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Ritmo frenético da moda faz com que designers abandonem grifes de luxo

Raf Simons (ex-Dior), Alber Elbaz (ex-Lanvin) e Hedi Slimane (ex- Saint Laurent) estão questionando a velocidade da indústria fashion

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Guy Bourdin
1 de 1 - Foto: Guy Bourdin

O mundo da moda passou por verdadeiras reviravoltas nos últimos anos. Com o avanço das tecnologias e todo o boom das redes sociais, foi questão de tempo para que a indústria da moda aumentasse o número de coleções anuais e, consequentemente, as marcas acelerassem o ritmo de trabalho. Especialmente porque o consumidor atual não quer mais esperar os clássicos seis meses é a ideia do momento é desfilar peças que já estão nas lojas. No mundo do imediatismo, ao que parece, tudo é para anteontem.

Na cabeça dos designers, a pressão para criar uma coleção e fazer com que ela dê certo em dias de total esquizofrenia midiática, faz com que muitos deles abandonem o posto, parem em clínicas de reabilitação ou, até mesmo, cometam suicídio. Foi o que aconteceu com Alexander McQueen em 2010 e L’Wren Scott em 2014.

Mesmo com todo o histórico de ansiedade e frustrações emocionais, ficou comprovado através de amigos próximos que a pressão do trabalho agravou ainda mais o quadro depressivo dos estilistas. O psiquiatra de McQueen na época relatou que o designer se sentia pressionado porque “ele achou que esta (a profissão) era a única área da vida dele onde sentiu que tinha conseguido alguma coisa. Normalmente, depois de um desfile, ele se sentia deprimido e isolado.”

Divulgação/WhoWhatWear

Há outros casos, Marc Jacobs, por exemplo, foi para a reabilitação em 2007 por conta da dependência de drogas e álcool e, em 2011, Christophe Decarnin, com um quadro de depressão crônica e estresse, foi internado em uma instituição clínica e seu nome nunca mais foi ouvido no mundo da moda.

Por outro lado, quando o volume de trabalho não leva à morte ou à depressão, a tensão faz com que os designers desistam de contratos com casas de renome mundial exatamente por estarem esgotados. Foi o caso de Raf Simons, que ficou três anos na Dior e narrou à escritora Cathy Horyn seu desespero na direção criativa da casa onde toda uma coleção era produzida “em três semanas, no máximo, cinco”.

Além disso, o estilista, que recentemente foi substituído por Maria Grazia Chiuri (ex-Valentino), declarou que embora não tivesse nenhum problema com o processo criativo, sua rotina era “cronometrada” e que “ se houvesse um atraso em alguma reunião, todo o dia estaria perdido. ”

Para quem não lembra, Raf foi o nome que substituiu John Galliano depois que este comandou a casa por 15 anos. O motivo da saída repentina foi atribuído a um colapso nervoso que fez com que o excêntrico estilista – que posteriormente viria a confessar seu “vício triplo” em álcool, soníferos e Valium – ofendesse um casal com insultos antissemitas e racistas em um bar em Paris. Como consequência, o estilista acabou sendo afastado da direção criativa da grife francesa e de sua marca homônima.

Divulgação/Vogue Espanha

Na Balenciaga as coisas também não andaram bem. Nicolas Ghesquière, que comandou a casa durante 15 anos, saiu de lá em 2013 soltando farpas para todos os lados. Em uma entrevista para a revista “System”, o estilista falou sobre o ambiente de frustração que teve de aguentar em seus últimos três anos à frente da grife francesa, dizendo como se sentia “infeliz” quando percebeu que não existia estima, interesse ou reconhecimento por suas pesquisas e falando sem medo como os bambambans da marca “só se interessavam pelo que seria o resultado mercadológico”.

A entrevista rendeu um processo milionário para o diretor, mas vem sendo resolvido fora dos tribunais. Depois disso, veio Alexander Wang que durou apenas três anos e só agradeceu a oportunidade sem dar muitas justificativas à imprensa – talvez porque realmente não tenha tido problemas, ou, por medo de qualquer ataque jurídico da marca como o que houve com seu predecessor.

Vogue USA/Reprodução Facebook/ Instagram

A lista continua com Alber Elbaz, que foi demitido da Lanvin por divergências com a acionista majoritária e a CEO da empresa. Depois de comandar a casa por 14 anos – e mesmo com toda a revitalização da marca que gerava sucesso crítico e comercial—, o que pode ser traduzido de seus depoimentos pós-demissão é que havia sim um nível de esgotamento e cansaço. Tanto que em um discurso na Parsons NY ele declarou que estilistas, além de “não serem máquinas”, não desenvolvem seus trabalhos “baseados nas necessidades inventadas do marketing” e finalizou refletindo que “existe algo fabuloso no fato de ser livre”.

Toda essa aceleração anda de mãos dadas, inclusive, com a brevidade dos acordos. Vanessa Friedman, jornalista do The New York Times, questionou François-Henri Pinault – diretor-presidente do grupo francês de artigos de luxo Kering – sobre o porquê da efemeridade dos contratos entre grandes marcas e diretores criativos. O CEO foi categórico ao afirmar que “esse é ciclo de vida normal do luxo moderno”.

Harpers Bazaar UK/ Divulgação

Contudo, sejamos justos: o problema não está no topo da pirâmide. Conglomerados como Kering e LVMH podem até ter sua parcela de envolvimento no ritmo frenético, mas é papel deles pensar no lado empresarial, buscar as melhores estratégias e ter um bom retorno financeiro. Mas eles só fazem isso quando existe uma demanda, um público ávido por novidades e sempre disposto a adquirir tudo que é “quente” no momento.

Em seu artigo, Friedman ponderou para não vermos os designers como seres indefesos e vitimizados. Eles simplesmente aceitaram participar do processo e dançar no ritmo da música. Muitos deles nem querem assinar contratos longos porque isso tiraria a liberdade de renegociação, sem falar que a maioria ficaria feliz de assinar contrato de apenas um ano, caso pudessem. Mas isso não significa que eles estejam blindados de serem substituídos ou descartados por essa “teoria mecanicista” do mundo da moda.

Hedi Slimane foi um dos que deram conta do recado quando comandou a Saint Laurent. Mudou o nome (tirou o célebre “Yves” da logomarca) e a comunicação visual, transformou a reputação da marca, restaurou seu glamour e devolveu sua posição de direito no universo fashion. Resultado: Saint Laurent se tornou a linha que mais cresceu no portfólio da gigante Kering, duplicando sua receita e aumentando as vendas em cerca de 27% para o segundo trimestre de 2015. Mas isso aparentemente não foi o bastante.

No maior climão de fim de namoro, o estilista que modernizou a casa por quatro anos recebeu uma nota xôxa e a marca, literalmente, apagou todos os registros de seu trabalho no Instagram. Ingratidão? Pode-se dizer que sim. Mas a fofoca dos bastidores é que Slimane era uma espécie de diva controladora que se recusava a trabalhar na sede da marca em Paris, fazendo tudo ser deslocado até ele em Los Angeles. Além disso: queria um aumento de salário para continuar na casa.

Reprodução/Instagram

Nesse universo acelerado, naturalmente existem poucas exceções que se negam a fazer parte do frenesi como Azzedine Alaïa – que além de atender sua clientela em um pequeno ateliê de Paris, tem como lema total independência criativa para trabalhar e fazer o que quer, quando convém e na hora que quiser. Outros, como Karl Lagerfeld, acham que não existe pressão, mas sim, de forma parafraseada, uma grande frescura de pessoas despreparadas.

Seja qual for sua opinião, o fato é que todo esse bombardeio de novidades minuto a minuto tem, espantosamente, um fator positivo para o consumidor final: provocar vários questionamentos. O principal deles (e até mesmo seu ponto de partida) é saber até onde o verdadeiro sentido da moda atual pode andar em descompasso com a saúde de quem a desenvolve e principalmente de quem a consome.

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