metropoles.com

Camila Guedes, referência na luta pela liberação da maconha medicinal, conta como reaprendeu a viver após perder o filho

A Justiça Federal liberou o uso do THC no Brasil na última terça-feira (10/11), mas não a tempo de ajudar aliviar os sintomas de Gustavo. Ela transformou o sofrimento em força para ajudar outras famílias

atualizado

Compartilhar notícia

Google News - Metrópoles
camila2-800×500
1 de 1 camila2-800×500 - Foto: null

Uma caixa pequena protegida no fundo de um armário guarda as primeiras vezes de uma vida breve. Nela, há a mecha do primeiro corte de cabelo de Gustavo, a roupa usada nos primeiros dias, um par de sapatinhos e a chupeta. Os itens formam uma singela, porém significativa, coleção de lembranças do primeiro filho de Camila e Cristiano Guedes. O tempo passou diferente, em 25 de janeiro de 2013, às 6h, quando Gustavo nasceu. A vida começou a correr como os números de um cronômetro, diante dos olhos preocupados dos pais.

Diagnosticada com síndrome de Dravet, a criança chegaria até os 2 anos, com otimismo, segundo os médicos. O prognóstico, no fim, era mesmo esperançoso demais. Gugu, como era chamado, morreu à meia-noite de 1º de junho de 2014, com 1 ano e 4 meses, depois de convulsionar por 12 horas seguidas. Quando a crise começou, a mãe, Camila, estava na Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa), em busca da reclassificação do Canabidiol (CBD), remédio derivado da maconha, que ajuda a evitar convulções e dores, para pacientes de doenças crônicas, como Gugu.

A família de Gustavo foi a primeira no Brasil a conseguir legalmente, com recomendação médica e autorização da Anvisa, importar o medicamento. Ele chegou a usá-lo por uma semana, mas morreu antes de ver os efeitos do tratamento. Depois do pioneirismo de Camila, outras mil famílias conseguiram a autorização. O tempo de espera pelo CBD, que era de 40 dias, no mínimo, passou a ser de menos de uma semana.

A doença também é conhecida como “epilepsia mioclônica severa da infância”. Foi descrita por Charlotte Dravet em 1978 e classificada em 1989 entre as “epilepsias e síndromes epilépticas indeterminadas quanto à sua origem focal ou generalizada”. É um daqueles males incompreensíveis, além de raros.

“Fizemos todo o mapeamento genético, todos os exames. A síndrome foi fruto do acaso. Gugu nasceu aparentemente saudável, porém, meses depois, teve a primeira convulsão”, diz Camila.

Ela aparece no documentário Ilegal, que apresentou a milhares de espectadores a batalha de pessoas com doenças crônicas e pais de crianças que precisam de remédios que vêm da maconha. O filme ajudou a desconstruir preconceitos ao contar a história de famílias como a de Camila.

Camila foi uma das principais do documentário "Ilegal"
Camila foi uma das personagens principais do documentário “Ilegal”

 

De lá para cá, a liberação do CBD teve vários capítulos. A Anvisa incluiu-o na lista de substâncias controladas, mas em seguida restringiu a sua importação a casos de epilepsia que não respondem bem a terapias convencionais. Mesmo depois da morte de Gustavo, Camila segue como referência para famílias de todo o país em busca de informação e apoio para lidar com a própria dor. “Mães de crianças com deficiência de todos os lugares me procuram. Elas querem saber como eu sobrevivi, como comprar o CBD, mas, especialmente, como eu tive coragem de ter outro filho”, afirma.

Depois da morte de Gustavo, Camila passou a cuidar mais da própria saúde. Viveu o luto plenamente, fez terapia, visitou vários geneticistas e tomou uma difícil decisão: ser mãe novamente. A vida de Camila recomeçou com a chegada do segundo filho, Gabriel, hoje com 3 meses e saúde perfeita. 

Camila e o marido, Cristiano, com o filho Gustavo
Camila e o marido, Cristiano, com o filho Gustavo

 

 

Ser mãe é gerar um ser que você não tem a menor ideia do que será. Pode se tornar um Einstein ou um delinquente. Você pode ser muito feliz e também pode sofrer além do que jamais imaginou. É uma aposta corajosa que se faz

Camila Guedes

Uma enxurrada de mensagens invade a caixa de entrada de Camila, todos os dias. São mães em busca de força para trilhar o mesmo caminho. “O principal conselho que dou a quem me procura é: procure acompanhamento médico, visite geneticistas. Acompanhamento é essencial para ficar tranquila durante uma nova gravidez”, explica Camila.  Elas cuidam dos filhos doentes ou perderam suas crianças. Desejam a confirmação de que é possível voltar a ser feliz.

“A gente pode recomeçar. Fica uma ferida eterna, mas é possível começar tudo outra vez. É preciso ter calma e esperança”

Camila segue a doutrina espírita e recebeu uma carta psicografada da mãe dela, que morreu quando a filha tinha 7 anos. “Minha mãe dizia que estava cuidando do Gugu, que eu devia doar todas as coisas dele. E pediu que eu chamasse meu outro filho de Gabriel”, relata. Gabriel não nasceu para preencher vazios. Chegou para começar uma nova história. Veio ao mundo de parto normal, com 2kg e 43cm. “É um ser único e diferente. Não veio para tomar o lugar do irmão. Penso no Gugu todos os dias. Acredito que aqui é uma passagem e ele voltou para casa, para onde todos iremos no fim”. Às mães que a procuram, ela aconselha “coragem para ser feliz”. Quando Gabriel nasceu, Camila teve coragem de reabrir o quarto que era de Gustavo. Era preciso deixar a luz entrar.

Quais assuntos você deseja receber?

Ícone de sino para notificações

Parece que seu browser não está permitindo notificações. Siga os passos a baixo para habilitá-las:

1.

Ícone de ajustes do navegador

Mais opções no Google Chrome

2.

Ícone de configurações

Configurações

3.

Configurações do site

4.

Ícone de sino para notificações

Notificações

5.

Ícone de alternância ligado para notificações

Os sites podem pedir para enviar notificações

metropoles.comVida & Estilo

Você quer ficar por dentro das notícias de vida & estilo e receber notificações em tempo real?