A vida depois de… Abandonar o sedentarismo e virar triatleta aos 52 anos
Há quatro anos, Wilbert Golden Batista tinha sobrepeso e a saúde desregulada. Depois de ouvir um ultimato do médico, levou a mudança de vida a sério. hoje, aos 56 anos, encabeça o ranking brasileiro do Ironman, na sua categoria
atualizado
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Quem conheceu Wilbert Golden Batista há quatro anos talvez nem o reconhecesse se o visse hoje na rua. Não só por causa dos quase 20kg a menos. A transformação do servidor público, hoje com 56 anos, ao longo desse período foi muito além da aparência. Naquela época, dividia a rotina entre o TRT, onde trabalha há 33 anos, e os domingos como pastor em uma igreja do Núcleo Bandeirante. Bastava isso para definir o velho Wilbert.
Hoje, sua vida jamais caberia numa definição tão simples. Em 2011, com 52 anos, um exame de rotina lhe ascendeu uma luz amarela. Wilbert tinha sobrepeso e estava com os níveis de colesterol e triglicerídios completamente fora da curva. Uma avaliação mostrou que ele tinha 30% de gordura no corpo, quando o limite para a sua idade não passa dos 24%.
Bastou isso. Poucos dias depois, Wilbert começou a dar algumas poucas voltas pelos arredores de casa, nas ciclovias que passam próximas à sua casa, em Arniqueiras. Os passinhos lentos aos poucos foram ganhando alguma velocidade. A primeira vitória talvez tenha tanta ou mais importância que os troféus e medalhas que coleciona hoje no seu escritório: ele ainda se lembra com perfeição do dia em que chegou à casa não se contendo de alegria por ter conseguido correr 2km – basicamente uma volta no quarteirão da rua onde mora com a esposa e os filhos.
Os anos multiplicaram essa conta. Hoje, os 2km da voltinha no quarteirão de Wilbert viraram nada menos que 42 km – distância de maratona – que ele emenda em surreais 180km de bike e com quase 4km de natação. Os 30% de gordura corporal viraram 10,2%. O escritório de casa virou um museu de incontáveis medalhas e troféus de provas de corrida, triatlo e Ironman, uma espécie de “supertriatlo” no qual Wilbert ocupa o primeiro lugar no ranking na categoria até 59 anos, da qual faz parte. Tudo isso em quatro anos.
Wilbert A.T. e D.T.
“Não existe o mundo antes e depois de Cristo? Pois eu costumo dizer que minha vida se divide entre antes e depois do triatlo”, brinca o atleta. A evolução de Wilbert, ele mesmo confessa, foge do padrão. Entre aqueles primeiros 2km e a primeira prova de triatlo foram apenas oito meses. Nesse intervalo, secou 17kg. Foi aqui em Brasília mesmo, numa prova do tipo “short”, na qual os participantes nadam “apenas” 750 metros, pedalam 20km e correm 5km.
“Foi um amigo que me chamou, mas eu não sabia se daria conta. Fui lá um dia antes conhecer o lugar da prova, não sabia nada daquilo, acordei de manhã, comi macarrão. Fiz besteira em cima de besteira”, ri. O atleta não só completou a prova, como quis mais.
Passou aos triatlos olímpicos, que incluem 1,5km de natação, 40km de ciclismo e 10km de corrida. Por essa modalidade, acumula dois troféus de campeão brasileiro, de 2014 e 2015, que ele conserva como xodós na prateleira do escritório. Os feitos lhe renderam o primeiro lugar do ranking na sua categoria pela Confederação Brasileira de Triatlo (CBTri). Não é pouca coisa.
Wilbert ainda quis ir além. Passou do triatlo comum ao Ironman, modalidade que só mesmo homens de ferro poderiam completar. São dois tipos de prova. O Meio-Ironman é um triatlo de 1,9km de nado em mar aberto, 90km de ciclismo e 21km de corrida. O “full” tem o dobro de distância. Wilbert domina as duas. Para a maior, leva cerca de 10 horas. Para a menor, cinco.
Você imagina o que foi para mim terminar a primeira prova de Meio-Ironman, um cara que não corria nem 20 minutos, passar cinco horas correndo. E que não fazia isso nem jovem e faz agora. Só de lembrar me dá vontade de chorar.
Wilbert Golden Batista
A última foi em outubro, no Havaí. O evento de Kona é o mais importante para os atletas de Ironman. Ao contrário das outras etapas, ninguém pode se inscrever para o desafio. Apenas os 2 mil melhores dentre os mais de 200 mil atletas de todo o planeta se classificam. Wilbert foi um dos brasileiros.
De bem com a vida
As vitórias que o esporte trouxe – a saúde, o bem-estar, os quilos a menos, os troféus, a oportunidade de deixar tudo para trás por alguns dias e desbravar o mundo para fazer provas – se espalham pela casa do atleta. Além das medalhas penduradas no escritório, o depósito de Wilbert é onde guarda as relíquias da sua paixão. São bicicletas para vários tipos de terrenos e climas, capacetes, rodas tecnológicas, coisas que só quem entende do esporte sabe para que servem.
Nessa conta entram filhos e genros: Wilbert colocou todo mundo para correr (e pedalar, e nadar). Inscreveu a filha numa prova de corrida de surpresa, meio de supetão, sem aviso prévio. Hoje, é uma das primeiras na sua categoria. Aos fins de semana, eles saem de turma para treinar.
A rotina de treinos também acompanhou a evolução do atleta. Ele se exercita três horas por dia. Sai de casa às 6h para correr ou pedalar. À noite, ainda complementa os exercícios. No dia de “folga”, aproveita para malhar. E ainda concilia tudo com o trabalho no TRT e os cultos aos domingos, além de palestras motivacionais pelo Brasil, onde conta a sua história.
Eu costumo dizer que, se um pessoa diz que não vai dar conta de um desafio e a outra diz que vai, as duas estão certas. A resposta disso está na cabeça, e não no corpo. Então se alguém acha que não vai conseguir, não vai mesmo. Já a que acredita, consegue.
Wilbert Golden Batista
Nos últimos quilômetros de corrida, com os pés doloridos e o corpo exausto, é difícil não ceder ao instinto de parar. “Nessas horas, só penso na linha de chegada; e que faça sol ou chuva, minha esposa estará me esperando no final. Quando vejo, já estou correndo mais rápido”, conta.
Hoje, Wilbert tem 56 anos. Longe da aposentadoria do esporte, comemora a nova vida. O vigor físico se renovou e trouxe mudanças também na relação com a família, amigos e com os novos companheiros de treinos, pessoas que, como ele, vencem desafios todos os dias para cruzar linhas de chegada.
“Quando era sedentário, não tinha ânimo nenhum. Hoje, sou muito melhor com meus filhos, meu neto, com as pessoas. Conheci muita gente, fiz amigos. Aprendi a tocar piano, comecei a viajar. Me sinto mais jovem agora do que há 10 anos”, ele diz, com sorriso bem aberto.30