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A vida depois de… aposentar as chuteiras

Após 20 anos como jogador de futebol, Túlio “Guerreiro” agora ensina aos mais novos os primeiros caminhos do esporte. Enquanto isso, se arrepende das confusões que arrumou quando era profissional dos gramados

atualizado

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Perfil do volante Túlio Guerreiro – Brasília(DF), 12/04/2016
1 de 1 Perfil do volante Túlio Guerreiro – Brasília(DF), 12/04/2016 - Foto: null

Debaixo de um sol forte, em um gramado verde, em meio a bolas de futebol. Essa tem sido a rotina do agora ex-volante Túlio “Guerreiro”. Tudo seria igual aos 20 anos da carreira de jogador se, atualmente, ele não estivesse do lado de fora das quatro linhas e cercado por crianças que sonham em ter uma carreira no esporte como a dele.

Aposentado como jogador de futebol há quase três anos, Túlio vem tentando se acostumar com a nova rotina, mais calma e sem a “adrenalina que surgia na hora em que calçava as chuteiras”. Diz, claramente, que ele saiu do futebol, mas o futebol não saiu dele. Agora, administrar uma escolinha para crianças é a prioridade. Enquanto isso, ele estuda para no futuro tornar-se um “técnico melhor do que o jogador que foi”.

Quem conversa com Túlio Guerreiro hoje parece estar falando com outra pessoa. Em nada ele se assemelha àquele jogador que ficou conhecido como “esquentadinho” e chegou a ser suspenso do futebol por 60 dias depois de acertar feio um adversário. Na verdade, a serenidade que a idade traz combina perfeitamente com o sorriso e a fala mansa desse novo Túlio.

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Túlio segue perto das chuteiras, mas não as calça mais

 

O ambiente em que está também ajuda muito. O clima alegre, a risada das crianças dando os primeiros passos no futebol e o filho Vitor, de apenas 9 anos, ali, do lado, trazem a tranquilidade que a vida de concentrações e treinos não permitiram. “A vida de jogador de futebol faz você deixar muitos prazeres de lado. Por exemplo, hoje eu levo meus filhos na escola, coisa que eu não fazia quando jogava futebol. Ajudo eles na tarefa dos colégios, coisa que eu também não tinha tempo para fazer”, conta em meio a um sorriso.

E dá para perceber que, para o Túlio, ensinar aos meninos o que é futebol, entre eles o filho que quer ser zagueiro, é como se ele estivesse pagando com o esporte o que o esporte lhe trouxe. “Eu vou fazer só 40 anos agora em abril, eu não quero ser uma pessoa com 40 anos que vai viver de renda, aposentado. Quero fazer as coisas que amo, outras coisas, outros projetos. E fazer coisas para melhorar a sociedade, ensinar tudo o que aprendi”.

Falar “coisas que ama”, no caso do Túlio, é usar o plural sem necessidade. Tudo na vida do ex-volante se resume ao futebol. “Eu tenho saudade do jogo, do calor do jogo, da emoção da torcida. Se eu fosse escrever um livro todos os capítulos seriam sobre futebol. O dia que o futebol não estiver me emocionando mais, eu prefiro me afastar dele”, declara. Mas pelo jeito, isso não vai tão cedo acontecer.

Carreira
Natural de Sobradinho-DF, Túlio começou a carreira como a maioria dos jogadores de futebol do país, no “terrão”. Era na terra batida que ele chamava a atenção dos mais velhos até que foi fazer testes no Goiás Esporte Clube. Ficou apenas seis meses no juvenil e aos 18 anos, em 1994, subiu para o profissional. No alviverde goiano conquistou o título da série B de 1999, a Copa Centro-Oeste e o pentacampeonato estadual.

Foi no gramado da Serrinha, estádio do time, que o volante fez os contatos com os jogadores que até hoje são seus melhores amigos. “Me emociona as amizades que eu fiz no futebol. Mas quando eu lembro do amigo gigantesco que era o Fernando e eu perdi…”, conta Túlio, em um dos poucos momentos da entrevista em que a voz do ex-jogador deixou de ser alegre para assumir um tom melancólico e emocionado.

O atacante goiano, conhecido como Fernandão, morreu no dia 7 de junho de 2014 em um acidente de helicóptero. “Foi um choque. Eu peguei a notícia quando acordei, no Facebook. Para mim, foi uma dor imensa. E na semana que ele foi para Aruanã (GO) ele me chamou para ir junto. Eu poderia estar lá, a gente foi muitas vezes para lá juntos. O Fernando vivia lá em casa, a gente tinha uma amizade, não era amizade não, era irmandade. Eu sou padrinho da filha dele e ele sempre vai fazer falta na minha vida”.

Ainda como jogador do Goiás, Túlio foi emprestado para um time da Arábia, depois, foi vendido para o Botafogo, clube onde virou ídolo e conquistou títulos importantes, como o acesso para a série A. “Graças a Deus eu passei só por times grandes, de primeira divisão, ou o time estava ali temporariamente na segunda divisão, caia, mas subia imediatamente. Por isso eu me considero um privilegiado. Fui um atleta de grande nível e eu pude aprender muito e conquistar muita coisa no futebol. Tem atleta aí que passa dificuldade, precisa ter outro emprego, eu não, pude só jogar em times grandes”.

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Túlio diz que ele saiu do futebol, mas o futebol não saiu dele
Túlio ajudando as crianças da escolinha
Meninos treinando com os conselhos de Túlio
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Túlio ainda sente falta dos gramados

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Túlio diz que ele saiu do futebol, mas o futebol não saiu dele

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Túlio ajudando as crianças da escolinha

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Meninos treinando com os conselhos de Túlio

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O jogador teve ainda passagens mais apagadas pelo Japão, Corinthians e Grêmio. Ele retornou para o Goiás onde quase não foi aproveitado pelo técnico Leão e também voltou ao Botafogo, conquistando duas Taças Rio. Jogou três anos no Figueirense, também levou a equipe para a série A, até que decidiu que era hora de aposentar em casa, vestindo a camisa do Sobradinho.

No dia 25 de abril de 2013, quando completou 37 anos, Túlio despediu-se dos gramados pelo time do DF. A idade não permitia mais.

“Eu lembro, como se fosse hoje, de um treinador que eu tive que mandava os atletas mais novos puxarem a fila nas corridas. E agora eu me vejo com praticamente quarenta anos e os jogadores me chamam de vovô, de titio. E eu lembro sempre disso, quando eu puxava a fila. Os 20 anos passaram num estalar de dedos, num piscar de olhos, passou voando. ”

Túlio, ex-jogador

O que ficou mesmo registrado foram os títulos e a vontade de sentir novamente a emoção ao decidir um campeonato importante. “Dentro de campo a gente deixa e emoção levar. O lado da adrenalina do atleta é o que faz ele jogar. E acho que é por isso que eu consegui jogar até aos 37 anos. Depois o físico não permitiu mesmo. A velocidade e a força dos mais jovens sobressai e você acaba não conseguindo acompanhar”.

Se está velho para ser jogador de futebol, ele se acha inexperiente para ser técnico. “Eu ainda estou me preparando para isso. Já fiz um curso da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), fiz curso da Universidade do Futebol, da Getúlio Vargas. Estou me preparando para ser treinador. Eu quero me preparar bem antes de dar o verdadeiro passo. Quando eu me preparar bem, estiver seguro, aí eu vou iniciar essa carreira brasil afora”, espera.

Polêmicas
“Se eu pudesse ter sido mais calmo. Mas nem sempre você consegue se controlar”, é assim que Túlio responde ao questionamento se há arrependimentos da fase de jogador. Conhecido como “esquentadinho”, o ex-volante assume que sempre teve dificuldade para manter a calma dentro dos gramados. “Você se envolve muito, coloca muita emoção, seus nervos ficam à flor da pele e acaba passando dos limites”.

Daniel Ferreira/Metrópoles
Ao lado do filho, Túlio agora deixa as polêmicas e confusões de lado

 

E teve uma vez que ele realmente foi além do que recomenda o fair play. “Eu estava no Botafogo e acabei fazendo uma falta violenta em cima do Leandro, do São Paulo, que depois eu joguei com ele no Grêmio. Nesse caso não tem como não arrepender. Eu vejo na televisão e não tem como não se envergonhar de ter feito isso. Isso aí serviu de lição para mim, me arrependi, mas nunca deixei de ter aquele temperamento”, explicou. O lance foi em 2007. Na época, Túlio deu um pontapé no rosto do jogador adversário e ficou suspenso por dois meses.

Outra polêmica, Túlio foi envolvido meio que sem querer. O presidente Carlos Eduardo Pereira não aceitou bem a cobrança de salário do jogador, de R$ 1,5 milhão, e o chamou de “chorão”. “A diretoria do Botafogo ficou me devendo e eu fiz de tudo para não precisar ir na justiça. Mas o Botafogo só se pronunciou quando eu consegui a penhora de alguns bens. Aí o presidente usou expressões que eu só tinha escutado de flamenguista, quando eles chamavam a gente de chorão. Eu nunca me incomodei deles falarem isso, isso é coisa de torcida, mas ouvir isso do presidente do meu clube? Isso foi pesado, isso aí eu achei uma atitude covarde, ele não agiu como botafoguense”.

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