Escritoras e poetisas brasilienses movimentam o debate feminista no DF
Por meio de poesias e lambe-lambes, Julianna Motter e Tatiana Nascimento problematizam o tema na região
atualizado
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“Outro dia, colando um dos meus lambe-lambes em São Paulo, um homem gritou para mim: ‘Que lixo! Que lixo!’”. Na cidade dos arranha-céus ou na capital dos espaços vazios, Julianna Motter, 24 anos, espalha suas poesias.
Entre os versos, surgem reivindicações feministas em resposta ao machismo e às críticas que recebe na rua ou nas redes sociais. Por meio das palavras, a escritora encontrou uma forma de se conhecer e de transformar em rima as inquietações e descobertas.Assim como Julianna, Tatiana Nascimento, 35, colocou em estrofes e em parágrafos seus devaneios e inquietações. Aos 19, viu nascer seu primeiro zine. Neste ano, publicou o livro “lundu”.
Para tornar ainda mais real o desejo de ver exemplares em circulação sem as amarras das grandes editoras, a brasiliense, em parceria com a paulistana Bárbara Esmenia, criou o Padê Editorial – coletivo dedicado à publicação de autoras negras, periféricas e lésbicas.
Para Tatiana, a divulgação de seu primeiro exemplar foi uma grande experiência, mas Julianna ficou desencantada com o mercado editorial. “Me arrisquei mesmo sem apoio. Pedi para um colega que trabalhava na editora ler os meus textos e fazer o prefácio. Ele virou para mim e perguntou: ‘Você tem certeza que quer publicar isso?’”, recordou.
Julianna conta que ficou muito mal com a situação. Segundo ela, a sociedade espera que as mulheres escrevam apenas sobre amor. “Se eu quiser escrever sobre isso, vou escrever porque quero e não porque sou mulher.” A obra “De Carne e Concreto”, na verdade, trata sobre a morte da mãe da autora. Atualmente, ela se dedica à produção de lambe-lambes e deve lançar um zine até o fim deste mês.
As duas escritoras têm despontado no cenário da literatura brasiliense. Com construções fortes, elas também se tornaram referência na luta feminista, embora Tatiana não se intitule mais como tal. “O feminismo é uma metodologia que me encanta, mas, há muito tempo, não uso mais esse título. A resistência demanda muita energia. Hoje, várias feministas com mais de 50 anos estão com câncer”, apontou.
A autora lembra que em um dos protestos de que participou na Universidade de Brasília (UnB) viu uma jovem segurando um cartaz com as seguintes palavras: Reitor, a próxima pode ser a sua filha. “Não! Não tem que existir próxima, entende?”, comentou Tatiana.
Posicionar-se no mundo é tônica usada pelas escritoras em seus textos. O feminismo veio como consequência. Sobre a efervescência do debate acerca do movimento nos últimos anos, Julianna e Tatiana dizem ter havido uma popularização do tema após a Marcha das Vadias e das campanhas #MeuPrimeiroAssédio, #MeuAmigoSecreto e #AgoraÉQueSãoElas, nas redes sociais.
Contudo, elas ressaltam que o ambiente virtual acomodou o ativismo. Para as escritoras, é necessário ter vivência e conhecer organizações de mulheres que desempenham ações importantes no Distrito Federal.
Entre as associações destacadas pela dupla, estão: Pretas Candangas, Coturno de Vênus, Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), Casa Ipê, Coletivo Casa Dandara e Casa Popular de Cultura de Rua Frida Kahlo. Todas essas comunidades têm páginas no Facebook e realizam diversos encontros na capital.