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Aos 16 anos, Michael Jackson cantou em Brasília sob pressão policial

The Jackson Five quase foi embora sem fazer o show no Ginásio Nilson Nelson. Revoltado, publico quebrou algumas instalações do espaço. Para acalmar os ânimos, Michael cantou “Ben” a capela

atualizado

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Em 1974, a chegada da primavera em Brasília tinha ares de um grande evento, com direito a jogos escolares e apresentações artísticas de colegiais. Numa capital federal culturalmente tímida, aquele sábado, 21 de setembro, no entanto, estava completamente fora da ordem – e em plena ditadura militar. Algumas centenas de jovens tinham acordado em êxtase. Antes do sol se pôr, eles apinhariam o Ginásio Nilson Nelson. O objetivo: gritar, descabelar-se e cantar (até em inglês macarrônico valia) as canções do The Jackson Five. “Quem não fosse ao show era definitivamente careta”, propunha o anúncio publicado na imprensa. E ser careta em 1974 poderia ser o fim do mundo.

Aos 16 anos, Michael estava descolando-se do conjunto (era assim que se denominavam os grupos ou as boy bands da época). Havia três anos que estava em carreira paralela e ascendente. Passava ainda por uma nítida mudança de voz. Não cantava mais tão “fininho” como em “Ben”. Quem seguia para o Nilson Nelson, naquela tarde, afinava o coro para saudá-lo: “I love you, Michael”.

Todos queriam ver Michael, mas ninguém podia imaginar que ele se transformaria no rei do pop.

José Paulino Neto, espectador

De repente se fez inverno
Para os ávidos espectadores, tudo eram flores. O que eles não cogitavam é que o tempo estava prestes a fechar. Nos bastidores, crescia o risco de não ter mais o show. Sem saber de nada, os fãs caminhavam ordeiros para receber um possível pedido de desculpas e o aviso de que o dinheiro do ingresso seria regiamente devolvido. O motivo: a carreta com equipamentos para o show tinha quebrado na saída de Belo Horizonte. Não havia como chegar à cidade naquela tarde. No dia seguinte, a comitiva precisava embarcar para cumprir agenda no Chile. Era preciso cancelar o espetáculo.

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A grande atração da visita dos The Jackson Five era Michael
Numa visão 'deslumbrada', grupo acreditava ter tomado o lugar dos Beatles
Imprensa repercutiu a turnê da família Jackson pelo país
Em coletiva de imprensa, os irmãos Jackson falam da experiência de estar no Brasil
Ingresso autêntico do show de 21 de setembro de 1974, no Ginásio Nilson Nelson, em Brasília
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Publicação anuncia a visita da família Jackson ao Brasil

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A grande atração da visita dos The Jackson Five era Michael

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Numa visão 'deslumbrada', grupo acreditava ter tomado o lugar dos Beatles

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Imprensa repercutiu a turnê da família Jackson pelo país

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Em coletiva de imprensa, os irmãos Jackson falam da experiência de estar no Brasil

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Ingresso autêntico do show de 21 de setembro de 1974, no Ginásio Nilson Nelson, em Brasília

“Coisa de louco! Milhares de ingressos vendidos, o prestígio do patrocinador (o extinto jornal Correio do Planalto), do Governo do Distrito Federal e o respeito da plateia enlouquecida estavam em jogo. Não havia outra saída. Tínhamos de segurar os meninos em Brasília, senão seria um desastre”, relembra o jornalista Carlos Badra.

A notícia do cancelamento veio na calada da noite. Carlos Badra e o sócio Kleber Ribeiro, jornalistas do Correio do Planalto, abandonaram a redação às pressas e correram para o antigo Hotel Erom (hoje, Airam), onde a comitiva de 21 pessoas ocupava dois andares (os pais e o tutor de os Jacksons estavam entre elas). Lá, hospedava-se também o empresário brasileiro da turnê, George Elis. Nervosos, os dois jornalistas invadiram a suíte. Foi um bafafá, daqueles com direito à famosa frase: “Por favor, chamem os seguranças”. Ao lado de um manager francês, George parecia irredutível. O compromisso no Chile inviabilizava a permanência de os Jacksons em Brasília.

Ligamos para o Secretário de Segurança do GDF, o coronel Aimeé Lamaison (que viria a ser governador do DF entre 1979 e 1982). Ele sabia do risco que corríamos com o cancelamento e foi incisivo.

Carlos Badra, jornalista

Segundo Badra, o coronel Aimeé Lamaison chegou avisando: “O governador está sabendo de tudo. Tenho carta branca. Vou falar com as autoridades portuárias. De Brasília, eles não saem sem fazer o show”.

E não saíram. Na hora do espetáculo, ginásio lotado e inquieto, uma equipe de segurança do GDF acompanhou os Jacksons ao palco. “Havia uma pressão sobre eles, a nossa, a do público, e a exercida pelo coronel Lamaison. Foi então feito o pedido de desculpas e o anúncio de que o show seria feito no dia seguinte. Michael Jackson espontaneamente ainda cantou uma estrofe de “Ben” a capela”, relembra o jornalista.

 

 

O Sol volta a brilhar…
No dia 22 de setembro de 1974, Michael Jackson e os irmãos ­Jermaine, Marlon, Tito, Jackie fizeram um show tido como inesquecível, num Ginásio Nilson Nelson fisicamente avariado. O quinteto, na verdade, caminhava para se transformar num hepteto. Randall e Janet (sim, ela estava em Brasília) entrariam em cena.

No set list, os sucessos “Never Can Say Goodbye”, “I´ll Be There” e canções do novo disco, “Life of the Party”. Hits da gravadora Motown também recheavam o show. Eles interpretavam “Superstition”, de Steve Wonder, e “Papa Was a Rolling Stone”. Michael tinha o esperado momento solo. Claro que cantava a delirante “Ben” e todos faziam o coro “I love Michael”…

“Tinha 9 anos. Me lembro de Michael cantando ‘Music and Me’, canção da trilha da novela ‘Carinhoso’ e que estava na boca de todos. A plateia veio abaixo”, puxa da memória Andreia Laís, presente ao show, na época com 9 anos.

 

 

Os Berimbaus da Torre de TV
No sábado, 21 de setembro, dia do show que não aconteceu, os irmãos Orlando e Elenice Souza, ao lado do tio Samuel, resolveram desobedecer à orientação da segurança do GDF de seguir pela Torre de TV até o Ginásio Nilson Nelson. Subiram pelo Conic e caminharam pela margem do Setor Hoteleiro Norte. Do outro lado da pista, a menina Elenice avistou o carro de Emerson Fittipaldi, estacionado perto do Hotel Erom (havia um evento demonstrativo da Fórmula 1 na cidade). Mudaram a rota e foram ver a máquina de perto.

Lá, acabaram tendo uma surpresa: um ônibus escrito “The Jackson Five”. Minutos depois, a comitiva veio à rua e se dirigiu ao veículo. Parecia impossível, mas eram eles, coloridos e donos de cabeleiras inconfundíveis. Elenice, eufórica, tentou se aproximar, mas foi barrada pelos seguranças.

Eles estavam com berimbaus, que devem ter comprado na Torre de TV. Acenei e Michael pôs a cabeça para fora da janela, fez sinal para que eu subisse. Pedi autógrafos e eles assinaram no verso do meu ingresso.

Elenice Souza, espectadora

O ingresso de Elenice, aliás, causou furor e, para mantê-lo em mãos, ela teve de implorar para que o bilheteiro não rasgasse ao meio na entrada do ginásio. Na memória da menina, a relíquia estava guardada no cofre da família. Mas desapareceu. Elenice não gosta de contar muito essa história. Tem medo de que as pessoas pensem que ela delira. Mas virou professora de inglês por causa desse episódio. Aprendeu a língua para poder escrever cartas para Michael Jackson. Cartas que nunca foram entregues.

Imagens raras
A passagem do conjunto The Jackson Five pelo Brasil compreendeu as cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Belo Horizonte e Brasília. Na passagem, eles gravaram um especial para a TV Tupi, que foi semidestruído no incêndio de 1979. O que restou não tem mais do que um minuto e quarenta segundos e foi exibido pela primeira vez em 2009, pelo “Fantástico”, da TV Globo. O ano de 1974 foi o prenúncio do fim do The Jackson Five. Um ano depois, eles sairiam da gravadora Motown e virariam The Jacksons, pela Epic.

Em entrevistas à imprensa brasileira, o grupo mostrava um grau de otimismo que atingia o nível “deslumbre”.

Queremos aperfeiçoar nosso trabalho e talvez aumentar o conjunto. Tudo isso para manter nosso público, que nos colocou no lugar dos Beatles. O lugar deles é nosso. A prova está na incrível quantidade de discos que estamos vendendo.

Jermaine Jackson

Surpresa no hotel
Os funcionários do hotel Airam (antigo Erom) tomaram um susto quando foram indagados sobre a possível existência de algum vestígio (fotos, documentos) da passagem da família Jackson por Brasília. Com cara de incrédulos, os atendentes da recepção chamaram a supervisora Fabíola, que é uma espécie de memória viva do empreendimento. Ela revelou que tudo que era do Erom foi empacotado e pegou a estrada com os antigos donos.

Sobraram algumas fotos dos anos 1990, afixadas no restaurante. Entre estrelas globais e políticos aposentados, a memória e seus lapsos apagaram os rastros do The Jackson Five.

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