Melhor prevenir: saiba quanto custa a doença renal crônica no Brasil
Uma sessão de diálise em uma clínica particular pode chegar a R$ 600. Governo desembolsa R$ 2,3 bilhões por ano com tratamentos – e é pouco
atualizado
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Todos os dias, o professor Jurandir Araújo, de 41 anos, se apresenta em uma clínica renal particular na Asa Sul, às 15h30. Durante duas horas e meia, fica ligado a uma máquina que limpa o sangue, função que há cinco anos os seus rins já não conseguem desempenhar. Chega em casa por volta de 21h30. Comparado há alguns anos, quando o procedimento era realizado pela manhã, o que o impedia de trabalhar, considera que a vida está boa à beça.
Jurandir é um entre os 112 mil pacientes em diálise no Brasil hoje, segundo um levantamento da Sociedade Brasileira de Nefrologia, de 2014. Quando recebeu o diagnóstico, há cinco anos, foi um dos cerca de 35 mil novos pacientes que passaram a precisar do procedimento todos os anos, devido à falha total dos rins. A doença afetou não apenas a sua saúde física e a sua rotina familiar. Ser doente crônico custa dinheiro (e muito) aqui e em qualquer lugar do mundo.
Segundo Carmen Tzanno, presidente da Sociedade, os maiores culpados pelo constante aumento de pacientes em terapia renal substitutiva são outras duas doenças também crônicas, quase sempre preveníveis: a hipertensão e a diabetes tipo 2. “Cerca de 30% dos pacientes em diálise no Brasil são diabéticos. 35% são hipertensos. No caso da diabetes, muitos dos pacientes já apresentam comprometimento da função renal no momento do diagnóstico”, lamenta.
No caso de Jurandir, no entanto, foi uma glomerulonefrite — uma doença autoimune impossível de prever ou prevenir –, que o levou à diálise, Fora as sessões de hemodiálise, que faz cinco vezes na semana, ele ainda tem uma lista de medicamentos que toma em casa para tratar as comorbidades associadas à doença.
Além do custo financeiro, há outras coisas envolvidas. Muitas vezes, por exemplo, o doente precisa de um cuidador, ou alguém que o leve para a diálise, e aí essa pessoa para de trabalhar. O doente também se afasta do trabalho e deixa de ser produtivo. A coisa vai muito além do remédio
Carmen Tzanno, presidente da Sociedade Brasileira de Nefrologia
Para o SUS, a conta também não sai barata:
O melhor remédio é não adoecerSe a conta para manter vivos os pacientes que precisam de diálise no Brasil bate na casa dos bilhões para a rede de saúde, prevenir sai a troco, na comparação. Além do dinheiro gasto em tratamento substitutivo, a economia passa também pelas cirurgias de transplante, cada uma custando até R$ 27.622,67 ao SUS — valor considerado muito baixo pela classe médica. Só no primeiro semestre deste ano, foram 12.091 procedimentos. Ou seja, mais de R$ 333 milhões.
Detectar falha na função renal a tempo de impedir ou retardar a evolução da doença, no entanto, pode custar menos de R$ 5 por paciente.
“Sabemos hoje que entre 25% e 40% dos diabéticos vão desenvolver a doença renal em algum momento. Um check-up anual é a melhor forma de prevenir. Todo médico deveria pedir um exame de ureia e creatinina ao seu paciente”, afirma o nefrologista Evandro Reis, da Clínica de Doenças Renais de Brasília, onde Jurandir faz suas sessões diárias de hemodiálise.
As medições de ureia e creatinina no sangue são exames básicos, segundo os especialistas, feitos em qualquer laboratório. Para o SUS, custam R$ 2,04 e R$ 1,85, respectivamente.
Além disso, como reforça Reis, conhecer as origens do problema também pode ajudar a girar a chave da progressão das estatísticas. “A epidemiologia mudou. Já sabemos que as principais causas de doença renal são a diabetes e a hipertensão. Além disso, mais de 50% dos pacientes têm mais de 50 anos”, afirma o médico. “Um diagnóstico precoce pode ser essencial para impedir ou retardar o aparecimento da doença renal”, acrescenta a também nefrologista da clínica, Maria Letícia Cascelli.
A série Melhor Prevenir traz semanalmente informações sobre os custos de algumas das doenças crônicas no Brasil — tanto para o bolso do paciente quanto para os cofres públicos. O projeto reúne números sobre a diabetes, hipertensão e a doença renal. Juntas, elas matam 375 mil pessoas por ano no Brasil.