Relacionamento com sogra causa conflitos em 26% dos casais brasileiros
A psicóloga responsável pelo levantamento, Denise Miranda de Figueiredo, compartilha algumas dicas para lidar com o desentendimento
atualizado
Compartilhar notícia
Falar sobre a sogra costuma ser um assunto polêmico e bastante delicado. Em uma rápida pesquisa, é possível encontrar mais de 14.7 milhões de resultados para o termo, entre eles: “piadas de sogras”, “como lidar com a sogra” e “5 sogras que ninguém quer ter”, por exemplo. Ela é tema de filmes; músicas, como Sequestraram Minha Sogra, de Bezerra da Silva, e do conto A Futura Sogra, de Nelson Rodrigues, em A Vida Como Ela É.
Um levantamento do Instituto do Casal – organização paulista dedicada à prática, pesquisas e educação em relacionamentos e sexualidade humana – publicado em agosto, revelou que, para 26% dos casais brasileiros, a sogra é um dos motivos de brigas entre marido e esposa. No entanto, quando o estudo questionou sobre o sogro, apenas 8% dos entrevistados atribuíram o motivo do desgaste da relação a ele.
O instituto entrevistou 710 casais e listou 38 razões para o desgaste do relacionamento. Os cinco primeiros são: bagunça (51%), falta de diálogo (48%), uso excessivo do celular (47%), excesso de críticas (43%) e divisão injusta das tarefas domésticas (42%).
Apesar de não ser o tema central das sessões de terapia, a psicóloga de casais e famílias e cofundadora do Instituto do Casal, Denise Miranda de Figueiredo, afirma que a interferência da sogra nos relacionamentos dos filhos pode afastar os casais e dificultar o estabelecimento de rotinas. “Os pais acabam querendo impor o seu modelo de família para os filhos. Como se fosse o único e o correto. É importante ter claro que os filhos constituíram uma nova dinâmica, com uma identidade diferente”, alerta.
O Metrópoles escutou várias histórias de noras que têm dificuldade em manter uma boa convivência com suas sogras. Elas preferiram não se identificar para evitar um desgaste ainda maior no relacionamento com as mães de seus maridos ou namorados.
“Aprendemos a conviver pelo bem da nossa família”
A principal queixa das noras é a intromissão das mães de seus companheiros no relacionamento. Elas costumam dar uma segunda chance às sogras e colocar panos quentes nas brigas pelo bem da família.
A empresária Talita Maia* acredita que convive com uma situação clichê, na visão dela: a mãe canaliza todas as energias para o filho único. “Ela abriu mão da própria vida para criar dele e fez isso sozinha. Aí eu cheguei e o roubei, na visão dela”, contou.
Talita explica que o relacionamento com o marido evoluiu muito rápido e isso teria assustado a sogra. “Em duas semanas de namoro, nós já dormíamos juntos todos os dias. Em um mês, decidimos casar e ter um filho. Não deu tempo dela se acostumar com a ideia. Ela queria controlar nossas atividades, onde íamos. Sempre se metia em assuntos nossos e resolvia da maneira dela”, lembra.
Agora, com um filho, Talita tenta passar por cima das desavenças. “Eu já não ligo mais”, disse aliviada.
Segundo a psicóloga, quando se trata de relacionamentos, as pessoas tendem a trazer as suas memórias de afetividade e projetá-las em terceiros, e isso não é saudável. “As mães precisam entender que não é um roubo. O filho casar e sair de casa mostra que você fez um ótimo trabalho, criou um indivíduo independente, capaz de tomas as próprias decisões. É o ciclo da vida se renovando”.
Eliana Almeida*, 30 anos, passou por uma situação envolvendo a interferência da irmã da sogra com episódios de racismo. Ela lembra que, na época, com menos de 20 anos, namorou um rapaz criado pela mãe e tia. “A tia era como uma mãe para ele. Ela questionava se eu era boa o suficiente para o sobrinho”, lembra. “Falava para o avô do meu namorado que ele teria bisnetos negros. Aquilo me incomodava, mas eu não entendia a gravidade dos comentários”, disse.
Além dos comentários, Eliana acredita que a superproteção da família contribuiu para o término do relacionamento dos dois. “Elas são mulheres muito fortes, fizeram de tudo para criar o meu ex, mas fizeram dele um homem fraco, sem capacidade de tomar decisões sozinho”, acredita.
Mas há também quem tenha uma boa relação com a sogra. Segundo Denise, as relações costumam mudar quando se trata de sogra e genro. “É cultural da nossa sociedade o homem ser acolhido pela família da companheira. Ao contrário das dinâmicas femininas, eles tendem a enxergar outras mulheres como mães”, explica.
Foi o caso do aeronavegante Gustavo Salomon, 26 anos. Desde que entrou para a família da esposa, Bharbara de Carvalho, foi acolhido como um filho pelos sogros, Marli Helena e José Soares. É comum a família se reunir para conversar sobre política, temas atuais, música e filmes na companhia de uma cerveja gelada. “Eu acho interessante como ela tem a mente aberta. A gente conversa de tudo. Ela sempre nos apoiou nas nossas decisões”, rememora.
Como apreciador de cervejas, Gustavo já foi surpreendido diversas vezes pelos sogros com bebidas especiais para que pudessem provar juntos. Os mimos para o genro geram brincadeiras por parte da esposa. “Se o Gustavo está de dieta e nós vamos almoçar na casa dos meus pais, a minha mãe faz dois almoços para agradá-lo”, fala, em tom de descontração.
E Gustavo reconhece: “Ela me mima. Dá recomendações do que comer e faz omelete para mim. Nas férias do último ano, eu tive um imprevisto de última hora e quase perdi as passagens. Quando ligamos para a Marli, ela me acalmou, porque poderia passar o Natal com ela enquanto a Bharbara e o Henrique (filho do casal) viajavam com os meus pais”, diz o aeronavegante.
Amor à primeira vista
A animadora de festas paraibana Camila Santos, 29 anos, encontrou em Claudia Simone uma segunda mãe. “Nosso amor foi à primeira vista (sogra e nora)”, brinca. “Ela é maravilhosa, amorosa, carinhosa, linda. É dona de todos os adjetivos bons deste planeta”, contempla.
Camila conheceu o namorado, Gabriel, em 2008, em uma visita a Brasília. Na época, ele namorava uma prima da paraibana. “Eu fui a cupida deles, mas não durou. Minha prima voltou para o Nordeste e o relacionamento deles não deu certo. Nós nos tornando amigos e logo começamos a namorar à distância”, recorda.
Menos de dois anos depois, o casal resolveu morar junto e a sogra, que não conhecia Camila pessoalmente, a convidou para morar em sua casa, em Brasília. “Quando eu vim, uma tia falou que eu estava louca, iria comer o pão que o diabo amassou morando com a minha sogra. Nós sequer discutimos alguma vez”.
Os laços das duas ficaram ainda mais intensos há dois anos, quando a mãe de Camila faleceu. “Quando soube da notícia, ela me abraçou e disse: ‘minha filha, vai dar tudo certo. Eu estou com você'”, lembra. Claudia acompanhou a nora durante todo o processo do funeral, na Paraíba. No voo de volta para Brasília, a sogra disse saber que não substituiria a mãe de Camila, mas, a partir daquele momento, cuidaria dela como uma filha enviada de coração por Deus.
Camila e Gabriel chegaram a romper o relacionamento por um período, mas as duas continuaram a se comunicar e se encontrar. “Quando perdi meu emprego, ela foi a primeira pessoa que eu pensei em contar. Ela saiu do trabalho correndo para me acalmar. Coisa que só mãe faz”, lembra.
“Quando um filho casa, a gente ganha uma filha”
A revisora de textos Carolina Cruz, 33 anos, também tem boas histórias para contar. Há um ano se relacionando com Flávio Felipe Mendes, 32, ela recebe ligações da sogra Rosângela Ferreira, 52, quando não aparece na casa da família para o tradicional almoço de domingo. “Eu tive muita sorte. Acredito muito nessa relação de amizade. É como se fosse mais uma mãe que você ganha”.
A admiração é mútua. “A Carol é muito pé no chão, muito madura. Eu sempre pedi a Deus para meus filhos encontrarem mulheres que quisessem constituir família”, pontua a enfermeira. A ideia de vê-los saindo de casa não a assusta pois, segundo ela, isso é reflexo da criação.
“Eu aprendi que, quando um filho homem casa, a gente ganha uma filha, e quando um filha casa, a gente ganha um filho. Eu sempre quis ter uma família grande”, explica.
A psicóloga dá algumas dicas para lidar com conflitos familiares:
1 – Casal unido jamais será vencido: marido e esposa precisam pensar juntos em soluções para resolver os conflitos com a família de origem, seja com a sogra, sogro ou cunhados;
2 – Fale dos seus sentimentos: se você está passando por algum problema com a sogra, deve falar abertamente com seu parceiro. A psicóloga aconselha que seja dito como você se sente, sem atacar a pessoa. Exemplos: “eu me sinto chateada quando sua mãe diz isso ou faz aquilo”. Lembre-se: mãe é mãe. E se fosse a sua? Você iria gostar de ouvir críticas sobre ela?
3 – Entenda as diferenças: O casamento envolve a união de duas pessoas criadas sob diferentes valores e cultura. O que é normal em uma família, pode não ser para a outra. O matrimônio é a construção de uma dinâmica diferente, com uma nova identidade e valores;
4 – Traga o bom, deixe o ruim: Todos nós trazemos para os relacionamentos afetivos a bagagem familiar. Identifique o que pode ser benéfico para seu novo lar, e ajudar a fortalecer a união. Avalie o que não foi tão bom assim e procure evitar repetir esses padrões;
5 – Estabeleça limites: Deixe claro para as famílias de origem quais são os limites da interferência aceitos pelo casal;
6 – Pense nas crianças: Caso você tenha filhos, procure não privá-los da convivência com os avós, tios, tias, primos e primas. Isso é muito importante na construção da identidade da criança, da personalidade e da história da família;
7 – Nem tudo tem solução: Por fim, há problemas que simplesmente não podem ser resolvidos. Aceite e procure conviver da melhor forma possível com isso.
* Os nomes reais foram substituídos por fictícios para preservar as identidades das entrevistadas.