Mãe solo mobiliza comunidade na batalha final da filha contra o câncer
Capixaba Jessica Rohsner angaria fundos para custear fase final do tratamento de Yara, diagnosticada com neuroblastoma aos 3 anos de vida
atualizado
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Mesmo desacreditada por médicos inicialmente, a mãe solo Jessica Rohsner, do Espírito Santo, jamais perdeu a fé na cura da filha, Yara, de 5 anos, diagnosticada com câncer em estágio avançado em setembro de 2020.
À primeira vista, o prognóstico era mesmo desanimador. Quando fora descoberto, no auge da pandemia de coronavírus, o neuroblastoma (câncer em partes do sistema nervoso ou nas glândulas adrenais) já havia se alastrado para os ossos e a medula da criança. “Após uma árdua luta, permeada por sessões de quimioterapia, radioterapia, imunoterapia e um transplante, estamos na reta final do tratamento”, celebra a mãe, que precisou pausar a carreira de fotógrafa para cuidar da filha.
Ela revela o maior desejo da dupla quando a tão sonhada cura for atestada por oncologistas — a expectativa é de que boas-novas sejam anunciadas até o fim deste ano. “Realizar uma carreata em Vitória, nossa cidade natal, com todas as pessoas que vibraram e nos apoiaram nessa longa jornada. Sem a ajuda financeira e emocional delas, jamais teríamos chegado até aqui”, diz Jessica, com a voz embargada.
Para auxiliar no custeio do tratamento de Yara, atual paciente do Hospital da Criança de Brasília José Alencar (HCB), onde a etapa final do protocolo de saúde dela é realizada, a mãe produziu camisetas com a frase “Amor cura”. “Ele realmente cura. Familiares, amigos e desconhecidos nos nutriram de amor e esperança nessa trajetória. E cá Yara está, uma criança feliz e ativa, apesar das previsões médicas iniciais”, comemora a capixaba de 30 anos.
Cada unidade da camiseta custa R$ 60 e pode ser adquirida por meio do WhatsApp (27) 99794-7643. O lucro das blusas é destinado ao custeio da moradia da família em Brasília (DF), da alimentação especial da criança e dos demais cuidados não financiados pelo Sistema Único de Saúde (SUS). “Nossa luta está perto do fim, mas ainda não acabou”, diz a mãe, que raspou o cabelo em solidariedade à menina.
Diagnóstico
A pandemia de coronavírus atrasou o diagnóstico de Yara, conforme lembra a progenitora. “Os primeiros e brandos sintomas dela foram minimizados por médicos, à época sobrecarregados com os casos de Covid-19”, lamenta.
De início, a pequena tinha constipação e abdómen dilatado. “Ninguém pediu um exame dela. Falavam: ‘Mãe, são sintomas simples. Leva ela para casa’, com medo da pandemia”, relata.
Meses após os primeiros sinais, com a menina já visivelmente debilitada, um familiar de Jessica conseguiu uma consulta com uma endocrinologista pediátrica renomada de Vitória, funcionária do SUS. “Ela foi a primeira a identificar que havia algo de muito errado com a minha filha. Me senti aliviada quando ela constatou a gravidade do caso e disse que o avaliaria cautelosamente. Intuição de mãe não falha, né? Minha filha realmente inspirava cuidados”, conta.
Após exames de sangue e uma radiografia, um metastático neuroblastoma (terceira neoplasia maligna mais comum na infância e na adolescência, atrás apenas da leucemia e dos tumores do sistema nervoso central) foi identificado.
Colo de mãe
Nas palavras de Jessica, o câncer infantil é uma doença que exige colo de mãe.
“Os pais, infelizmente, costumam correr. São muitos exames e consultas. Precisei parar a minha vida para lutar pela da minha filha”, declara.
O pai de Yara, ainda nas palavras da capixaba, “existe”, mas não oferece amparo financeiro, tampouco participa da dura rotina da filha.
Sucesso nas redes sociais
Sozinha, Jessica se mudou para o Distrito Federal com a filha e passou a relatar, de forma leve, a luta da herdeira contra o câncer nas redes sociais. Atualmente, apenas no Instagram, um perfil dedicado à garotinha possui mais de 5 mil seguidores.
“Yara virou uma inspiração para jovens que enfrentam dificuldades semelhantes às dela”, exclama a mãe.
Um vídeo recente da menina cantando a música Lei It Go, do filme Frozen, ao finalizar uma importante etapa do tratamento viralizou e comoveu internautas.
Remédio de R$ 2 milhões
O neuroblastoma, mesmo após centenas de sessões de quimioterapia e transplantes, tem 60% de probabilidade de reaparecer. Para reduzir esse percentual e elevar as chances de cura, Yara precisou tomar Qarziba, um medicamento que custa quase R$ 2 milhões.
Depois de entrar na Justiça, a família da menina conseguiu acesso ao remédio, que chegou da Suíça no mês passado. A criança foi a quarta a ser agraciada com o medicamento no HCB. “Uma baita conquista. Ao fim dos ciclos do remédio [resta apenas um], as chances do câncer reaparecer cairão para 40%”, vibra Jessica.
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Saudade do cabelão e preconceito
Meiga e destemida, Yara entende a necessidade dos exames para a perpetuação de sua vida. “Ela não reclama. Faz o que for preciso. O que ainda sente muita falta é de ir à escola e ter um cabelão”, divide a mãe.
Mas, quando crianças não querem brincar com a garotinha pela ausência dos fios, ela mesma explica a situação. “Passei por um tratamento, por isso estou careca e tenho uns machucadinhos. Mas posso brincar. Não é contagioso”, costuma dizer a pequena, segundo a progenitora.
A capixaba diz que, agora, os fios da pequena estão voltando a crescer, já que esta fase do tratamento não interfere no crescimento dos folículos capilares. “No entanto, ela traz outros efeitos colaterais, como dores musculares terríveis. Algumas pessoas viram para mim e dizem: ‘Nossa, ainda bem que o cabelo não cai’. Mas eu preferiria mil vezes que os fios caíssem e minha filha permanecesse bem”, diz.
“Com o preconceito, já estou acostumada. Mas a ver a minha filha mal, sem energia, jamais estarei”, declara.
Passeio no parquinho e jantar no Spoleto
Jessica revela a tática criada por ela e Yara para sobreviver aos dias maçantes no hospital: fazer planos para o futuro. “Ela fala: ‘Mamãe, depois das picadinhas, vamos passear no parquinho e comer no Spoleto [fast food de comida italiana], né?’. Ainda diz que quer ser mãe, nadar com tubarões e brincar com tigres. Digo a ela que claro, ela vai realizar tudo o que deseja”, exclama.
A mãe ressalta a importância de alimentar os sonhos das crianças, mesmo as mais enfermas. “Nunca deixei de alimentar os sonhos de Yara. Sonhos nos movem. São essenciais para a vida e a recuperação, seja de qual mal for”, finaliza.
A menininha sonhadora, em breve, segundo os médicos, poderá botar todos os desejos em prática.