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Primeiro grafiteiro surdo do país, morador do DF se reinventa na pandemia

Odrus nasceu surdo e colore as paredes das cidades do quadradinho do DF há 20 anos

atualizado

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Hugo Barreto/Metropoles
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1 de 1 221220 HB Rafael Odrus O primeiro grafiteiro surdo do Brasil15 (1) (1) - Foto: Hugo Barreto/Metropoles

Rafael Odrus, de 38 anos, é o primeiro grafiteiro surdo do Brasil. O nome artístico é um anagrama da condição que carrega desde que nasceu. Conhecido no Distrito Federal pela arte urbana, ele teve que se reinventar durante a pandemia do novo coronavírus. Com o distanciamento social, os trabalhos remunerados diminuíram e as lacunas na acessibilidade à comunicação on-line ficaram ainda mais evidentes.

“Participei de duas lives. É difícil essa forma de me apresentar, porque faltam intérpretes de libras (Língua Brasileira de Sinais)”, conta Rafael, que também tentou acompanhar outras transmissões, mas não conseguiu, devido à ausência de tradução.

Segundo ele, o cenário poderia ser diferente se houvessem medidas como ensino de libras aos estudantes, desde o início da fase escolar. Desse modo, vivenciaríamos uma completa integração dos surdos na sociedade.

Enquanto isso não acontece, ele sonha em ajudar crianças a se encontrarem na arte. “Meu grande sonho é desenvolver um projeto na periferia com aulas de grafite, dança, música, que inclua também as pessoas com deficiência, especialmente surdos, que não têm acesso a essas manifestações culturais”, afirma.

“Ainda há preconceito com o grafite. Muitos não conhecem e discriminam porque é uma arte periférica. As crianças precisam aprender a arte urbana e nas escolas, conhecer o lugar em que vivem”, pontua. O grafite é caracterizado pela produção de desenhos em locais públicos e pela crítica social indireta.

Odrus também já participou de outros projetos sociais, como a oficina de grafite para crianças não ouvintes no Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM) e na Unidade de Internação do sistema socioeducativo de Planaltina. Cada ação como essa é embasada na crença de Rafael de que a arte pode transformar vidas.

Galeria a céu aberto

Artista autodidata há mais de 20 anos, Odrus se ocupa colorindo as cidades administrativas do DF. Ele foi um dos primeiros a levar a arte urbana para a cidade de Santa Maria, em 2001. O trabalho ampliou os horizontes do brasiliense, que já viajou para sete países com o intuito de propagar o grafite.

Ele participou de exposições renomadas, como a Mundez, no Museu Nacional de Brasília; e a ECCO, e já foi convidado para participar de eventos internacionais nos Estados Unidos, França, Espanha, Panamá, África do Sul, Alemanha e Canadá.

Ao Metrópoles, ele mostrou alguns dos pontos que marcou com o grafite. Multicoloridos e imensos, os desenhos chamam a atenção e tornam Planaltina, onde reside atualmente, uma galeria de arte a céu aberto.

5 imagens
A intervenção artística está programada para 27 e 28 de novembro, e 4 e 5 de dezembro
Na foto, a arte que fez em apoio a um salão de beleza local
Ele é pai de cinco filhos, do quais três também são surdos
A arte da foto foi feita por ele, sozinho, em duas semanas
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Rafael grafita há 20 anos

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A intervenção artística está programada para 27 e 28 de novembro, e 4 e 5 de dezembro

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Na foto, a arte que fez em apoio a um salão de beleza local

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Ele é pai de cinco filhos, do quais três também são surdos

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A arte da foto foi feita por ele, sozinho, em duas semanas

Hugo Barreto/Metropoles

Ele também deixou sua marca por outros pontos do DF, como Ceilândia, Sobradinho, Riacho Fundo 2, Brazlândia, Luziânia e Valparaíso. “É importante ter arte na favela. É um lugar de grande violência, que as pessoas sofrem muito. A arte me salvou e acredito que pode salvar outras pessoas, se ensinarmos às crianças um caminho melhor”, celebra.

Durante a quarentena, Odrus se aventurou na arte digital:

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Os principais desenhos são autorretratos
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Junto com amigos, ele começou a praticar a arte digital em 2020

Rafael Odrus/Cortesia
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Os principais desenhos são autorretratos

Rafael Odrus/Cortesia
Vivência

Rafael é pai de cinco filhos e nasceu com surdez bilateral profunda, ou seja, nunca ouviu completamente. Ele não completou o ensino médio por conta de dificuldades na comunicação. Atualmente, além dos trabalhos com a arte urbana, atua na Associação de Centro de Treinamento de Educação Física Especial (Cetefe), documentando e arquivando processos.

Sofri muito preconceito desde a infância por ser negro, pobre e surdo”, conta. “Demorei para aprender libras. Estudei numa escola onde queriam que eu aprendesse a falar. Ficava sozinho, não brincava com outras crianças. Lembro que chorava muito por não ter amigos e outras crianças para brincar, sentia muita falta da minha mãe

Rafael Odrus

Durante a adolescência, aos 16 anos, Odrus se envolveu com crimes e foi internado duas vezes em unidades socioeducativas. “O grafitti e a cultura hip hop me salvaram. E minha mãe também, que nunca desistiu de mim. Algumas coisas aprendi pela dor e vejo que nossa sociedade ainda tem muito a melhorar para conviver com as diferenças e respeitar todas as pessoas”, afirma.

Rafael-Odrus
Ele também trabalha com documentação e arquivo de processos

A vivência de Rafael transparece em seus trabalhos, que mostram, com sensibilidade, as dores de quem é marginalizado por ser diferente ou por ser negro. Odrus enfatiza o lado social e prega a valorização das pessoas negras, da cultura surda e das comunidades periféricas.

“Minha emoção e inspiração para pintar as ruas vem de tudo que eu vivi. Sou negro e cresci na periferia. Senti na pele todas as dores de ser preto, pobre e surdo”, diz. “Me sinto muito feliz em ver a cidade que moro toda colorida, cheia de vida e histórias nas paredes”.

Rafael-Odrus
Muros de Planaltina recebem, cotidianamente, a arte de Rafael Odrus

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