oncologista Fernando Maluf.
“No início eu pensava: ‘Sou diferente de todo mundo’. Mas depois a gente vê que não. Assim como aconteceu comigo, acontece com muita gente. Não sou diferente. A vida é isso. O negócio é aceitar e encarar com maturidade. Era para eu ficar infeliz, mas não fiquei. Esse é só um momento. Daqui a pouco ele passa.”
O ano sabático, no entanto, não fez sua vida parar. À frente da Casa Cor Brasília há 17 anos, ela prepara a abertura da edição 2017 da mostra, prevista para setembro. Desde o início do tratamento, divide as sessões de quimioterapia e o repouso com as reuniões ao lado de arquitetos e patrocinadores. “Tem uma fila de espera”, comemora. Transferiu para a exposição o talento que exercia nas festas em sua casa no início de Brasília: a habilidade de surpreender.
As pessoas gostam do inesperado. Naquela época eu impressionava porque não tinha nada em Brasília. Hoje é difícil fazer isso. As pessoas têm acesso a tudo.
Moema Leão
Um livro e um bom açaí
Com sete décadas vividas, foi se apaixonar só agora pelo açaí. “Esquento um pouquinho no micro-ondas para não ficar tão gelado”, confessa. Credita a ele o curioso fato de nunca ter sentido as reações adversas comuns da quimioterapia. “Dá uma energia, né?”.
Neste ano Moema descobriu a yoga e voltou a ler mais. No inverno rigoroso, no entanto, precisou abandonar as aulas por alguns dias. “No final do tratamento eu não estou pegando friagem. Minha imunidade não baixou, mas também não vou facilitar”, diz. Quanto aos livros, tem devorado um atrás do outro. No último da lista, ela parou nas primeiras páginas quando se deu conta que o enredo tratava de câncer. Deixou para lá. “Não quero ficar lendo essas coisas agora”, ponderou.
Diz que “morre de vergonha de admitir”, mas também tem passado as noites acompanhando a novela das 21h, A Força do Querer. “Aquilo é muito real”, comenta sobre a história da traficante Bibi, interpretada por Juliana Paes. A fase caseira, embora tão divergente da “Moema festeira” dos anos 1970, parece lhe cair bem.
Ficar em casa me faz muito feliz, eu gosto muito. Não me dou ao luxo de sequer sentir saudades dos tempos dos coquetéis. Eu vivo o hoje, não tenho essa coisa com o passado. Era um outro período
Moema Leão
Nem com o que passou, nem com o futuro. Moema tem se ocupado apenas em desfrutar o presente com intensidade. “Eu não sei quando minha vida acaba e nem se acaba”, ela diz. “Não deixo nada para depois. Se me perguntassem hoje o que eu faria caso soubesse que ia morrer daqui a três meses, eu diria: ‘Nada’. Ia esperar os três meses, ué, fazer o quê?”, e solta mais uma gargalhada gostosa.