Propaganda polêmica da Gillette provoca reações furiosas na web
O mais recente anúncio da empresa de lâminas de barbear que denuncia o mau comportamento dos homens parece ter arranhado o ego masculino
atualizado
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Alguns homens ficaram tão chateados que estão jogando as lâminas de barbear fora. Tudo em nome de cortar qualquer frescura. Mesmo que isso signifique parecer um neandertal. Falando em neandertais, eles tinham uma boa vida, não?
Nas cavernas, os papéis eram claramente definidos. Os homens caçavam, e as mulheres ficavam recolhidas. Nada para se envergonhar. E as mulheres das cavernas sempre estampavam um sorriso quando você voltava da matança.
Ah… aqueles eram os bons tempos! Quando a maior ameaça ao seu ego vinha de uma fera peluda, e não de uma lâmina, não de propagandas sobre seu cotidiano. Quando mulheres usavam a sua criatividade para fazer geleia.
É quase o suficiente para fazê-lo lacrimejar como aqueles homens afeminados no anúncio da Gillette. Qual é o problema deles, afinal? Que razão eles têm para repensar sua identidade enquanto uma sequência de imagens de assédio sexual do mundo real e do cinema é exibida diante de seus olhos?
O comentarista britânico Piers Morgan – ele próprio prestes a deixar crescer a barba – foi preciso: “Deixem os garotos serem malditos garotos, e os homens serem malditos homens: parem com essa guerra destrutiva contra a masculinidade”, tuitou ele.
Verdade seja dita: isso é uma guerra. Não o tipo tradicional de guerra em que os nossos corpos são rotineiramente sacrificados. Essas são as boas guerras. Pelo menos contam com tanques de verdade. A brigada politicamente correta de feministas peludas uivando “sexismo” é bem mais perniciosa. E a Gillette, ao permitir que esse tipo de coisa invada o domínio masculino da raspagem dos pelos faciais, foi longe demais. Não resta mais nenhum espaço seguro.
Eles poderiam ao menos ter colocado um aviso de gatilho antes da propaganda. Até mesmo armas de fogo, que são bem menos ameaçadoras à masculinidade, contam com um.
“A propaganda a seguir pode forçá-lo a repensar sobre si de um ponto de vista negativo”: poderia ter sido o início, permitindo que você pulasse o vídeo e seguisse diretamente para a seção de comentários.
Só que não. Justo quando você estava prestes a se esparramar no sofá e esperar o seu fabricante favorito de lâminas oferecer a propaganda de sempre, que sugere uma conexão entre um barbear rente e proezas esportivas, eles exibem algo completamente abominável: um pedido para que você coloque a mão na consciência.
Esses arquitetos da reflexão são os verdadeiros inimigos na era do #metoo. Aqueles que ousam examinar a sua fragilidade, apontar suas fraquezas – chamar a atenção para o mau comportamento.
Porque, veja bem, dói! Dói perceber que você pode estar sendo cúmplice de uma cultura responsável não só pela degradação de meninas e mulheres, mas também de meninos e homens.
Dói pensar que talvez tenha sido inapropriado assobiar para uma menina ou soltar um comentário sugestivo para uma garçonete. Dói pensar que você pode ter interrompido abruptamente uma colega do sexo feminino ou tomado crédito pelas ideias dela. Ou que você pode ter depreciado garotos que não se enquadraram no seu ideal sobre como um homem deve ser. Ou ter tentado moldá-los em uma miniatura de você mesmo.
Dói ter que enxergar a si mesmo como um vilão.
Então permita-se ser machucado! Seja como um menino criado a leite com pera e tenha a coragem de refletir sobre o mundo a sua volta. Deixe essa raiva se esvair. Transforme isso em algo exemplar. E lembre-se que não importa o quão bem essa barba fica em você: os neandertais que a inspiraram estão extintos.
A jornalista Kate Ferguson escreve para o site em inglês da DW e emite opinião pessoal