Corrida de carros durava 12 horas e movimentava Brasília nos anos 60
Os certames reuniam pilotos de todos os cantos do país e chegaram a levar 100 mil pessoas às ruas da nova capital
atualizado
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Brasília teve os seus dias de Grande Prêmio de Mônaco. As ruas largas da nova capital se transformavam num autódromo delineado pelos monumentos modernistas de Oscar Niemeyer. Há 50 anos, por exemplo, 100 mil pessoas foram às margens do Eixo Monumental para vibrar com a corrida dos “500 quilômetros de Brasília”. Naquele 1967, quase toda a população da cidade foi testemunha desse “certame automobilístico”.
No começo da década, o percurso era de 1000 quilômetros em referência à distância entre as capitais (a nova e a velha, o Rio de Janeiro). Doze horas de provas, com 20 carros empunhando uma velocidade média de 100km/h em 125 voltas de 8km cada uma. As marcas nacionais eram maioria, mas algumas internacionais entravam na disputa. Brasília parava. No registro em vídeo de 1962, crianças e até freiras acompanhavam a prova.https://www.youtube.com/watch?v=A1Pl31u12J8
Uma prova de fibra e perícia dos pilotos na qual as máquinas testavam a qualidade. Para atingir a meta, os carros precisavam ter resistência física, funcionamento mecânico perfeito, freios em forma, suspensão irrepreensível e bom comando.
Jean Mazon
O jornalista Jean Mazon narrava emocionado a corrida às 5 horas da manhã. Nessa competição, três modelos Dauphine lideraram a prova e venceram as três posições. A torcida candanga estava com o Willys Interlago, o primeiro carro esportivo produzido no Brasil, que estrelava um contagiante “batismo de fogo” na competição do cerrado.
A euforia tomava conta da cidade. Havia bolsas de apostas e o fortalecimento da indústria automobilística brasileira. Tudo começou nos festejos de inauguração da cidade, em 1960: O Grande Prêmio Juscelino Kubitschek. A disputa principal ocorreu no Eixão Sul, com retornos marcados por cavaletes. Quem venceu a corrida foi o piloto paulista Jean-Louis Lacerda Soares, de 29 anos, com uma cobiçada Ferrari Testa Rossa. Coube ao presidente JK entregar o prêmio ao vencedor: um relógio.
Quem estava na cidade acompanhando tudo foi o pentacampeão de F-1, o argentino Juan Manuel Fangio. Em entrevistas, Jean-Louis revelou que foi Fangio que lhe deu a dica para vencer a corrida. Pediu que ele não se afobasse na largada, que deixasse os concorrentes passarem, pois os carros não segurariam os freios até o final da corrida. Dito e feito.
A corrida de 1967, no entanto, foi uma das mais marcantes, por conta de uma história peculiar: o segundo lugar foi garantido por carro construído com peças de um Fusca capotado, por quatro jovens da cidade (Zeca Vassalo, Jean Luís, Helladio Monteiro e Alex Dias Ribeiro). A aparência estranha do automóvel rendeu-lhe o nome de “Patinho Feio”.
A história virou um documentário inédito pelas mãos do cineasta Denílson Félix, ainda sem data de lançamento. O sucesso foi tanto que o grupo formou uma equipe chamada Turma de Camber, que tinha como mecânico o iniciante Nelson Piquet. Um dos pilotos do “Patinho Feio” também se tornaria da elite da F-1: Alex Dias Ribeiro.
Há quem diga que as corridas dessa Brasília de outrora estejam na raiz dos perigosos pegas que ocorrem, hoje, nas vias da cidade, sobretudo, no Eixão. Melhor ficar com as ótimas lembranças.