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Alcoviteiros transformam as tardes da tevê num tribunal de baixarias 

As tardes da tevê brasileira se transformaram numa sala de estar de alcoviteiros, que passam horas diante das câmeras tentando destruir a vida de artistas e de celebridades. É um espaço sem respeito à intimidade alheia, cuja regra é única: expor o outro. Um vale tudo pela audiência que abre a guarda para os sentimentos […]

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As tardes da tevê brasileira se transformaram numa sala de estar de alcoviteiros, que passam horas diante das câmeras tentando destruir a vida de artistas e de celebridades. É um espaço sem respeito à intimidade alheia, cuja regra é única: expor o outro.

Um vale tudo pela audiência que abre a guarda para os sentimentos mais baixos do ser humano, como demonstrações vorazes de racismo e de homofobia. Num roteiro em que não cabem respeito e cordialidade, impera o vale-tudo, como o de xingar de “macaca” uma cantora negra (“A Hora da Venenosa”, do “Balanço Geral”) ou de julgar o direito de ter filhos de um casal homoafetivo (“Fofocalizando”, do SBT).

Sem limites éticos, esses apresentadores destilam “venenos” sobre a vida privada de artistas que amam, traem, transam, mentem e se enfurecem como quaisquer humanos. Fazem isso sem critério algum de apuração. Sabem sequer a noção do que é ou não notícia.

Há um abismo entre a celebridade que quebra um hotel num ataque de fúria e o artista que troca um beijo apaixonados em quem deseja. Nessas atrações nefastas, ambos têm o mesmo valor

Sônia Abrão põe os desafetos na geladeira

 

Na luta pela audiência, as tevês transformaram seus programas decadentes em tribunais moralistas. No “Fofocalizando”, eles trituram fotos de celebridades “culpadas” numa máquina de picar papel, enquanto no “A Tarde é Sua”, da “Rede TV”, colocam o nome dos “réus” numa geladeira, como uma feitiçaria. Simbolicamente assumem assim o papel de inquisidores em suas fogueiras contemporâneas.

Ali, como maldosas “bocas de matildes” estão, como juízes da moral e dos bons costumes, a desnudar a intimidade alheia

A transformação da fofoca, considerada em desvio de personalidade, em entretenimento, talvez, reflita um momento de saturação da informação no cotidiano do cidadão. Há tempos as tardes televisivas eram um espaço de cultura com filmes, infantis e séries. Agora, resumem-se ao vazio provocado pela busca de reter a atenção fragmentada entre as mil e uma possibilidades provocadas pela internet e as redes sociais.

Ao condenar diariamente a vida alheia, esses apresentadores fazem isso em nome da informação. No fundo, buscam os cifrões da audiência e do merchandising, não se importam com os danos causados à imagem dos artistas citados

Vivemos um momento conturbado entre as fronteiras do que é verdade e mentira na web. O que rendeu um novo conceito: o de pós-verdade, no qual mais valem as opiniões (cheias de imprecisão e achismo) do que os dados objetivos dos fatos (base do jornalismo). Assim, o mundo vai se arruinando em sua mesquinhez.

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