Licença parental: veja importância da medida para mães que trabalham
Especialistas defendem que licença igualitária para os pais influencia no ingresso e permanência da mulher no mercado de trabalho; veja como
atualizado
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Com 20% menos participação no mercado de trabalho que eles, as mulheres, em geral, têm dificuldades de ingressar e permanecer em um emprego. Ainda que o currículo delas pese mais, há uma fator entendido como “não vantajoso” para as empresas: as prováveis chances de ocorrer uma gravidez.
Ainda que a maternidade seja o sonho de muitas delas, a decisão de ser mãe pode ser sinônimo de abrir mão da ascensão profissional. “Há empresas que não enxergam a contratação de pessoas do sexo feminino como algo vantajoso, principalmente aquelas que estão em idade reprodutiva e são casadas, pois as chances de engravidarem são maiores”, argumenta a psicóloga e especialista em parentalidade Bianca Amorim.
“Em alguns casos, quando a empresa abre um processo seletivo para vagas específicas, não só o currículo da mulher é algo a ser levado em consideração. Outros fatores da sua vida pessoal também pesam e a empresa pode acabar optando em escolher pelo homem”, explica a especialista.
Licença-maternidade e paternidade
De acordo com o que prevê a Lei Trabalhista Brasileira, a mulher tem direito a 120 dias de licença-maternidade quando dá à luz. O homem, por sua vez, para por apenas cinco dias. “Caso a empresa faça parte do Programa Empresa Cidadã, esse períodopode ser prorrogado para 180 dias para a mulher e 20 dias para os homens”, elucida a advogada Niver Bossle.
Segundo Amorim, essa grande diferença deixa a mulher preterida no mercado de trabalho. “Elas [empresas] entendem que essa mulher pode se ausentar a qualquer momento por um longo período caso engravide. Com isso, empregam o homem”, pontua.
Preocupações igualitárias
Apesar das diferenças, a preocupação com os filhos deveria ser a mesma para os dois. “A estrutura na qual a sociedade se desenvolveu com o passar dos anos favoreceu a ideia de que a mulher deve ser a responsável pelo cuidado com a casa e os filhos, enquanto os homens são os provedores da família”, contextualiza a psicóloga.
Segundo Amorim, esse entendimento, no entanto, não tem sido adotado pelas novas gerações. “Percebemos algumas mudanças quanto a isso nos últimos anos. Os pais querem ser cada vez mais ativos no cuidado com os próprios filhos, estarem mais presentes e serem parte ativa da estrutura familiar”, pontua.
“O que temos conversado e buscando levar para a sociedade é que o pai é tão responsável pela criança quanto a mãe. No mundo ideal, os dois compartilham com igualdade os cuidados com os herdeiros”, pondera a especialista.
Parentalidade: o caminho para a solução
No caminho de encontrar soluções que acabem com esse problema, alguns países têm adotado uma licença coparental, como explica Amorim ao Metrópoles. “Essa é uma área de estudo de mais de 30 anos ao redor do mundo e trata o círculo familiar da criança como um todo, entendendo que não apenas a mãe deve ser a pessoa a se dedicar ao cuidado do recém-nascido”, explica.
Em alguns dicionários, o termo parentalidade é descrito como “qualidade do que é parental; estado ou condição de quem é pai ou mãe”, mas ele vai muito além disso. É levado em consideração, portanto, quem são os adultos responsáveis por essa criança.
“Essa parentalidade é usada para definir, especialmente, a mãe e o pai, mas serve para todo o contexto da criança, levando em consideração as diferentes estruturas familiares. Como aquelas compostas por mãe ou pai solo, avós e avôs que se responsabilizam pelos cuidados, os casais homoafetivos e pais adotivos”.
Nesse contexto, alguns países encontraram uma solução de acabar com a desigualdade e promover um tempo para os pais com os próprios filhos. “A parentalidade entende os arranjos daquela família. Portanto, os responsáveis por aquela criança têm o mesmo período para ficar ausentes e se dedicar à ela após o nascimento.
Na prática, a família tem um tempo específico para a licença e, entre si, se ajusta para programar o período ausente do trabalho. Isso quer dizer que os dois podem se ausentar juntos ou em momentos diferentes, a mãe nos primeiros dois meses e o pai nos dois meses seguintes, por exemplo.
“Cada família se ajusta entre si a partir da sua própria realidade e leva essa proposta para a empresa”, explica.
Melhor para elas e para os filhos
Em países como Finlândia, Islândia, Alemanha, Noruega e Suécia, em que isso já é uma realidade, essa decisão trouxe um melhor contexto para as mulheres. “Isso muda a posição da mulher no mercado de trabalho, pois não há garantia de quanto tempo ela vai ficar de licença e nem o homem”, avalia a especialista.
Conforme explica Amorim, essa licença-parentalidade favorece o fim da desigualdade de gênero no mercado. Dessa forma, não há motivos para uma empresa não contratá-la, levando em consideração o período tirado por ela para cuidar de seu bebê, já que o pai é agraciado com o mesmo direito.
Além das mulheres, que não entram mais em desvantagem ao concorrer um cargo, as crianças também passam a ter uma nova referência em casa. “A licença traz benefício a longo prazo para o casal, pois favorece a divisão de tarefas domésticas entre o casal e promove a satisfação do bem-estar para homens e mulheres”, salienta a advogada Niver.
“Ainda é benéfica para a criança, que passa a ter uma figura paterna mais presente, trazendo ainda um benefício emocional para toda a família”, pontua.
No Brasil, como explica Niver, ainda há um grande atraso no que tange a parentalidade. “Ainda há muito o que caminhar no nosso país nesse sentido. Essa questão gera uma grande discussão pois, ainda que algumas empresas possam fazer arranjos com o funcionário para favorecer essa maior permanência do pai com o filho, não nenhuma lei que trate deste termo e o assegure”, explica.
PL 1974/2021
Em solo brasileiro, o termo apareceu nos registros da lei em 2021, quando a deputada Sâmia Bomfim (PSol-SP) apresentou o projeto de lei 1971/21. O texto prevê a criação de uma lei baseada nos países europeus citados anteriormente que asseguram pai e mãe a tirarem o mesmo tempo de licença para se dedicar aos filhos.
“O reconhecimento da parentalidade toma por princípio o compartilhamento do cuidado atingindo a paridade entre pais e mães e outras pessoas que por essa criança se responsabilizem, garantindo que se construa uma verdadeira rede de apoio comunitário no exercício do cuidado com a criança e o adolescente”, diz o texto.
A proposta prevê “licença parental remunerada de 180 dias a partir do nascimento, da adoção ou do fato gerador do direito à licença parental para cada pessoa de referência da criança ou do adolescente, limitada ao máximo de duas pessoas”.
Criada em 2021, o projeto chegou à comissão dos deputados no dia 20 de dezembro de 2022, dois anos mais tarde de sua criação. Caso seja aprovado sem alterações pela Câmara, o texto ainda deve seguir para o Senado Federal e só então chegar à Presidência da República. Ainda não há previsão para análise do texto.