A importância de cuidar da saúde mental de pais de filhos com autismo
Os pais de filhos com autismo enfrentam uma série de adversidades no dia a dia que causam impacto significativo em sua saúde mental
atualizado
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Apenas nos Estados Unidos, uma a cada 36 crianças de 8 anos são diagnosticadas com Transtorno do Espectro Autista (TEA), de acordo com o Center of Diseases Control and Prevention (CDC). No Brasil, a realidade não é diferente, dado que a prevalência de pessoas com autismo vem aumentando ao longo dos anos.
Sabe-se que as crianças especiais necessitam de uma maior atenção e prestação de cuidados, tarefas que ficam sob responsabilidade da família. No caso dos pais de crianças com TEA, a demanda é maior à medida que o nível do autismo aumenta, sendo eles:
- Nível 1 (autismo leve): necessidade de pouco apoio;
- Nível 2 (autismo moderado): necessidade moderada de apoio;
- Nível 3 (autismo severo): muita necessidade de apoio substancial.
Diante desse cenário, é importante lembrar não apenas dos pequenos, mas também dos pais que enfrentam uma série de adversidades no dia a dia, que vão desde a busca por intervenções terapêuticas até questões como dificuldades de comunicação. Isso tem um impacto significativo em sua saúde mental.
De acordo com a psicóloga Camila Zacarias, uma das principais dificuldades que tem observado nas famílias de filhos com autismo é a sobrecarga, especialmente quando a criança é diagnosticada jovem. Nesses casos, a carga de terapia para eles costuma ser alta.
“O recomendado é uma média de 20 horas por semana. Então, os pais têm todo um custo financeiro, além da briga na Justiça para que o plano de saúde cobre o tratamento de qualidade. É uma sobrecarga muito grande para levar em terapia, correr atrás de burocracias”, diz ao Metrópoles.
Camila ainda afirma que muitos pais têm um certo medo e insegurança com o futuro da criança. Tudo isso, segundo a profissional, acaba gerando um desgaste mental dos pais. Porém, vale lembrar que para cuidar das outras pessoas, é preciso estar bem consigo mesmo. É aí que entra a ajuda terapêutica e a rede de apoio.
Acompanhamento terapêutico
Jeana Franco Oliveira, psicopedagoga especialista em Transtorno do Espectro Autista e Diretora da Clínica Aquarela, explica que o acompanhamento terapêutico para os pais de crianças com TEA desempenha um papel crucial no suporte à família e no desenvolvimento da criança autista.
“Quando os pais recebem o diagnóstico de TEA de seus filhos, muitas vezes se encontram em território desconhecido, sem compreender completamente o transtorno e suas implicações. Nesse contexto, o acompanhamento terapêutico oferece uma valiosa fonte de educação e entendimento”, afirma.
A ideia deste tipo de serviço é oferecer aos pais a oportunidade de desenvolver habilidades de manejo para serem utilizadas em ambientes fora do consultório. Os terapeutas ensinam estratégias que ajudam a lidar com comportamentos desafiadores e apoiar o desenvolvimento geral da criança.
Apoio emocional
Segundo a psicopedagoga, um aspecto importante do acompanhamento terapêutico é o apoio emocional que ele oferece aos pais. “Criar um filho com TEA pode ser uma jornada desafiadora e ter um espaço para compartilhar experiências e receber apoio pode fazer uma enorme diferença no bem-estar emocional dos pais.”
Além disso, a compreensão surgida a partir deste tipo de ajuda contribui para promover o bem-estar de toda a família. Os terapeutas oferecem orientação sobre como equilibrar as demandas do filho com as necessidades da família, o que ajuda a reduzir o estresse e fortalecer os vínculos familiares.
Rotina e autismo
A rotina é algo importante para qualquer criança, especialmente para aquelas com TEA. No caso dos brasilienses Elizabeth Henrique e Robson Lima, que têm um filho de 5 anos com autismo moderado, o dia a dia da família é sempre muito corrido.
Em conversa com o Metrópoles, o casal conta que o filho Vicente precisa de um alto nível de suporte nas atividades diárias. Eles também têm outra filha com 10 anos com Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH). Então, é preciso revezar os horários de trabalho e de cuidado com as crianças.
“Meu filho sai da escola direto para a clínica onde faz terapia. Uma das nossas maiores dificuldades é a distância, já que moramos em Brazlândia. Todo o tratamento é feito de forma particular porque a SES/DF não tem capacidade de atender a demanda de pacientes com TEA”, afirmam.
Elizabeth relata que já fazia terapia antes do diagnóstico do filho. “Isso tem me ajudado a enfrentar os desafios diários e fazer com que eu entenda melhor a mim e ao meu filho. A clínica tem um grupo que nos ajuda a perceber que não estamos sozinhos, que outras famílias vivem e enfrentam os mesmos desafios”.
“Terapia fez toda a diferença”
Danila Maia é mãe solteira de gêmeas, de 12 anos, e de Lorenzo Maia, de 7 anos, com autismo nível 2.
Como o pequeno faz terapia desde muito cedo, ele tem bastante autonomia e consegue fazer algumas coisas, como tomar banho e comer. No entanto, a família ainda precisa dar suporte em certas atividades do dia a dia.
Questionada sobre a rotina da família, Danila diz que também é puxada. Mas, a terapia tem sido um grande apoio. “O que fez a diferença para mim foi estudar o desenvolvimento humano porque quando eu vou entendendo o meu comportamento e o deles, eu consigo perceber as demandas emocionais que eles tem.”
Para equilibrar as necessidades do filho com o cuidado com a própria saúde mental, Danila tem uma agenda para se organizar, o que diminui a ansiedade. Ela também conta a ajuda das filhas gêmeas, que também fazem terapia. Para ela, ter uma rede de apoio ampla facilitou a cuidar da saúde mental.
Pais, cuidem de vocês
Os relatos acima evidenciam a importância do cuidado com a saúde mental dos pais de crianças com autismo. É fundamental que os pais reconheçam suas próprias necessidades emocionais e encontrem maneiras de cuidar de si mesmos.
De acordo com a psicopedagoga Jeana, algumas táticas podem ser úteis para promover o autocuidado nessa jornada desafiadora. “Uma das questões principais é buscar uma rede de suporte e saber quando buscar ajuda. Outra dica é valorizar as pequenas conquistas e atividades diárias que trazem alegria aos pais e à criança.”
Grupo de apoio no DF
O grupo voluntário de apoio a familiares de pessoas com autismo, Cuidando do Cuidador, permite que os participantes convivem com pessoas que têm problemas semelhantes e aprendam diferentes estratégias para lidar com estas situações.
A fundadora Patrícia Bezerra, mãe de um menino de 16 anos com autismo nível 3, conta ao Metrópoles que as ações do grupo visam o compartilhamento de informações sobre o desenvolvimento e o cuidado do autista e de seus familiares.
“O grupo tem o foco em apresentar diferentes possibilidades de acompanhamento ou de busca dos direitos dos autista, seja na esfera pública ou privada. Nosso próximo encontro (2/4), abordará a desafiadora inclusão no ambiente escolar”.