Entenda por que a nova namorada de Keanu Reeves incomoda tanto
Internautas reprovaram escolha do ator. Para especialistas, caso demonstra discriminação e tendência a relacionamentos superficiais
atualizado
Compartilhar notícia
Alexandra Grant, Briggite Macron e Marília Gabriela têm, aparentemente, pouquíssimo em comum. Moram em pontos distantes entre si no globo terrestre, atuam em profissões diferentes, e têm vidas que provavelmente não seriam associadas, não fosse uma experiência que compartilharam. Em países e até épocas distintas, as três foram vítimas de preconceito por transitarem pelo que parece ser um dos processos mais naturais da vida: o amadurecimento.
Três meses depois de o presidente Jair Bolsonaro iniciar um conflito diplomático por ironizar a idade da primeira-dama francesa, Brigitte Macron, de 66 anos, a internet voltou a exibir comentários machistas e discriminatórios para uma mulher. O pretexto é o mesmo: a aparente incapacidade de aceitar que elas podem envelhecer e continuar se relacionando afetivamente, inclusive com homens mais jovens.
Dessa vez, o alvo dos comentários preconceituosos foi a artista plástica Alexandra Grant, de 46 anos, atual namorada do ator e diretor hollywoodiano Keanu Reeves, de 55. Ao que parece, apesar de Reeves ser nove anos mais velho que Alexandra, para a internet, ele continua um galã, enquanto Alexandra está velha demais para namorá-lo.
“Vivemos em uma sociedade em que persiste a ideia de que pessoas e corpos fora do padrão estão fadados à solidão. Esse comportamento ageísta/etarista, que coloca pessoas maduras em situação de discriminação, é mais forte e recorrente para as mulheres. Não à toa, temos um mercado de estética voltado, sobretudo, para o público feminino. Homens podem envelhecer e permanecem atraentes. O mesmo não ocorre com a mulher”, comenta a doutora em sociologia pela UnB, Bruna Jaquetto Pereira.
A depreciação de mulheres que atingem a marca dos 40 não é novidade. Em 1999, a jornalista Marília Gabriela casou-se com o ator Reynando Gianecchini, 25 anos mais novo, e permaneceu com ele por sete anos. Hoje, duas décadas depois, é comum que ambos ainda sejam questionados sobre a veracidade do relacionamento.
“Esse comportamento sempre existiu em praticamente todo o mundo. Ocorre que o Brasil tem uma dificuldade particular de aceitar a independência e autonomia da mulher, inclusive sexual, a partir de determinada idade. Essa ideia de que o amor não enxerga características físicas ou sociais é facilmente desmentida quando você analisa as estatísticas”, acrescenta.
Relacionamentos rasos
Nas redes sociais, a ativista e autora dos livros Empoderamento e Feminismos Plurais, Joice Berth, criticou a atitude dos internautas brasileiros e alertou sobre o impacto dessa conduta para os relacionamentos atuais.
“O amor verdadeiro tem como único critério de escolha as afinidades de alma, de comportamento, de sexualidade, de ‘objetivos subjetivos’ de vida e desenvolvimento humano. Não é assim que a banda toca na nossa sociedade. As pessoas escolhem suas parcerias baseadas em critérios superficiais e acabam por manter relações sem sentido, sem química ou fugazes, justamente por que não teve nada a ver com as possibilidades de se construir um amor sólido, limpo e expansivo para ambas as partes”, escreveu.
Segundo a autora, essas discussões sobre afetividade, que apontam para raça, peso, classe, idade, etc, visam contribuir para que “um dia as pessoas se gostem, se curtam e se juntem de corpo e alma, sem as restrições sociais ocultas e segregacionistas“. No final do texto, Joice ainda desejou que homens com postura madura e elegante se multipliquem. “Isso vale mais do que qualquer aula sobre masculinidade tóxica”, finalizou.