Norma Lillia: troca de país, saudade da dança e conexão eterna com Brasília
Ao Metrópoles, a emblemática professora de balé contou como tem sido a vida após o fechamento de sua academia, em dezembro de 2019
atualizado
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Norma Lillia teve a sorte de saber cedo na vida o caminho que queria traçar. Apaixonada por dança desde os 4 anos, a goiana se dedicou aos estudos de balé clássico e, plié por plié, se transformou em uma bailarina nacionalmente respeitada. Trabalhou ao lado da lendária Ana Botafogo em diversos espetáculos e criou em Brasília, sua cidade do coração, a tão esmerada academia Ballet Norma Lillia Biavaty, que fechou as portas em 2019, após 47 anos de aplausos, devido a uma desavença familiar. O ponto da 108 Sul dará espaço, em breve, a um restaurante.
Hoje, após perder o amado estúdio de dança e enfrentar uma pandemia no auge dos 75 anos, Norma afirma que, pela primeira vez, não sabe qual será seu próximo passo. Terá de improvisar, e quer aproveitar os prazes desse novo ato. Em entrevista ao Metrópoles, ela falou sobre a imprevisibilidade da vida, a saudade dos alunos e a conexão eterna com a capital federal.
Mudança de país
Além de tirar a academia de Norma, a briga familiar (que virou caso de justiça) deixou a bailarina sem moradia fixa em Brasília. Diante da situação, a coreógrafa passou uma longa temporada em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, onde o primogênito de seus três filhos mora.
Agora, está de visita a Doncaster, cidade inglesa onde o herdeiro do meio, Fernando Biavati, reside com a mulher e os dois filhos. “Estou dando uma pausa e curtindo a companhia dos netos. Tem sido maravilhoso”, revela. Ela diz que nutre o desejo de morar no endereço britânico, pelo menos alguns meses do ano. “Tenho um laço forte com esta terra e, sem ponto fixo no Brasil, seria uma boa opção fincar raízes por aqui, perto de entes queridos”, declara.
Norma já fez cursos de dança em renomadas instituições do país europeu e está, inclusive, inscrita no sistema de saúde inglês. Tanto que já recebeu a vacina contra o coronavírus. “Sim, tomei a vacina, devido à minha idade avançada! Garanti mais um ato no espetáculo da vida”, comemora.
Saudade dos alunos
O que conforta Norma é saber que, apesar do fechamento prematuro da academia, ela deixou um legado inenarrável ao cenário cultural de Brasília. Não à toa, até hoje, a professora recebe mensagens carinhosas de alunos e admiradores.
“Minha vocação sempre foi ser professora, e receber recados amorosos de ex-alunos me acalenta a alma”, conta. “Me enche de orgulho saber que formei profissionais incríveis e impactei positivamente a vida de tantas pessoas “, continua.
Ela diz que, ao todo, mais de 40 mil alunos passaram pelo finado estúdio de balé.
Volta à ativa
Apesar de ter adotado uma filosofia mais “deixa a vida me levar”, Norma planeja voltar a dar aulas em breve. Porém, desta vez, apenas para bailarinos profissionais.
“Talvez duas aulas por semana, para dançarinos que almejam aperfeiçoar alguns passos”, comenta.
Ela chegou a receber convites para dar aulas on-line durante a pandemia, mas recusou. “Entendo que seja a melhor opção no momento, mas o ensino a distância não funciona para mim. Faço jus à fama de exigente. Tenho que estar por perto para analisar e ajustar cada movimento.”
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Conexão com Brasília
Os pés de Norma Lillia foram os primeiros a dançar em Brasília. Ela se mudou para a capital em 1962, dois anos após a inauguração da cidade. Aqui, fincou raízes, criou vínculos e e conquistou o titulo de cidadã honorária.
“Minha saudade de Brasília chega a doer. Vi a cidade crescer, protagonizei os meus primeiros espetáculos na Concha Acústica e presenciei a inauguração do saudoso Teatro Nacional [fechado para reformas desde 2014]”, detalha. “Pretendo visitar a capital sempre que possível. É onde meu coração habita”, adiciona.
Norma ainda conta que todas as suas contribuições ao cenário cultural da cidade estão documentadas. “Tudo está sob os cuidados de uma ex-aluna, que tem ordens expressas para divulgar após a minha morte ou quando necessário for.”
Ponto da 108 Sul
É com nostalgia que ela lembra do endereço que deu vida à sua escola de dança por quase cinco décadas. “Adquiri a famosa esquina da 108 Sul no início dos anos 1970. Lá, anteriormente, funcionava um restaurante que servia refeições para os candangos. Transformei o espaço e continuei alimentando pessoas, mas não o corpo delas, e sim a alma”, exclama.
Apesar do desejo de ver o endereço se transformar em um ambiente de culto à arte, Norma está em paz com os novos rumos de seu “solo sagrado”.
“Ouvi dizer que vão abrir um restaurante e pretendem manter o vínculo cultural, mas por meio da música, chamando artistas para tocar esporadicamente. Para o bem do cenário artístico da cidade, espero que assim o façam”, conclui.
O restaurante que abrirá no local será o Vasto, do grupo Coco Bambu. No empreendimento gastronômico, a fachada vermelha de Norma será substituída por uma proposta contemporânea.
O Vasto é especializado em cortes de carnes, e terá capacidade para 240 pessoas. Esta será a segunda unidade do restaurante na capital. A primeira fica no Brasília Shopping.