“Eu escolhi esperar”: empresários contam por que não vão reabrir tão cedo
Algumas empresas locais pretendem continuar fechadas, mesmo com a permissão de retornar às atividades. Principal motivo é segurança
atualizado
Compartilhar notícia
A reabertura dos bares cariocas no início de julho ficou marcada pela imagem de uma mulher discutindo com um fiscal da prefeitura do Rio de Janeiro por não respeitar o uso obrigatório de máscara. Demonstrações de resistência e desrespeito às normas também foram registradas em diferentes pontos da cidade, mas essa é apenas uma parte do desafio que empresários de todo país terão de enfrentar com o retorno das atividades econômicas.
No Distrito Federal, academias, salões de beleza e barbearias voltaram a funcionar na terça-feira (07/07), seguindo o calendário proposto pelo governo local. Um dia depois, a Justiça revogou o decreto do governador Ibaneis Rocha, estabelecendo multa para empresas que continuassem abertas.
Apesar do desembargador do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) já ter suspendido os efeitos da decisão liminar que interrompeu o cronograma, parte dos empresários da capital já está decidida a manter as portas fechadas, pelo menos por ora.
Entre os motivos elencados, estão a preocupação com a segurança de funcionários e clientes, a previsão de baixo movimento e a convicção de que a flexibilização, no pico de contágio da doença, é um grande equívoco.
“Saúde das pessoas é mais importante”
A Cirqus Acroesportes fechou as portas na 716 Norte antes do decreto editado pelo governador no dia 15 de março, suspendendo o funcionamento das academias. O objetivo era se adiantar à onda de contaminação que, àquela altura, atingia duramente estados como Rio de Janeiro e São Paulo. Seguindo o mesmo raciocínio, os sócios Thiago Ribeiro e Carol Cutrim não cogitam reabrir.
“Não vamos balizar nossas ações por um decreto porque a saúde da população em geral, dos nossos alunos e funcionários, é mais importante. Não posso colocar oito alunos numa sala de aula fechada, com ar-condicionado e esperar que, caso alguém se contamine, eu não tenha culpa. Não faria sentido”.
Thiago Ribeiro, sócio da Cirqus Acroesportes
Por meio de uma pesquisa on-line, o proprietário identificou que o posicionamento da empresa está em consonância com o dos frequentadores. “Mais de 90% dos nossos alunos apoiam a nossa decisão”, pontua.
O negócio vai bem graças a um abatimento no aluguel acordado com o dono do espaço e um projeto on-line, que garantiu a permanência de pelo menos menos 100 alunos ativos. Os demais, cerca de 200, optaram por prorrogar o pacote de aulas contratado e retomá-lo assim que acabar a pandemia. Apenas quatro clientes pediram o dinheiro de volta.
“Não está sendo fácil para nenhum empresário. Nós abrimos as portas em 2018, então, isso tudo foi bastante negativo. Porém, direcionamos nossa atuação para o segmento on-line e tem dado super certo. Inclusive, a Cirqus em Casa é um projeto que queremos manter quando as aulas presenciais voltaram”, adianta o educador físico.
Segurando as pontas
A avaliação dos responsáveis pelo Manifesto Coworking, na Asa Norte, é semelhante. Como, por essência, praticamente tudo em um coworking é compartilhado, os proprietários não vislumbram um cenário favorável neste momento. No local, também funciona o Treze Tipo Um Café. “Na nossa percepção, não faz sentido nenhum voltar agora, no pico da doença. Ninguém se sente seguro. Eu não me sinto seguro de chamar meus funcionários para trabalhar, nem os frequentadores, que buscam estar em um ambiente livre de coronavírus.”
Para segurar as pontas e manter todos os funcionários empregados, o Manifesto teve de recorrer a empréstimos. Os sócios não pretendem flexibilizar as própria regras nem para pagá-lo. “Estamos tomando prejuízos grandes. A cada mês, a situação piora. Porém, melhor tomar prejuízo agora do que botar em risco a vida da nossa comunidade”, diz Leonardo.
“Nossa decisão é reabrir apenas quando a curva estiver, de fato, caindo. Esperamos que isso ocorra antes do ano acabar. Entretanto, se a situação continuar numa crescente, voltaremos só em 2021”, conclui.
Ver essa foto no Instagram
Responsabilidade com o outro
A arquiteta Renata Brazil, uma das empresárias à frente da Galeria Norte – que reúne seu escritório, Ateliê Monolito, e o restaurante Jamburita – também está disposta a esperar para retornar às atividades presenciais.
Ela afirma que o ateliê não precisou demitir nenhum funcionário e continua a todo vapor por home office. Já o Jamburita, conduzido pelas sócias Irene, Mariana e Patrícia, está trabalhando por meio de encomendas.
“Estamos conseguindo nos virar, cada um à sua maneira. No começo, tivemos uma baixa grande. Depois, as pessoas voltaram seus olhares para a casa, para o seu bem-estar, e novas oportunidades surgiram”
Renata Brazil, arquiteta e uma das sócias da Galeria Norte
Com a ajuda de clientes, parceiros e amigos, os sócios da Galeria Norte também estão aproveitando para tocar projetos importantes, como uma recente campanha de arrecadação de agasalhos. “Acho que esse momento aflorou nosso senso de responsabilidade com o outro. Sabemos que todos estão em uma situação complicada, mas existem pessoas que são mais atingidas”, conclui a profissional.
Ver essa foto no Instagram
“As coisas não vão voltar ao normal por causa de um decreto”
Com a autorização concedida à salões de beleza pelo governador Ibaneis Rocha (e derrubada logo em seguida pela Justiça), a beauty artist Jackeline Monteiro decidiu abrir as portas no dia 7 de junho.
Pressionada pelos boletos que não paravam de chegar, ela montou um esquema especial para atender as clientes, com itens de higiene e intervalo de pelo menos uma hora entre as agendas. No entanto, não acredita que o esforço valeria à pena, tanto pelo quesito segurança quanto pelo financeiro.
“A pandemia não vai acabar e tudo vai voltar a funcionar por causa de um decreto. As pessoas têm consciência e, infelizmente, isso vai demorar um pouco pra passar”, opina a profissional.
Jacqueline Monteiro, beauty artist e empresária
Ela também acredita que reabrir antes da disponibilização de uma vacina exigirá que empresários de modo geral mudem bastante sua forma de trabalhar. Por isso, acha a intervenção feita pela Justiça prudente.
Até isso ser possível, a profissional pretende “se virar como pode”, assim como as demais fontes ouvidas pelo Metrópoles. “Tenho minha rede de apoio, ainda bem. O dono da loja, que deixou de cobrar aluguel. As clientes, que adquiriram vouches para usar no pós-pandemia. E também estou fechando uma linha de crédito. Vai ficar tudo bem”, conclui.